Governo articula mudanças em MPs para transformar textos em PLs ou emendas
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo articula com o Congresso mudanças em MPs (medidas provisórias) já enviadas aos parlamentares para transformá-las em PLs (projetos de lei) com urgência constitucional ou emendas a outros textos, incluindo itens do pacote de ajuste fiscal do ministro Fernando Haddad (Fazenda) ?como as alterações no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais).
As negociações são feitas em meio ao impasse entre Câmara e Senado sobre a tramitação das MPs. O diagnóstico de representantes do Congresso ouvidos pela reportagem é que as alternativas precisam ir adiante porque, sem acordo entre as duas Casas sobre o rito de análise, o avanço das medidas é inviável.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), demandava que as MPs passassem a ser analisadas primeiro na Casa e só depois no Senado ?diferentemente do previsto na Constituição hoje, que determina que a análise inicie de forma conjunta.
Diante da resistência, Lira passou a defender nos últimos dias que mais deputados integrassem as comissões mistas que analisam as MPs ?o que não foi aceito pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Conforme relatado à reportagem, três MPs vão continuar o rito normal e devem ser votadas. Há expectativa de que os textos do programa Mais Médicos e do Programa de Aquisição de Alimentos também permaneçam normalmente.
Já para as MPs restantes ?como as relativas ao Carf, ao Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), à Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e à desoneração dos combustíveis?, a previsão de representantes do Congresso é que passem a ser PLs, a serem protocolados já nesta terça (11) ou nos próximos dias. Membros do governo acrescentam que os textos podem virar emendas em outras MPs que permanecerão em tramitação.
Na semana passada, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que havia sido alcançado um acordo para a apreciação de quatro MPs ?incluindo a do Carf. Agora estão asseguradas nessa lista a MP que recriou ministérios, a que instituiu o novo Bolsa Família, e a do novo Minha Casa, Minha Vida.
O tema foi discutido em reunião na tarde desta segunda-feira (10) com participação de ministros, líderes do governo da Câmara e do Congresso e do próprio Lira. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que esteve no encontro, confirmou à reportagem a mudança da MP do Carf para um projeto de lei.
De acordo com interlocutores da Câmara que participaram diretamente das negociações e defendem as mudanças, o projeto de lei pode ter uma tramitação mais rápida que a MP porque será encaminhado nesses casos com urgência constitucional.
Com esse carimbo, o PL terá até 45 dias para ser votado antes de trancar a pauta da Casa. Já as MPs têm prazo de 120 dias para serem votadas ?embora tenham força de lei imediata.
Pelo acordo costurado, as MPs já enviadas não serão retiradas da tramitação ?ou seja, elas continuam produzindo efeitos práticos até a aprovação do projeto de lei ou emenda análoga (ou após o término do prazo de 120 dias).
A MP do Carf sofria resistência entre lideranças da Câmara. Parlamentares do centrão davam como certa que ela seria derrotada na Casa.
Outra medida que sofre críticas entre parlamentares é a que extingue a Funasa, órgão que historicamente é usado como instrumento de negociação entre parlamentares.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), voltou a criticar essa MP em conversa com jornalistas nesta segunda.
"Acho que não é pauta para eu me preocupar aqui na Câmara. É uma matéria que, na minha opinião, não deveria ter vindo para cá. Nem sequer estou preocupado em instalar a comissão e nem vou me preocupar porque é uma matéria que não tem a menor importância para o país, extinguir ou manter a Funasa", afirmou.
DISPUTA
A questão das medidas provisórias tornou-se alvo de disputa entre a Câmara e o Senado e vinha ameaçando que matérias de interesse do governo perdessem o prazo, tornando-se sem eficácia. A polêmica está justamente no rito de apreciação.
Lira gostaria de manter uma regra excepcional instituída durante a pandemia segundo a qual as MPs são examinadas primeiro pelos deputados e depois pelos senadores ?eliminando a etapa em que comissões formadas por representantes das duas Casas legislativas fazem a votação inicial.
Já Pacheco ampara-se na Constituição ao reivindicar a volta das comissões, de modo a restabelecer a influência de seus pares na análise das medidas.
Lira e Pacheco expuseram suas razões em artigos publicados pela Folha. O primeiro argumenta que o procedimento anterior à pandemia, além de disfuncional, atentava contra a representação popular ao fixar o mesmo número de deputados e senadores nas comissões.
O segundo defende o respeito à lógica bicameral do Legislativo, pela qual as duas Casas devem ter papel equivalente na confecção das leis.