Americanas propõe aumento de participação para trio de bilionários e deságio de 80% para credores em assembleia

Por DANIELE MADUREIRA E JÚLIA MOURA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Assembleia Geral de Credores (AGC) da Americanas, que está sendo realizada de maneira online desde as 14h desta terça (19), propôs deságios aos fornecedores que vão de 50% a 80% da dívida. Para detentores de opções em ações (stock options), o desconto proposto foi de 93%. Os credores também devem se comprometer a não processar a empresa.

Por outro lado, os principais acionistas da empresa, o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, hoje detentores de 30,1% da empresa, deve aumentar sua participação para 46% ou 49,3%, a depender do resultado do aumento de capital.

O plano envolve o aumento de capital da companhia via emissões de novas ações. Serão R$ 12 bilhões para os principais acionistas e até R$ 12 bilhões para os bancos, totalizando uma injeção de R$ 24 bilhões na varejista.

A varejista alterou a cláusula que estabelece o preço de emissão das novas ações. O valor da ação será calculado com base no critério de 1,33 vezes o preço médio ponderado por volume de negociação das ações ordinárias nos 60 dias antes da véspera da data da aprovação do plano.

Se o plano for aprovado nesta terça-feira, o preço será de R$ 1,30 por ação.

A empresa também prevê no plano R$ 2 bilhões para pagamento de credores financeiros por meio de mecanismo de leilão reverso e R$ 6,7 bilhões para aqueles que optarem por receber antecipadamente, mas com forte desconto.

O encontro está sendo conduzido pelos administradores judiciais da companhia, Bruno Rezende, sócio do Preserva Ação Administração Judicial, e Sérgio Zveiter, do Zveiter Escritório de Advocacia, com a participação da diretora de relações com investidores da Americanas, Camille Faria.

A assembleia ocorre com a presença maciça de credores quirografários (sem garantias), que representam 97,36% da dívida da Americanas. Para instalação da assembleia, era necessária a presença de credores que somavam ao menos 50,01% da sua dívida, da ordem de R$ 42,5 bilhões.

Os credores das Classes 1 (trabalhistas) e 4 (micro e pequenas empresas) não participaram da assembleia geral de credores, uma vez que ambos não tiveram suas condições de pagamento alteradas. Dessa forma, não foram considerados para quórum e não votaram. Das dívidas com essas classes, que somavam R$ 263,1 milhões, ainda faltam pagar R$ 148,6 milhões, que serão quitados 30 dias após a homologação do plano.

'PRAGMATISMO' NA NEGOCIAÇÃO ENTRE TRIO E BANCOS CREDORES

A reportagem apurou que os ânimos por parte dos bancos, os grandes credores da varejista, até do Safra, que se mostrava até então o mais belicoso, arrefeceram. Uma fonte ligada ao mercado financeiro disse, em condição de anonimato, que um acordo que dê sobrevida à Americanas é um resultado favorável para todos. Para os bancos, ficou claro que a culpa pela fraude contábil de R$ 25 bilhões está com a antiga diretoria, disse.

Quanto ao possível envolvimento de um dos principais acionistas, Beto Sicupira, o personagem do trio de bilionários do 3G que sempre esteve à frente da Americanas, o episódio deixou algum ressentimento, mas houve pragmatismo tanto por parte dos credores quanto do trio para resolver a questão, segundo a fonte.

Sicupira, inclusive, deve arcar sozinho com um aporte de R$ 6 bilhões dentro dos R$ 12 bilhões, como penalidade, seja por omissão, seja por envolvimento, afirmou.

Para os bancos, disse, agora a empresa é viável, porque foi contabilizada com quase R$ 30 bilhões, entre conversão de dívida e dinheiro novo.

Em recuperação judicial desde 19 de janeiro deste ano, a Americanas soma dívidas de R$ 50,1 bilhões. Mas neste valor estão os créditos intercompany (de companhias do próprio grupo). Retirando essas empresas da conta, o valor das dívidas soma R$ 42,5 bilhões. Excetuando os credores das Classes 1 e 4, o valor chega a R$ 42,4 bilhões.

Camille Faria apresentou o plano de recuperação judicial da companhia. Como foram indicadas mudanças em várias cláusulas do plano -o que pode gerar pedido de suspensão por parte dos credores- o administrador judicial promoveu uma votação na assembleia, para saber quem concordava com a suspensão da reunião. Pela enquete, apenas 10,85% concordaram.

Na visão de fontes do mercado financeiro e empresarial que acompanham o caso, e têm ou tiveram relações comerciais com a Americanas, que também falaram em condição de anonimato, a empresa tem pressa em colocar panos quentes sobre o caso, para que o episódio da fraude contábil caia no esquecimento.

Segundo essas fontes, estaria articulada uma estratégia do ponto de vista político para acelerar a aprovação do plano e escapar de qualquer julgamento na esfera criminal.

A Americanas refutou essas alegações e disse ser "a maior interessada no esclarecimento dos fatos, inclusive na esfera criminal, e que irá responsabilizar judicialmente todos os envolvidos."