Governo obtém maioria em julgamento bilionário no STJ, mas Supremo adia efeito prático

Por LUCAS MARCHESINI E CONSTANÇA REZENDE

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Uma medida cautelar do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) André Mendonça suspendeu os efeitos do julgamento no STJ (Superior Tribunal de Justiça) sobre a possibilidade de excluir benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos estados da base de incidência de dois tributos federais (no caso, IRPJ e CSLL).

Mendonça determinou que, caso o julgamento já tivesse começado ou tivesse sido concluído, a decisão da corte seria tornada sem efeitos até julgamento posterior do Supremo sobre o tema.

Diante disso, os ministros do STJ decidiram continuar com a sessão nesta quarta (26). O relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, votou parcialmente a favor da Fazenda e foi seguido por outros cinco ministros, formando maioria. A turma tem dez magistrados.

O julgamento é de especial interesse do ministro Fernando Haddad (Fazenda), que anunciou neste ano a intenção de enviar uma proposta para restringir o uso do instrumento. Ele calcula um incremento de até R$ 90 bilhões ao ano na arrecadação federal caso as alterações sejam aprovadas, auxiliando na tarefa de reequilibrar as contas públicas.

"Essas pessoas estão sonegando um imposto. Não tem outra palavra. Elas têm que voltar a pagar o que sempre pagaram", disse Haddad na tarde desta quarta (26) ao comentar o caso. Ao ser questionado sobre a liminar de Mendonça, ele não quis se pronunciar.

Atualmente, as empresas conseguem decisões judiciais favoráveis para retirar o montante de benefícios da base de cálculo dos tributos federais ?o que diminui a arrecadação da Receita Federal.

A discussão sobre o tema já havia começado na Primeira Seção do STJ na tarde desta quarta quando a corte recebeu a decisão de Mendonça. A notícia foi trazida ao plenário pelo advogado de uma das empresas que sustentam que o benefício deve levar ao pagamento de um imposto federal menor, mas a corte prosseguiu com o julgamento até receber a notificação oficial.

Na liminar, o ministro do STF se baseou no fato de que há no STF um caso que trata da incidência de créditos tributários de ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins, outro tributo federal, e que portanto seria necessário esperar uma decisão do Supremo.

"Vislumbro o perigo de dano irreparável e a necessidade de salvaguardar o resultado útil da prestação jurisdicional feita pelo STF no corrente processo", escreveu Mendonça na sua decisão.

Para ele, uma definição do STF sobre o tema "muito provavelmente impactará no julgamento pelo STJ da controvérsia relativa à possibilidade de exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS ?tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros? da base de cálculo do IRPJ e da CSLL".

Com isso, o caso só deve prosseguir a partir de um posicionamento do STF. Primeiro, o plenário do Supremo deve decidir se a liminar será mantida. Se esse for o caminho, a corte deverá então julgar o caso envolvendo PIS/Cofins e ICMS.

O pedido de liminar ao STF foi feito pela Abag (Associação Brasileira do Agronegócio), que também participa do caso no STJ.

O adiamento é uma frustração para o Ministério da Fazenda, que conta com os recursos para diminuir o déficit fiscal neste ano e também como parte do plano para o país sair do vermelho no ano que vem. Com o adiamento, a decisão é postergada ?assim como a possível elevação na arrecadação.

O julgamento iniciado hoje no STJ teria impacto em todos os casos semelhantes tramitando no Judiciário ao fixar um entendimento único sobre o caso. Há, de acordo com o STJ, mais de 450 decisões monocráticas e de 50 acórdãos sobre o assunto no órgão.

Na segunda-feira (24), Haddad se reuniu com o ministro do STJ Benedito Gonçalves para tratar do assunto e classificou o julgamento como um "teste importante" e criticou o que ele classificou como subvenção para custeio (ou seja, para despesas correntes). Para ele, as empresas só poderiam ter o benefício caso façam investimentos.

A PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), responsável pela defesa do governo no caso, defende que a redução de custo para a empresa a partir do benefício do ICMS não aumenta a base de cálculo dos tributos federais e, por consequência, não deveria ser deduzido.

O órgão faz um contraponto com outra decisão importante tomada pelo STJ envolvendo o ICMS. Em 2017, o tribunal decidiu contra o governo federal ao apontar que o crédito presumido de ICMS deveria ser excluído da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Naquele caso, avalia a PGFN, o crédito presumido entrava no balanço das empresas como um valor positivo, o que necessitava a retirada dele da base de cálculo dos tributos federais. Nesse caso, aponta, isso não acontece.