Fila online em consulado italiano para passaporte gera crítica de brasileiros

Por PATRICIA PAMPLONA

FLORIANÓPOLIS, SC (FOLHAPRESS) - Brasileiros com cidadania italiana têm enfrentado dificuldades para obter seu passaporte em alguns consulados no país que adotaram o sistema de agendamento por videochamada no WhatsApp, situação que se agravou após a pandemia de Covid-19, com a demanda represada.

Os relatos falam em centenas de ligações feitas por dia, sem serem atendidos -ou está constantemente ocupado ou chama até cair. Dona de um pet shop em Curitiba, Michelle Ghilardi, 28, precisou renovar seu passaporte, que expirou no ano passado. A capital paranaense passou a adotar o sistema em fevereiro deste ano e tentou agendar a emissão do documento por meses sem sucesso.

"Eu ligava das 9h em ponto até meio-dia, tinha dia que chegava a mais de 200 ligações, durante meses", relata a empresária. "Eles também não respondem emails, já mandei diversas mensagens também nas redes sociais e nunca fui respondida."

Antes do sistema por WhatsApp, Curitiba adotou o Prenot@mi, no qual a solicitação era feita pelo site, mas também houve relatos de dificuldades que impediam a finalização do agendamento.

O curitibano Jean Pellanda, 30, relata que o site nunca funcionava. "Quando falaram que iria mudar, achei que ia melhorar o sistema. No fim, é um número para atender milhares de pessoas."

O atendimento na capital paranaense ocorre de segunda a quinta, das 9h às 12h, segundo o site do consulado, e o horário é outro motivo de insatisfação para Pellanda, que relata já ter ligado cerca de 300 vezes em um dia. "[É] como se ninguém precisasse trabalhar, então ficou praticamente impossível. Tentei nas três primeiras semanas e desisti, porque você liga 300 vezes no dia e não é atendido. Esperei dois meses e tentei de volta. Não consegui."

À Folha, em nota, o cônsul-geral de Curitiba, Salvatore Di Venezia, justificou a opção pela forma de agendamento como um sistema que "fornece melhores condições de defesas contra ciberataques de agências especializadas, que no passado conseguiam ocupar todas as vagas disponíveis e vender os agendamentos a terceiros".

A questão da interferência de terceiros também foi citada pela representação de São Paulo, pioneira nessa forma de atendimento, adotada em novembro de 2018, e igualmente alvo de reclamações, mesmo antes da pandemia.

O consulado na capital paulista afirmou que "o serviço ajuda de maneira determinante a excluir qualquer ingerência externa por intermediários não autorizados ou ilegais (despachantes, cibercrimes) que visam distorcer o andamento do processo dos agendamentos, tornando o serviço menos fluido e transparente".

Com base nos mesmos argumentos, desde que a capital paulista adotou o sistema, outros consulados seguiram a mesma linha, como os de Belo Horizonte e Rio de Janeiro, além de Curitiba. Nas outras capitais brasileiras, as representações também têm sido alvo de reclamações em seus perfis nas redes sociais.

Moradora de Pinheiros (ES), a estudante Beatriz Degani, 23, também chegou a ligar centenas de vezes para o número do consulado na capital fluminense, responsável por atender aos capixabas. "Na terceira ou quarta semana que eu estava ligando assisti a um vídeo em que deram a dica de que só respondiam às segundas, quartas e sextas", relata a jovem. O site da representação afirma que o atendimento ocorre em todos os dias úteis.

"Então, na sexta, eu liguei umas 40, 50 vezes e me atenderam. Foram muito solícitos e consegui marcar o agendamento." Em meio às reclamações, há também elogios nas redes sociais. Uma usuária disse na página do consulado de São Paulo ter sido muito bem atendida após três dias seguidos ligando.

Tanto o escritório do Rio como o de Belo Horizonte falaram à Folha, por email, sobre a atuação de despachantes para a reserva de vagas no sistema antigo. O valor cobrado poderia chegar a R$ 1.000, segundo o consulado da capital fluminense.

As quatro representações diplomáticas também citaram seus esforços para atender à alta demanda. Em Curitiba, Di Venezia afirmou que a verificação feita durante a chamada agiliza o atendimento no guichê, o que permite "aumentar o número de passaportes emitidos em cada dia".

Além disso, salientou que "a demanda é muito maior do que a possibilidade operacional do consulado-geral, que administra 130 mil italianos com cidadania reconhecida".

Na capital mineira, a representação disse ter duplicado o número de funcionários no setor de passaportes para atender os 42 mil italianos que são de sua responsabilidade --em 2020, eram 36 mil. O órgão do Rio, por sua vez, explicou operar com capacidade de atender até 50 videochamadas por dia e reconhece que o número de ligações é superior.

Já São Paulo, que no início operava das 8h30 às 13h30, de segunda a sexta, e hoje atende das 8h às 18h, afirmou que os operadores são instruídos a agendar o número máximo permitido por dia e, mesmo em caso de chamadas perdidas, devem retornar a ligação.