Banco volta atrás do retorno integral ao escritório

Por STÉFANIE RIGAMONTI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Passada a pandemia de Covid-19, que impôs novas rotinas por causa do isolamento, agora as empresas se adequam a novos modelos de trabalho. O banco de investimentos BR Partners é um exemplo.

A empresa foi uma das primeiras que passaram a exigir o retorno integral dos funcionários ao escritório, mas notou no meio do caminho que o modelo híbrido poderia ser melhor. Recentemente, o banco decidiu abrir um dia de home office para a área de investment banking.

A flexibilização ocorrerá primeiramente como um teste nesse departamento do banco, enquanto a companhia estuda ampliar a medida para as demais áreas.

"Começamos por essa equipe por uma questão de demanda. É um departamento no qual as pessoas trabalham muitas horas por dia, lidam com um nível alto de estresse e vimos a medida como uma forma de retenção dos funcionários", diz Giovana Nonato Petrilli, sócia e superintendente de RH do banco.

Petrilli conta que, pelo perfil do cargo, três outras equipes do banco nunca voltaram ao presencial integralmente, desfrutando de um modelo mais flexível de trabalho: desenvolvimento, sistemas e backoffice. Nessas áreas, os funcionários têm dois dias de trabalho remoto.

A medida do BR Partners se dá na esteira da resistência de funcionários ao retorno 100% presencial aos escritórios, enquanto diversas empresas tentam abolir o home office.

Uma pesquisa realizada entre abril e maio deste ano pelo Infojobs e pelo Grupo Top RH mostra que mais de 85% dos profissionais que voltaram integralmente aos escritórios trocariam de emprego caso encontrassem um trabalho que permitisse cumprir jornadas em casa.

Esse movimento no BR Partners começou justamente em setores que nunca voltaram 100% presencial: aqueles mais ligados à tecnologia.

Diretor de RH na Empiricus Investimentos, que faz parte do BTG Pactual, Thiago Veras chama atenção para o fato de que há uma década, muito antes da pandemia, os profissionais de tecnologia foram pioneiros e têm liderado um movimento conhecido como "work from anywhere" (trabalhe de qualquer lugar, em tradução livre).

Pela natureza do trabalho e por ser um mercado com poucos profissionais especializados e oferta de emprego em crescimento, esses colaboradores conseguiram ter força para exigir a atividade remota bem antes da pandemia de Covid-19.

"Houve uma articulação desse grupo e, depois da pandemia, organicamente esse modelo de trabalho foi se pulverizando para outras áreas. Não foi um movimento organizado, mas fluido", diz Veras.

CABO DE GUERRA

O executivo conta que, no início da pandemia, ele era muito cético com relação ao "novo normal" que tanto diziam. Por conhecer o modelo de liderança que impera nas empresas, Veras diz que já esperava por esse movimento de volta integral aos escritórios.

Porém, ele nota que, hoje, há um movimento pendular, de as companhias cobrarem o retorno ao modelo clássico de trabalho, enquanto os profissionais apresentam resistência.

Segundo Veras, o mercado de trabalho aquecido no Brasil contribui para essa força de oposição, o que leva as empresas muitas vezes a se adaptarem à nova realidade.

Hoje, muitas companhias adotam o regime híbrido de trabalho como um dos benefícios oferecidos aos trabalhadores, para atrair bons candidatos.

O pesquisador e consultor internacional Joaquim Santini, mestre em mudança organizacional, diz que o que está por trás da exigência das companhias ao retorno 100% presencial, mesmo sem necessidade em determinados cargos, é o modelo clássico de gestão, no qual os líderes acreditam que podem controlar a força de trabalho se supervisionarem o funcionário.

"É um modelo extremamente arcaico, que não faz sentido. E chega até mesmo a ser autoritário. Estudos mostram como o modelo híbrido diminuiu a incidência de burnout entre os profissionais e aumentou a eficiência. Porque, com o home office, as pessoas se sentem mais livres e são empoderadas para se autocontrolar e entregar o que precisam", diz Santini, que também é especializado em psicanálise.

Um estudo da consultoria Gallup, feita com trabalhadores americanos que se encontram no modelo híbrido de trabalho, mostra que, para 61% dos entrevistados, o home office diminuiu o burnout --distúrbio emocional que traz sintomas como exaustão, estresse e esgotamento físico em razão de trabalho desgastante.

Ainda segundo o estudo, para 76% o trabalho remoto ajudou a balancear melhor a divisão trabalho-vida pessoal; para 52% melhorou a produtividade; e para 64% houve uma melhora na eficiência do uso do tempo.

Santini diz acreditar que o modelo híbrido veio para ficar e, apesar dessa insistência inicial das empresas no retorno integral aos escritórios, elas terão de se ajustar.

Segundo o consultor, o mercado brasileiro deu um salto tecnológico nos últimos anos, possibilitando que diversas áreas onde, até então, era impossível de se pensar na execução do trabalho remoto, agora consigam desfrutar de uma flexibilização nas jornadas.

Além da satisfação dos funcionários e de ser uma ferramenta para retê-los, a adoção do modelo híbrido é positivo também do ponto de vista da economia das empresas, segundo Santini.

Ele cita o exemplo da Heineken no Brasil, empresa para a qual prestou serviços de consultoria. Assim que a cervejaria foi forçada a adotar o home office por causa da pandemia, ela viu os benefícios do modelo híbrido e decidiu adotá-lo permanentemente.

"Esse novo modelo deu tão certo para eles que, hoje, não cogitam mais voltar ao que era antes", afirma.

Procurada, a assessoria da Heineken corroborou a informação, dizendo que a companhia adota um modelo flexível de trabalho, com o regime 100% remoto.

Com isso, a empresa reduziu a quantidade de andares em seu escritório de São Paulo, localizado na Vila Olímpia. A companhia agora segue uma filosofia de que o espaço físico da empresa deve ser de conexão, de troca entre os times e momentos de descontração.