Encerramento da Copa do Mundo celebra família que comanda Qatar
LUSAIL, QATAR (FOLHAPRESS) - A data escolhida para a cerimônia de encerramento da Copa do Mundo tem um significado. É a comemoração do Dia Nacional do Qatar, que celebra a unificação do país em 1878 pelo emir Jassim bin Mohammed Al Thani. O país viria a se tornar Estado quase cem anos depois, em 1971, quando se declarou independente.
A celebração, feriado nacional, marca um dia de conquistas para o país. Enquanto as cidades são decoradas com bandeiras do Qatar, além dos adornos já colocados em decorrência do Mundial, o país é paralisado para assistir a desfiles, shows, apresentações de fogos de artifício e demonstrações aéreas.
Desta vez, o festejo se soma ao fechamento do evento esportivo anunciado em 2010, e celebra a família Thani. Festeja especialmente o emir Tamim bin Hamad Al Thani, 42, e seu pai, Hamad bin Khalifa Al Thani, 70, que comandou o país por 18 anos.
A junção das comemorações é uma representação dos feitos da dupla, que, após o anúncio do Mundial no Qatar, continuou investindo no "soft power" com projetos no Ocidente e ultrapassou o bloqueio árabe para receber a competição. Por outro lado, sofre críticas da comunidade internacional pelas violações de direitos de migrantes, de mulheres e do grupo LGBTQIA+.
Na festa de abertura, essas estavam entre as principais críticas. O país anfitrião do Mundial tentou varrer para baixo do tapete seu histórico de violações de direitos humanos com uma cerimônia baseada em um discurso de diversidade e inclusão. Mas a presença das mulheres e outros grupos minorizados, em sua maioria, não teve destaque.
A cerimônia de encerramento começou com atraso, somente após a chegada do emir. Marcada pela presença de mulheres do começo ao fim, começou com um coral feminino abrindo o show com "What a Wonderful World", de Louis Armstrong.
A solenidade teve sequência com a presença da qatariana Aisha e do nigeriano Davido, principais cantores da música oficial do Mundial, "Hayya Hayya" (ou "Better Together", em inglês).
Além deles, fizeram parte as intérpretes da música "Light the Sky", a canadense Nora Fatehi, a iraquiana Rahma Riad, a marroquina Manal, além de Balqees, nascida nos Emirados Árabes Unidos.
O cantor porto-riquenho Ozuna também fez parte, apesar de o país não participar do campeonato. Ao lado dele estava o rapper franco-congolês Gims.
A cerimônia, entre músicas oficiais do Mundial, letras que entraram para a história, jogos de luzes, coregrafias e baleias voadoras, durou poucos minutos. Logo em seguida, os times entraram em campo para o aquecimento.
Com a bola do jogo rolando, para a família Thani pouco importava o vencedor. Os astros dos dois times finalistas, Lionel Messi e Kylian Mbappé, são craques também do Paris Saint-Germain, equipe de propriedade da Qatar Sports Investments, subsidiária do fundo soberano do Estado do Golfo.
A empresa, fundada em 2004, durante o regime do pai do emir, também realizou a compra de cerca de 22% do Sporting Club de Braga, de Portugal, em outubro deste ano. Em outras palavras, o emir do Qatar é também dono de clubes de futebol da Europa.
O governo qatariano faz investimentos massivos em esporte, cultura e educação em países do Ocidente, tentando se firmar como potência para além do óleo e do gás no tabuleiro geopolítico global. Autoridades locais também veem os investimentos, internos e externos, como uma forma de preparar a nação para um futuro pós-combustíveis fósseis.
Na cultura, há obras faraônicas assinadas por artistas renomados ?como o Museu Nacional do Qatar, do arquiteto francês Jean Nouvel, que, inspirado em uma formação mineral chamada rosas do deserto, colocou de pé a gigante construção que conta a história do país segundo a vontade da família real. As propagandas do espaço contam com o ex-jogador inglês David Beckham.
Em outra mão, inauguraram, há 14 anos, o Museu de Arte Islâmica, uma espécie de templo religioso e artístico. Com os Thani à frente da estatal que chefia os museus, o Qatar busca se provar potência cultural para quem chega do Ocidente, mas com pés fincados na cultura local.
A família, na figura do emir Hamad Al Thani, superou também o agressivo bloqueio que algumas nações arábes impuseram ao Qatar em 2017. Na ocasião, foram cortados as relações diplomáticas e o transporte por terra, mar e ar. O emir foi acusado de financiar terrorismo, interferir na política externa dos vizinhos e aproximar-se demais do Irã.
Para livrar-se do bloqueio, o país fortaleceu a indústria nacional, as Forças Armadas e investiu em novos parceiros comerciais. As fortes reservas financeiras do país ajudaram a superar a crise, que chegou ao fim no início de 2021.
O país vê o bloqueio, como é chamado, como uma violação de direitos humanos. Na exposição sobre a história do país no Museu Nacional do Qatar, pais e mães contam que foram proibidos de ver e falar com os filhos, e estudantes falam sobre o momento em que foram forçados a voltar para casa devido às barreiras impostas por países como Arábia Saudita, Emirados Árabes, Bahrein e Egito.
O país, porém, nem sequer cita as violações que cometeu.