Bolsonaro recusou reunião com chanceler do Reino Unido em Londres

Por RICARDO DELLA COLETTA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PL) recusou uma reunião de trabalho com o ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, James Cleverly, oferecida pelos britânicos por ocasião da participação do brasileiro no funeral da rainha Elizabeth 2ª.

A gestão de Liz Truss acenou com a possibilidade de um encontro bilateral da delegação brasileira com Cleverly, para tratar das relações diplomáticas entre os dois países, com a justificativa de que a própria primeira-ministra -que assumiu o governo há duas semanas- não teria condições de realizar agendas de trabalho com as dezenas de mandatários que viajaram ao Reino Unido.

Os britânicos ressaltaram, porém, que gostariam que os chefes de governo e seus representantes realizassem reuniões com membros do alto escalão.

Truss teve apenas cinco encontros bilaterais presenciais, além de uma ligação telefônica, por ocasião do funeral. Entre sábado (17) e domingo (18), se reuniu com os primeiros-ministros da Austrália (Anthony Albanese), da Nova Zelândia (Jacinda Ardern), da Irlanda (Micheál Martin) e do Canadá (Justin Trudeau) e recebeu o presidente da Polônia, Andrzej Duda. Também falou por telefone com o xeque dos Emirados Árabes Unidos Mohammed bin Zayed al Nahyan.

Procurado, o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Carlos França, disse à Folha que a oferta de reunião bilateral com Cleverly foi protocolar e feita a "todos os dignitários estrangeiros convidados para o funeral" da rainha.

"No entanto, a viagem do presidente Bolsonaro e da primeira-dama Michelle a Londres teve agenda muito apertada: ficamos apenas 32 horas em solo britânico. Ademais, os deslocamentos internos foram longos, havia muitas barreiras de controle por toda a cidade. Não houve tempo, pois, para bilaterais", disse França.

Bolsonaro compareceu a uma recepção oferecida por Cleverly a presidentes estrangeiros na chancelaria britânica, na tarde desta segunda. Só mandatários e cônjuges foram convidados.

França também declarou que, embora não tenha participado da recepção, pretende saudar seu homólogo pessoalmente durante a Assembleia-Geral da ONU (Organização das Nações Unidas), cujos debates começam nesta terça (20) em Nova York -o presidente brasileiro discursa na abertura do evento e viajou aos EUA logo depois de deixar Londres.

Apesar do pouco tempo no Reino Unido e de o objetivo da viagem ser o funeral de Elizabeth 2ª, Bolsonaro usou a passagem pelo Reino Unido para fazer campanha política, em discurso a apoiadores na sacada da residência oficial do embaixador do Brasil em Londres. "Nosso Brasil será dessas cores aqui: verde e amarelo", declarou.

O grupo em frente ao local rezou, cantou o hino brasileiro e depois gritou frases como "Lula, ladrão, seu lugar é na prisão", em referência a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), principal adversário de Bolsonaro nas eleições presidenciais e primeiro colocado nas intenções de voto.

Em outra conversa com apoiadores, ele manteve o tom eleitoral e atacou Lula. "Vocês têm alguma dúvida de que o Brasil é a terra prometida? Por que insistir em colocar um ladrão de volta na Presidência?"

O presidente também foi a um posto de gasolina para comparar os preços locais com os brasileiros e defender sua política para os combustíveis.

A passagem de Bolsonaro por Londres gerou ainda cenas de bate-boca em frente à residência do embaixador. Apoiadores do presidente confrontaram um cidadão inglês que defendia o direito à livre manifestação, após um homem se opor ao grupo e gritar "mito é Jesus".

Ele foi cercado e ouviu gritos como "petista ladrão" e "vai para a Venezuela", até que o aposentado inglês Chris Harvey saiu em sua defesa. Ele disse que, uma vez no Reino Unido, o homem hostilizado tinha todo o direito de protestar sem se sentir ameaçado. "As pessoas precisam ter respeito; o funeral da rainha acaba de acontecer."

No domingo, dois jornalistas brasileiros que trabalham na rede britânica BBC foram hostilizados, também nos arredores da residência do embaixador, quando trabalhavam.