'É preciso atacar a causa dos juros altos do rotativo', diz presidente da Febraban

Por STÉFANIE RIGAMONTI E ANA PAULA BRANCO

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Isaac Sidney, disse nesta sexta-feira (1º) que falta sensatez na discussão sobre o rotativo do cartão, e afirmou que o problema não está nessa modalidade de crédito oferecida pelos bancos, mas sim nos juros altos.

"O problema está no motor do carro, não nos pneus. Não adianta trocar os pneus de um carro que está com o motor avariado. O problema não é o rotativo, são os juros do rotativo. Nós não temos nenhuma hipocrisia ao reconhecer que esses juros estão altos", declarou, durante almoço da Febraban com banqueiros.

Sidney, contudo, disse que é preciso atacar a causa, não os sintomas. "A questão não é se são altos [os juros], mas por que estão altos e como podemos fazer para que os juros do rotativo venham a diminuir."

O presidente da Febraban disse que as propostas que têm sido levantadas, como o limite dos juros do rotativo, são insuficientes para solucionar esse problema estruturalmente.

Sidney disse que outros países, como Chile e Colômbia, mostraram que intervir na formação de preços pode distorcer a oferta e demanda e, por isso, o tabelamento dos juros não seria uma boa solução.

"O resultado [nessas economias] foi desastroso, houve exclusão bancária em vez de bancarização", disse. "Portanto, os caminhos que têm sido adotados [no Brasil] não são aqueles que vão favorecer uma queda estrutural [dos juros]".

Segundo o presidente da Febraban, é preciso atacar essa questão pelo lado da competitividade. Ele citou como exemplo as fintechs, que mesmo com toda a tecnologia para baratear os serviços bancários, não conseguem oferecer juros menores do que os bancos tradicionais.

Sidney ainda disse que nunca defendeu o fim do parcelado sem juros, afirmando que ele é importante para a economia, mas mencionou uma preocupação em relação ao "empilhamento das prestações sem fim". "Estamos preocupados com a sustentabilidade do principal produto de consumo do país", declarou.

Em discurso ao lado do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, ele disse contar com o BC para encontrar uma solução.

"Temos muita confiança de que vamos avançar na interlocução com a Fazenda", declarou. Segundo Sidney, é preciso encontrar um caminho para que o risco de inadimplência seja remunerado.

Diretores do BC, por sua vez, têm reiterado o papel da instituição de intermediário e facilitador dessa discussão. O diretor de política monetária do BC, Gabriel Galípolo, disse na última quinta-feira (30) que se os envolvidos nessa negociação não construírem uma solução consensual, o Legislativo terá de resolvê-la.

Após o evento, a jornalistas, Sidney voltou a dizer que o Banco Central é que deve endereçar esse problema.

"Hoje no Brasil nós temos 75% de recebíveis que não estão remunerados; 15% da carteira de crédito das famílias também não recebe qualquer remuneração de juros. E 50% das compras são parceladas. O resultado disso qual é? Nós temos uma inadimplência de 50%", declarou. "Portanto, eu acho que nós temos uma questão prudencial de estabilidade financeira."

ENTENDA

Desde outubro, o BC tem coordenado reuniões com representantes de bancos, adquirentes, cartões e varejo para discutir a regra da lei do Desenrola que limita a dívida do rotativo a 100% do valor original, caso o próprio setor não chegue a outra fórmula para reduzir as altas taxas. Atualmente, os juros dessa modalidade superam os 400% ao ano.

O texto da lei não faz nenhuma menção às compras parceladas e não manda restringir as compras parceladas sem juros no cartão. Bancos, no entanto, têm defendido a restrição dessa modalidade de crédito como forma de baixar as altas taxas do crédito rotativo -modalidade acionada automaticamente quando a fatura do cartão não é paga de forma integral.

O argumento dos bancos é que o parcelado sem juros aumenta a inadimplência e força a cobrança de juros altos no rotativo. Os setores de maquininhas e o comércio, porém, refutam esse argumento, e não há estudos públicos independentes que mostrem relação de causa e efeito entre parcelamento sem juros e inadimplência.