Facção que reivindicou assassinato de candidato integra 'nova geração' de gangues no Equador

Por JÚLIA BARBON

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - Uma complexa rede de poder, golpes e massacres, somada à falta de controle governamental, explica a ascensão da facção criminosa Los Lobos no Equador. Encapuzados, seus supostos membros gravaram um vídeo dizendo ter assassinado o candidato presidencial Fernando Villavicencio a tiros num evento de campanha nesta quarta-feira (9), insinuando que ele não cumpriu um acordo.

O grupo integra a autodenominada "nova geração" de gangues no país sul-americano e possui cerca de 8.000 integrantes espalhados por diversas prisões e cidades, segundo o observatório InSight Crime. Eles são aliados a outros dois grupos, chamados Tiguerones e Chone Killers, e suspeita-se que tenham relações com organizações criminosas mexicanas.

Os Lobos cresceram à medida que o cartel que dominou a região nas últimas duas décadas, os Choneros, sofreu uma derrocada. A prisão ou morte dos seus principais líderes até meados de 2020 impulsionou uma guerra que dura até hoje e fez os homicídios equatorianos saltarem de 14 para 25 por 100 mil habitantes de 2021 a 2022.

Há uma semana, Villavicencio afirmou ter recebido ameaças dos Choneros. "Há três dias, um militante de Manabí [província que o grupo ainda domina] recebeu visitas de vários mensageiros de Alias Fito [líder do cartel] para dizer a ele que, se eu continuasse mencionando os Los Choneros, eles me quebrariam", declarou o candidato no programa Vis a Vis, acrescentando que não suspenderia a campanha.

Esse grupo surgiu nos anos 2000 no porto de Manta, maior cidade dessa província, que recebia regularmente cocaína da Colômbia. Se expandiu na década de 2010 através dos presídios, a partir de uma política de transferências em massa de líderes e detentos perigosos. A intenção era desmantelar as gangues, mas isso só fez com que eles disseminassem seu poder e entrassem em conflito com outras facções prisionais, como os Cubanos e Lagartos.

A violência nessas unidades começou a aumentar, com 49 assassinatos em prisões do país em 2019. De lá para cá, a situação só piorou: foram mais de 419 detentos mortos só em 2021 e 2022, segundo o InSight Crime, muitas vezes em massacres sangrentos com machados, armas automáticas e granadas.

Antes vivendo em um país considerado pacífico, a população passou a se acostumar a ver no noticiário cenas como cadáveres pendurados em pontes, sicários abrindo fogo em restaurantes, sequestros-relâmpago e até um prefeito "reeleito" enquanto era velado, o que impulsionou fortes discursos anticriminalidade na campanha presidencial.

Além do fato de o país estar localizado entre o Peru e a Colômbia, grandes produtores de cocaína do mundo, especialistas apontam outros motivos para a explosão da violência. Entre eles estão uma economia que funciona em dólares, e portanto favorece a lavagem de dinheiro; a retirada de forças de segurança americanas do país pelo ex-presidente Rafael Correa; e políticas de abertura migratória que impulsionaram o tráfico de pessoas e a chegada de criminosos internacionais.

"Com isso temos um coquetel muito complicado, a somar uma falta de capacidade contínua das forças políticas em criar consensos, porque estão mais concentrados em brigar do que em construir uma agenda de Estado", afirma o analista político e consultor Michel Rowland. "Temo que Equador esteja se convertendo num novo México, onde cartéis têm mais poder que o Estado."