Estou sendo vítima de uma máfia, afirma Cristina Kirchner após condenação

Por SYLVIA COLOMBO

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - A vice-presidente da Argentina, Cristina Kirchner, condenada nesta terça-feira (6) a seis anos de prisão por corrupção e fraude ao Estado, voltou a acusar o Judiciário de perseguição. A política discursou por mais de uma hora em uma transmissão ao vivo nas redes sociais feita de seu gabinete no Senado.

"Essa condenação é fruto de 'lawfare', de uma ação do Partido Judicial, da máfia do Estado paralelo", afirmou a vice-presidente depois de ser informada sobre a sentença determinada pelo tribunal de Comodoro Py. A fala repete argumentos da política nas semanas que antecederam ao julgamento, apresentados inclusive em uma entrevista à Folha de S.Paulo.

Cristina fez menção também a um pronunciamento do presidente Alberto Fernández, na segunda-feira (6), no qual ele anunciou a abertura de uma investigação sobre uma suposta viagem ao sul do país que teria sido feita secretamente por um grupo de empresários de mídia, promotores e juízes.

Ela nomeou vários deles e afirmou que faziam parte da mesma "máfia" que a condenou --entre eles estaria Julián Ercolini, juiz que conduziu seu processo. Em parte de uma troca de mensagens que mostrou, sem esclarecer a origem do material, o magistrado aparece supostamente aconselhando o grupo a como agir para que a viagem não fosse investigada.

Cristina também fez duras críticas ao jornalismo argentino, afirmando que os jornais La Nación e Clarín, dois dos principais veículos do país, combinaram o modo como reportagens sobre ela seriam publicadas. Nomeando repórteres, disse que eles "não informam, não fazem jornalismo, fazem política".

Com reproduções de conversas que mostrou para a tela, a vice-presidente ainda fez acusações diretas aos diretores de ambos os jornais.

Em um dos chats, pessoas que supostamente estavam na viagem --membros da cúpula dos veículos, empresários e funcionários da administração de Buenos Aires, da oposição-- mencionam acordos sobre o que diriam, como se livrariam de processos em curso contra eles e conhecidos e debatiam estratégias para formar uma maioria simpática a eles no Congresso.

Cristina chorou, afirmou que "nunca será uma mascote do poder" e que num sistema que permite a existência do que chama de "Partido Judicial e um Estado paralelo", ela não seria mais candidata --que preferia ir presa.

A condenação desta sexta, de todo modo, não deve resultar em sua detenção tão cedo. Primeiro porque ainda cabe recurso; depois, porque ela tem imunidade pelos cargos de vice-presidente e líder do Senado. O foro especial só é passível de ser derrubado mediante um processo de impeachment no Parlamento. Ainda assim, isso se daria apenas quando fossem esgotadas todas as instâncias de apelação, sendo a Corte Suprema a última delas.

A política afirmou ainda que o objetivo dos que a condenaram não é colocá-la na cadeia. "A verdadeira condenação que eles querem é que eu não concorra mais a eleições ou que eu morra com um tiro na cabeça", afirmou. "A estes, digo que prefiro ir presa."

A afirmação faz referência ao atentado de que foi alvo no início de setembro, cujos suspeitos de participação ela alega ter vínculos com a oposição liderada pelo ex-presidente Mauricio Macri. Sobre as eleições de 2023, a expectativa é de que Cristina seja candidata a algum cargo --caso seja eleita, ela renovaria sua imunidade.

Por enquanto, sua força política, a aliança peronista Frente de Todos, não definiu quem concorrerá à sucessão de Alberto Fernández, mas a atual vice é uma das cotadas, ao lado do próprio presidente, do ministro do Interior, Wado de Pedro, e do governador da província de Buenos Aires, Axel Kiciloff. As primárias para essa votação devem ocorrer em agosto de 2023.

Nesta terça, do lado de fora do tribunal de Comodoro Py e do Senado, onde se concentravam apoiadores da política, o grito era de "Cristina presidente".