Bilionários e anticastristas, irmãos passaram a perna nos sauditas para ter Messi

Por ALEX SABINO

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os novos patrões de Lionel Messi são inimigos declarados da ditadura cubana e passaram a perna em outro país não democrático: a família real da Arábia Saudita.

De uma tradição anticastrista transmitida de pai para filhos, pouco afeitos a entrevistas e bilionários, os irmãos Jorge e José Mas conseguiram fechar a maior contratação da história da Major League Soccer, a liga profissional de futebol dos Estados Unidos.

Em um acordo salarial de US$ 40 milhões anuais (R$ 193 milhões pela cotação atual), o jogador eleito sete vezes melhor do planeta, capitão da seleção campeã mundial e craque da Copa do ano passado, no Qatar, aceitou trocar o Paris Saint-Germain pelo Inter Miami.

"Se fosse pensar apenas no dinheiro, teria ido para a Arábia", disse o atacante, rejeitando ter feito uma escolha apenas financeira.

É verdade. O Al Ittihad tinha tanta certeza da contratação do jogador que já preparava a festa de apresentação. Messi receberia, em troca, o maior salário da história do futebol: US$ 400 milhões (R$ 1,9 bilhão) por ano.

A remuneração do argentino nos Estados Unidos não será apenas o salário pago pelo clube. Sua aquisição será um grande golpe de marketing da Apple, dona dos direitos de transmissão por streaming da MLS. Messi vai receber uma porcentagem de novos pacotes vendidos. Também terá bônus pagos pela Adidas (sua patrocinadora pessoal) pela venda de camisas do clube.

Em poucos dias, o Inter Miami passou de 800 mil a 7 milhões de seguidores nas redes sociais.

Messi também terá direito a, no futuro, comprar com desconto uma franquia da liga ou ter participação acionária no Inter. Foi o mesmo pacote que atraiu o inglês David Beckham. Ao assinar contrato com o Los Angeles Galaxy, em 2007, ele recebeu o direito de ter o seu time na competição por US$ 25 milhões (R$ 120,5 milhões). O preço normal para "abrir uma equipe" na MLS hoje em dia está na casa dos US$ 200 milhões (R$ 964 milhões).

Beckham, acionista minoritário hoje em dia, fez parte do grupo que criou o Inter Miami em 2013. O líder do consórcio era o empresário boliviano Marcelo Claure. Os irmãos Mas entraram no negócio em 2017. Em setembro de 2021, eles compraram a parte de Claure, a do bilionário japonês Masayoshi Son e passaram a ter o controle da franquia.

Foi quando começou o namoro com Lionel Messi por intermédio do pai do jogador.

Jorge e José Mas são proprietários da MasTec, uma gigante de construção de infraestrutura nos Estados Unidos com sede em Miami. No ano passado, a empresa arrecadou US$ 9,8 bilhões (R$ 47,2 bilhões). O patrimônio pessoal de Jorge, o mais velho, é avaliado em US$ 1 bilhão (R$ 4,8 bilhões). O do caçula José, também dono do Zaragoza, na Espanha, é de US$ 500 milhões (R$ 2,4 bilhões).

Ambos são mais ricos que David Beckham, que tem fortuna estimada em US$ 420 milhões (R$ 2 bilhões).

A origem da fortuna da família Mas está no patriarca Jorge Canosa, um dos mais combativos ativistas contra a ditadura de Fidel Castro (1926-2016). Nascido em Cuba, ele se mudou para os Estados Unidos por ameaça de prisão em sua terra natal, no início dos anos 1960, por causa de sua oposição ao ditador.

Canosa tomou parte na invasão da Baía dos Porcos, a fracassada tentativa de derrubar Fidel Castro, engendrada pelo governo norte-americano, em 1961. Após fixar residência na Flórida, foi lavador de pratos, entregador de leite e vendedor de sapatos. Mesmo depois de ter assumido o controle de uma pequena empresa que construía e oferecia infraestrutura para redes telefônicas, a Church and Tower, não deixou de lado o ativismo. Recebeu treinamento militar do governo dos Estados Unidos e participou de cursos de inteligência e propaganda política.

Em 1981, criou, sob o incentivo do então presidente Ronald Reagan, a Fundação Nacional Cubano-Americana, para fazer oposição a Fidel a partir da Flórida, reunindo dissidentes do regime.

O filho Jorge entrou na empresa do pai nos anos 1970. Ele foi o cabeça para posterior fusão com outra marca do mercado, a Barnup y Sims. Foi quando nasceu a MasTec. Em pouco tempo, a nova companhia já faturava US$ 40 milhões por ano.

O primogênito assumiu o papel político após a aposentadoria e morte do pai. Presidiu a mesma fundação e apoia o embargo comercial norte-americano a Cuba.

Ser dono de uma franquia da MLS pareceu aos irmãos uma boa oportunidade comercial. José é fã do esporte, mas não se sabe de envolvimento anterior de Jorge.

Os irmãos e David Beckham perceberam que havia chance de contratar Messi entre julho e agosto do ano passado. O jogador, a mulher Antonella e os três filhos do casal passaram as férias em Miami e se apaixonaram pela cidade. Lionel disse a amigos que gostaria muito de nela morar. Jogar na MLS no final da carreira já era um desejo que ele havia manifestado no passado, mas não se imaginava ser algo sério.

"Depois de vencer a Copa do Mundo e não poder voltar ao Barcelona, foi a minha vez de ir para a liga dos Estados Unidos e viver o futebol de outra forma", disse, em entrevista aos jornais catalães Mundo Deportivo e Sport.

Viver o futebol "de outra maneira" significa afastar-se das pressões das principais ligas europeias e da obrigação de conquistar títulos. Ele chegou a ser vaiado pela torcida do PSG.

"Estamos felizes que Lionel Messi tenha a intenção de se juntar ao Inter Miami e à Major League Soccer", afirmou texto de divulgação da liga. "Embora ainda exista trabalho a ser feito para finalizar o acordo, temos a expectativa de dar as boas-vindas na nossa liga a um dos maiores jogadores da história."