Justiça determina que concessionária deve ficar com a BR-040 até uma nova licitação

Por PEDRO S. TEIXEIRA E THIAGO BETHÔNICO

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A um dia do fim do contrato de concessão do trecho entre Brasília e Juiz de Fora da BR-040 à Invepar, a Justiça Federal determinou nesta quinta (17) que a concessionária dê continuidade à prestação de serviços até que uma nova licitação seja concluída.

A decisão do juiz Guilherme Mendonça Doehler ainda mantém a tarifa praticada em R$ 6,30 no pedágio entre Belo Horizonte e Juiz de Fora, como indicado no último aditivo celebrado entre a União e a empresa. Ao descumprimento da determinação cabe multa de R$ 100 mil.

Questionada se pretende recorrer, a concessionária disse que vai acatar a decisão.

A União e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) devem tomar as medidas administrativas necessárias para assegurar a continuidade dos serviços essenciais na rodovia, mantendo também o valor da tarifa até a conclusão do edital, determina Doehler.

A ação civil pública foi protocolada pelo Ministério Público Federal de Minas Gerais (MPF-MG) a 20 dias da data-limite visando garantir o funcionamento da rodovia, mesmo sem conclusão do edital de relicitação --a devolução amigável do ativo para que novo leilão seja feito pelo governo.

Na avaliação do MPF, o encerramento das relações contratuais é ilícito e pode prejudicar o patrimônio público e os direitos dos usuários da rodovia.

Em nota, a ANTT afirma que segmentará o projeto de concessão da BR-040 em três trechos independentes: um de 595 km entre Cristalina, Goiás, e Belo Horizonte; outro de 482 km entre Juiz de Fora e Rio de Janeiro; e mais um de 139 km entre Brasília e Cristalina. A agência diz trabalhar nas três licitações.

Caso a Invepar tivesse devolvido a Via 040, as 11 praças de pedágio seriam desativadas, e os serviços mecânicos, de conservação, monitoramento e emergência deixariam de ser prestados. O trecho, então, passaria a ser administrado pelo Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes).

A Invepar anunciou sua intenção de relicitar a rodovia em 2017. Em seu site, a Via 040 afirma que, desde o início da operação, vem enfrentando um quadro desafiador e diferente do período que antecedeu o leilão, realizado em 2013.

"As condições de financiamento bancário para investimentos foram modificadas, houve atrasos e fragmentação na emissão das licenças ambientais para execução de obras e, além disso, a redução significativa da atividade econômica brasileira afetou diretamente o tráfego de veículos e passageiros", diz o comunicado.

A companhia ainda alega prejuízo financeiro e diz que, entre o início da concessão e dezembro de 2020, perdeu R$ 1,1 bilhão.

Com o caixa devastado, a concessionária deixou uma série de obrigações não cumpridas. Dos 557 quilômetros previstos em edital para serem duplicados, por exemplo, apenas 73 quilômetros foram executados.

Em 2020, após aderir ao programa de relicitação, a Via 040 assinou um termo aditivo de contrato, estabelecendo um novo prazo para a empresa seguir administrando a rodovia.

A expectativa era que nesse período o governo fizesse estudos de modelagem e estabelecesse as condições para realizar um novo leilão transferindo a BR-040 para outra concessionária.

Mas isso não ocorreu e, dois anos depois, em fevereiro de 2022, a ANTT aprovou a prorrogação do termo aditivo por 18 meses, com prazo final para esta sexta (18). O imbróglio foi prorrogado novamente nesta quinta.

Para tentar chegar a uma solução consensual, uma audiência com a Invepar e a ANTT foi marcada para o último dia 10, na Justiça Federal, em Belo Horizonte. Mas a reunião terminou sem acordo.

Uma segunda tentativa de audiência ocorreu na tarde desta quarta-feira (16) -novamente sem consenso.

De acordo com uma pessoa envolvida diretamente nas negociações, a proposta da concessionária foi: usar R$ 125 milhões em tarifa amortizada para custear a prestação de serviços por mais seis meses (até fevereiro). A ANTT teria recusado.

**BR-040 É UMA DAS CONCESSÕES PROBLEMÁTICAS**

A Via 040 é um dos ativos de infraestrutura que vêm sendo chamados de "concessões estressadas". Nessa lista, estão aeroportos, rodovias e ferrovias que passaram a ser administrados pela iniciativa privada nos últimos anos e hoje apresentam desequilíbrio financeiro grave, que praticamente inviabilizam a operação.

Fazem parte desse grupo os aeroportos do Galeão, no Rio de Janeiro, e de Viracopos, em Campinas. Também estão em relicitação a ferrovia Rumo Malha Oeste, e outras quatro rodovias: Arteris Fluminense, Eco101, MSVia e Concebra.

Boa parte dos ativos estressados foi concedida à iniciativa privada durante o governo da presidente Dilma Rousseff (PT). No caso das estradas, a maioria dos ativos problemáticos foi leiloada na chamada terceira etapa do programa de rodovias.

Empresários e especialistas apontam que as concessões dessa época acabaram sendo frustradas pela crise financeira iniciada em 2014, pela Operação Lava Jato, e principalmente por problemas na modelagem dos contratos --que exigiam investimentos volumosos dos operadores num prazo curto e antecipavam uma demanda muito maior do que veio a se concretizar.

"Falava-se em duplicação de ponta a ponta num curto espaço de tempo, isso também levava o fluxo de caixa desses projetos a ficar muito vulnerável às mudanças macroeconômicas. E essas mudanças vieram", diz Marco Aurélio de Barcelos, diretor-presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias).

**RODOVIAS FEDERAIS EM RELICITAÇÃO**

Autopista Fluminense

Concessionária: Arteris

Extensão do trecho: 320 km

Concedido em: 2008

Prazo de concessão: 25 anos

Eco101

Concessionária: Ecorodovias

Extensão do trecho: 475,9 km

Concedido em: 2013

Prazo de concessão: 25 anos

MSVia

Concessionária: CCR

Extensão do trecho: 847,2 km

Concedido em: 2014

Prazo de concessão: 30 anos

Via 040

Concessionária: Invepar

Extensão do trecho: 936,8 km

Concedido em: 2014

Prazo de concessão: 30 anos

Concebra

Concessionária: Triunfo

Extensão do trecho: 1.176,5 km

Concedido em: 2014

Prazo de concessão: 30 anos

Fonte: ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres)