Consignado do Auxílio Brasil e caso Americanas afetaram resultados da Caixa em 2022
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O empréstimo consignado aos beneficiários do programa Auxílio Brasil e o episódio envolvendo a Americanas tiveram impacto negativo direto para os resultados da Caixa em 2022 -o banco reportou uma queda de cerca de 40% no lucro na comparação com o ano anterior.
O risco de perdas de crédito relacionados aos dois eventos fez com que o banco público tivesse de aumentar a provisão para créditos de liquidação duvidosa, que encerrou o ano com um saldo de cerca de R$ 15,6 bilhões, alta de aproximadamente 40% em bases anuais.
Presidente da Caixa, Maria Rita Serrano afirmou que a decisão da gestão anterior do banco de adotar o consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil foi uma "excrescência". O empréstimo foi suspenso pelo banco no início de janeiro.
"Não se pode endividar as famílias com um auxílio que é para as pessoas se alimentarem. Mas a Caixa emprestou R$ 7,6 bilhões do seu orçamento ao consignado do Auxílio Brasil", afirmou a presidente da Caixa, durante coletiva nesta quinta-feira (23) em São Paulo para comentar os resultados do banco no ano passado.
Embora o consignado para os beneficiários do programa social não tenha se refletido em aumento da inadimplência, até porque o desconto se dá direto na fonte, Maria Rita assinalou que o empréstimo gerou como consequência o aumento do provisionamento e prejudicou a destinação de recursos do banco para outras linhas de crédito.
O banco informou ainda que o provisionamento para créditos de liquidação duvidosa também foi impactado por conta de eventos relacionados a duas empresas que tiveram dificuldades financeiras. A Caixa não abriu o nome das empresas, mas uma delas se trata possivelmente da Americanas.
"A Caixa reconheceu em suas Demonstrações Contábeis de 31/12/2022 os impactos de evento subsequente divulgado na mídia em janeiro de 2023 relativo a caso específico de grupo de empresa de grande porte que entrou em recuperação judicial, reforçando por sua vez a provisão para créditos de liquidação duvidosa que em 31/12/2022 alcançou o montante de R$ 249 milhões, que representa o provisionamento de 50% da carteira em virtude da deterioração do risco de crédito", informou a Caixa no balanço.
A presidente da Caixa afirmou também que o banco foi surpreendido com a decisão do CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social) de impor um teto de 1,70% para os empréstimos consignados para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
"Nós nem sabíamos com antecedência que a medida seria tomada", afirmou Maria Rita, acrescentando que o banco não pode fazer uma operação que não gere retorno ou que dê prejuízo à instituição.
Junto com uma série de outros bancos, a Caixa também optou por suspender a concessão do consignado para os beneficiários do INSS até uma nova decisão do governo, que estuda um novo teto para a operação.
A executiva afirmou que, mesmo que o banco optasse por manter a operação, ele não seria capaz de absorver toda a demanda que chegaria por conta da suspensão dos demais bancos.
Segundo Maria Rita, estão sendo realizadas tratativas dentro do governo para tentar resolver a questão o mais breve possível. "Mas ainda não há uma definição final com relação a isso."
Selic alta pode afetar financiamento imobiliário, diz presidente da Caixa A presidente da Caixa disse ainda que o banco é o principal financiador do Minha Casa Minha Vida, mas ressaltou que, por conta do patamar atual da taxa de juros, mantida nesta quarta-feira (22) em 13,75% pelo BC (Banco Central), começa a ter uma preocupação relacionada ao "funding" para financiar as contratações de crédito do programa.
Ela afirmou que os dois canais que o banco mais utiliza para obter recursos para os financiamentos habitacionais -poupança e FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço)- têm sofrido resgates relevantes nos últimos meses, e que será preciso buscar novas alternativas para sustentar o programa do setor imobiliário, eventualmente com taxas de captação mais caras do que as que são tradicionalmente utilizadas. "É um problema que temos que resolver", afirmou a presidente da Caixa.
"Ou fazemos menos com a taxa atual, ou fazemos mais, mas com uma recomposição da taxa", afirmou Marcos Brasiliano, vice-presidente de finanças e controladoria da Caixa.
Brasiliano disse ainda que tem uma expectativa de que o crescimento da carteira de crédito do banco neste ano fique em linha com a média do mercado, com uma expansão em torno de 8% a 9%.
Questionado sobre as medidas em estudo pela equipe do ministério da Fazenda para estimular o mercado de crédito, o vice-presidente da Caixa afirmou que não tinha conhecimento a respeito.
"O governo está trabalhando para democratizar o crédito, com responsabilidade, mas ainda não tem nenhuma medida", afirmou Brasiliano.
Ele acrescentou ainda que o resultado da Caixa "não se mede exclusivamente pelo seu lucro", mas também pelo trabalho social que realiza junto à sociedade. Segundo o executivo, o banco pagou cerca de R$ 310 bilhões em benefícios sociais ao longo do ano passado.
Brasiliano afirmou que parte da queda do lucro no ano passado se deveu a eventos não recorrentes realizados em 2021, como a abertura de capital da Caixa Seguridade e a alienação das ações do Banco Pan.
Maria Rita afirmou que a política da gestão passada de venda de ativos do banco não terá prosseguimento na gestão atual. Ela afirmou que o banco passou por um "desmantalemento" com a política adotada de venda de ativos nos últimos anos.
"Não é mais pretensão vender ativos do banco, ou privatizar ou abrir o capital", afirmou a presidente da Caixa, que recordou ainda que o banco passou em 2021 pela pior crise reputacional dos últimos anos, com acusações contra o ex-presidente do banco, Pedro Guimarães, de assédio moral e sexual contra funcionários da instituição.
Maria Rita disse que o processo de investigação envolvendo as acusações foi encerrado e encaminhado para os órgãos competentes. "Aguardamos ansiosamente a posição da Justiça sobre o processo investigativo."