Distância entre dólar financeiro e oficial na Argentina aumenta nos primeiros dias de Milei

Por DOUGLAS GAVRAS

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O dólar CCL (Contado con Liqui), um dos mais utilizados em operações no mercado financeiro argentino, atingiu a maior distância ante o câmbio oficial desde a desvalorização do peso feita logo após a posse de Javier Milei.

Nesta sexta-feira (5), o CCL era negociado acima de 1.140 pesos, um patamar superior aos 1.110 registrados em 20 de outubro, último dia útil antes do primeiro turno das eleições presidenciais.

A alta em relação ao fechamento de quinta-feira (4) é de 4,9%, e o valor de 1.140 é 41% mais alto do que o dólar oficial.

Em 13 de dezembro, já com o novo governo e com a desvalorização do dólar oficial, o CCL estava em 1.012 pesos (26,5% maior).

O dólar CCL é uma das principais taxas de câmbio financeiras do país, juntamente com o dólar MEP (Mercado de Pagamentos Eletrônicos).

O CCL é uma ferramenta que permite que os pesos sejam trocados por dólares no exterior, o que o torna a principal forma de muitas empresas e investidores comprarem moeda estrangeira.

A operação consiste na compra e venda de ações ou títulos de dívida em pesos cotados no país e em outro mercado estrangeiro.

Com a redução da demanda pela divisa argentina ocorrendo antes do esperado pelos analistas, os investidores têm buscado se proteger da inflação por meio da compra da moeda norte-americana, um movimento que acaba ampliando a diferença em relação ao dólar oficial. O CCL está em sua quarta alta consecutiva.

Já o dólar livre, ou "blue", estava cotado a 1.025 pesos. O "blue" é a cotação de dólar mais utilizada na Argentina. Apesar de ser clandestina, ela é a referência para a economia local, e não o "dólar oficial", cuja cotação é controlada pelo BCRA (Banco Central da República Argentina).

O MEP, que é depositado e circula dentro do mercado argentino, era cotado a 1.104 pesos.

Logo que assumiu a Presidência, Milei implementou uma forte desvalorização do peso argentino e revogou controles de preços, o que provocou uma série de reajustes.

Em dezembro, o FMI (Fundo Monetário Internacional) elogiou as medidas econômicas "ousadas" anunciadas pelo ministro da Economia argentino, Luis Caputo, que, além da forte desvalorização do peso, incluía cortes nos gastos do Estado.

O governo suspendeu obras públicas, reduziu o repasse às províncias e aumentou impostos temporariamente.

"Uma implementação decisiva ajudará a estabilizar a economia e a estabelecer as bases para um crescimento mais sustentável e liderado pelo setor privado", disse em comunicado o FMI, que tem um empréstimo de US$ 44 bilhões (R$ 215,1 bilhões) com o país vizinho.

A partir desta sexta-feira, a equipe econômica terá uma série de reuniões com representantes do fundo. Essa é a primeira visita de altos representantes do FMI desde 2020, e o objetivo é tratar da dívida do país.

De acordo com a imprensa argentina, técnicos do vice-diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do FMI, Luis Cubeddu, vão se reunir com funcionários do Banco Central. Ao longo do fim de semana, também estão previstas reuniões com integrantes do Ministério da Economia.

O encontro oficial com o ministro da Economia, Luis Caputo, e o chefe de Gabinete do governo, Nicolás Posse, está marcado para a próxima segunda-feira (8).

O governo argentino quer retomar negociações com o FMI para desbloquear de imediato um desembolso que permita o pagamento de US$ 2 bilhões (R$ 9,8 bilhões) de vencimentos previstos para janeiro. A Casa Rosada também deve tentar uma nova revisão do acordo.

Os vizinhos enfrentam uma crise econômica severa, com uma inflação que caminha para os 200%, falta de reservas em moeda estrangeira e elevação da pobreza.

A intenção é sinalizar aos credores que o novo governo está disposto a cumprir as principais metas acordadas com o FMI -de controle fiscal e de emissão monetária e acumulação de reservas-, além de melhorar a relação do país com o fundo em relação ao governo passado, de Alberto Fernández.

O governo espera levantar US$ 3,2 bilhões (R$ 15,72 bilhões) em moeda forte para pagar dívida por meio de uma emissão de títulos de dez anos para o BC, de acordo com decreto publicado no Diário Oficial do país.

Nesta sexta, o ex-ministro do governo anterior e responsável pela renegociação da dívida, Martín Guzmán, quebrou o silêncio que vinha mantendo ao longo da campanha de 2023 e fez duras críticas a Milei.

Em entrevista à emissora Radio con Vos, o economista disse que o governo já começou a dolarizar a economia via emissão de títulos em moeda norte-americana, e afirmou que este é o único plano do presidente.

"Há um conjunto de operações para converter o passivo remunerado do Banco Central em pesos em um passivo em dólar. Acredito que o governo já começou a dolarizar a economia, e nada seria tão grave para a Argentina", disse.