Divergências adiam discussão do arcabouço fiscal na Câmara para próxima semana

Por IDIANA TOMAZELLI

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A retomada da discussão do novo arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados deve ficar para a próxima semana, em meio a divergências entre lideranças sobre o conteúdo das mudanças feitas pelos senadores.

O adiamento também ocorre no momento em que o centrão tenta selar as negociações com o Palácio do Planalto para o embarque de siglas como o PP e o Republicanos no primeiro escalão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Segundo lideranças e o próprio relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA), a decisão foi deixar para a próxima semana a discussão e "eventual votação" da regra fiscal proposta pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda).

O novo arcabouço já foi aprovado pelos deputados, mas sofreu alterações no Senado e, por isso, precisa ser apreciado novamente pela Câmara.

O governo busca uma aprovação célere, para dar mais conforto ao envio da proposta de Orçamento de 2024 -cujo prazo se encerra em 31 de agosto.

Antes do recesso parlamentar, interlocutores da equipe econômica diziam que seria possível concluir a peça orçamentária em tempo hábil e sem sobressaltos se o novo marco fiscal fosse aprovado ainda na primeira semana de agosto, mas que um eventual adiamento para além desse prazo seria motivo de apreensão.

Na segunda-feira (31), o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), disse que os parlamentares têm até 31 de agosto como prazo para votação. "Até lá penso que a Câmara vai se debruçar com muita tranquilidade só sobre as alterações que o Senado fez. O resto do projeto já está em ordem, já está precificado inclusive pelo mercado financeiro", afirmou, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura.

Até o momento, não há um acordo em torno das mudanças. O Senado excluiu despesas com ciência e tecnologia, com o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) e com o FCDF (Fundo Constitucional do Distrito Federal) do alcance do limite de despesas do arcabouço.

No caso do Fundeb e do FCDF, a exclusão constava no projeto original do governo, mas a Câmara decidiu colocar esses gastos sob o arcabouço por se tratarem de despesas primárias. Agora, há divergências para definir se os deputados retomarão a proposta aprovada por eles mesmos, ou se as alterações do Senado serão acatadas.

A expectativa é que o tema seja discutido em uma próxima reunião de líderes na semana que vem.

À Folha, Cajado disse que já tem seu parecer pronto, mas evitou antecipar posicionamentos porque ainda pretende discutir os temas com as lideranças da Câmara.

Ainda assim, o relator argumentou que excluir despesas do arcabouço pode prejudicar a evolução do conjunto das despesas. Segundo ele, incluir Fundeb, FCDF e ciência e tecnologia sob o limite garante um valor adicional próximo a R$ 100 bilhões em despesas que ficarão na base de cálculo do arcabouço -sobre a qual incidirá a correção anual.

"Se corrige no limite de até 2,5%, com a conta de R$ 2,2 trilhões [em despesas totais] e tirar R$ 100 bilhões, [a base de cálculo] fica em R$ 2,1 trilhões, e você perde entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões para o conjunto de despesas", disse. "Ninguém fez essa conta, o próprio governo deixou passar."

Segundo ele, se as despesas ficarem fora do arcabouço, elas seguirão sua própria dinâmica, mas sem nenhum benefício para o conjunto dos demais gastos.

Em maio, quando houve a primeira discussão do tema na Câmara, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, disse que a inclusão de Fundeb e FCDF sob o limite poderia achatar as demais despesas com o passar do tempo, uma vez que elas tendem a crescer em ritmo mais veloz.

Para Cajado, o que o governo fez ao excluir Fundeb e FCDF foi um "copia e cola" do teto de gastos, regra fiscal aprovada no governo Michel Temer (MDB) e que previa o crescimento do limite apenas pela inflação. Segundo ele, nesse contexto fazia sentido prever exceções, mas o arcabouço dá mais flexibilidade, permitindo crescimento real (acima da inflação) entre 0,6% e 2,5% ao ano.

"Se for pelo critério meritório, todos [os gastos] deveriam estar fora da base", disse o relator. "É injusto deixar ciência e tecnologia fora [dos limites do novo arcabouço fiscal] e deixar Bolsa Família, saúde, fundos das Forças Armadas [dentro da regra]", afirmou.