Egito planejou vender armas para Rússia em segredo, diz jornal

Por Folhapress

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Washington Post revelou nesta terça-feira (11) a existência de um documento que supostamente evidencia planos do Egito de fornecer foguetes e munição para a Rússia no contexto da invasão da Ucrânia.

Analistas e políticos ouvidos pelo jornal americano afirmam que a informação pode pôr em risco a relação dos Estados Unidos com o país do Oriente Médio ?um grande aliado deles na região, em parte devido a seu tradicional papel de mediação no conflito entre Israel e Palestina.

O arquivo em questão é datado de 17 de fevereiro e integra a leva de documentos do Pentágono vazados entre fevereiro e março deste ano em fóruns online. Ele resume supostos diálogos em que o líder egípcio, Abdel Fattah al-Sisi, orienta uma autoridade militar a manter a produção e a remessa de mísseis para Moscou em segredo "para evitar problemas com o Ocidente".

Questionado pelo Washington Post sobre a veracidade da conversa que o documento descreve, Ahmed Abu Zeid, porta-voz do Ministério de Relações Exteriores egípcio, afirmou que a nação busca desde o princípio não se envolver na Guerra da Ucrânia ao mesmo tempo em que reitera continuamente seu comprometimento com as diretrizes da legislação internacional.

Já um membro do governo americano que não se identificou afirmou que o plano de exportação de foguetes para a Rússia descrito no relatório não foi executado, até onde se sabe. Contatada, a porta-voz do Pentágono, Sabrina Singh, reforçou que o Departamento de Justiça americano abriu uma investigação para determinar a origem do vazamento dos arquivos. As autoridades comprovaram que os relatórios são fidedignos, mas indicaram que eles podem ter sido adulterados de modo a inflacionar o poderio militar russo.

O documento revelado pelo jornal americano supostamente registra uma conversa de Al-Sisi com uma pessoa identificada como Salah al-Din, segundo o jornal provavelmente Mohamed Salah al-Din, ministro do Estado de Produção Militar. Algumas das instruções dadas a ele por Al-Sisi incluiriam afirmar aos operários fabris responsáveis pela produção de projéteis que os itens seriam destinados ao Exército egípcio, e determinar que a pólvora oferecida a Rússia viria de uma planta de manufatura química chamada Fábrica 18.

O relatório ainda afirma que Al-Sisi disse que estava pensando em vender "artigos comuns" para a China para aumentar a produção de Sakr 45, um tipo de míssil egípcio. Embora ele não afirme que os itens teriam Moscou como destino, o modelo é compatível com lançadores russos.

Por fim, Salah al-Din teria contado que os russos disseram a ele que estavam dispostos a comprar "qualquer coisa", e garantido que os operários sob sua supervisão fariam vários turnos se necessário para o Egito conseguir "pagar a Rússia de volta por uma ajuda anterior não especificada". O documento não esclarece que ajuda é essa.

Segundo analistas ouvidos pelo Washington Post, fornecer armas à Rússia no âmbito da Guerra na Ucrânia representaria um estratagema arriscado para o Egito. Apesar de se aproximar cada vez mais de Moscou ?cuja empresa estatal Rosatom atualmente constrói a primeira usina nuclear da nação árabe?, ele ainda é um grande parceiro dos EUA. Segundo o Departamento de Estado americano, Washington já repassou a Cairo US$ 80 bilhões (em valores não corrigidos pela inflação) em assistência militar e econômica desde 1978.

Assim como o Brasil, o Egito e outros aliados dos EUA no Oriente Médio têm tentado não tomar partidos na crise da Ucrânia. O conflito teve, no entanto, grandes consequências econômicas para o regime liderado por Al-Sisi, maior importador de trigo do mundo.

Um acordo com a Rússia, terceiro maior produtor global do grão de acordo com a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura), permitiu que sua administração evitasse a escassez de trigo no território ?o que, por sua vez, pode ter ajudado a prevenir a eclosão de manifestações populares, uma vez que quase todas as refeições incluem pão na cultura egípcia .

Ainda segundo o Washington Post, o fornecimento de armas para a Rússia ainda pode levar os EUA a impor sanções sobre o Egito. Empresas comandadas por militares prosperaram durante a gestão de Al-Sisi, com a abertura de diversas novas fábricas de armamentos, munição e mísseis pelo país.