EUA anunciam nova bomba atômica para destruir bunkers

Por IGOR GIELOW

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O governo dos Estados Unidos anunciou que irá desenvolver uma nova bomba atômica, específica para emprego contra bunkers e centros de comando subterrâneos que proliferam entre seus rivais na China, Rússia, Irã e Coreia do Norte.

Para tanto, ela terá capacidade destrutiva superior à do principal modelo tático de queda livre em uso pelo país, maior potência nuclear ao lado da Rússia de Vladimir Putin. Juntos, eles abrigam quase 90% das armas deste tipo no mundo.

Segundo anúncio feito na sexta (27) pelo Departamento de Defesa, a nova arma ainda precisa de autorização do Congresso para seu desenvolvimento. Não há custo estimado ainda, mas o seu objetivo é claro.

"A B61-13 será empregável por aviões modernos, aumentando a dissuasão de adversários e a confiança de aliados ao dar ao presidente opções adicionais contra certos alvos militares maiores e mais reforçados", afirma o comunicado. "Ela irá substituir algumas das B61-7 no arsenal atual e deverá ter uma potência similar à da B61-7, que é maior do que a da B61-12", completa o texto.

A sopa de letrinhas explica a a equação. Na designação americana, B indica bomba de gravidade, que é lançada por aviões e cai, com ou sem algum auxílio direcional, rumo ao alvo. Já o 61 é o modelo, no caso o ano de seu desenvolvimento (1961), enquanto o 13 indica a versão.

O arsenal americano deste tipo de arma hoje tem cinco modelos ativos. O mais moderno é o B61-12, que começou a ser produzido há dois anos e custa quase R$ 150 milhões a unidade. Como armas táticas, que visam a destruição de alvos militares com menor potência, em oposição às estratégicas que tentam encerrar as guerras acabando com cidades inteiras, elas não são cobertas por nenhum acordo de controle e seu número total é desconhecido.

A renomada FAS (Federação dos Cientistas Americanos, na sigla inglesa) estima que talvez 1.800 das 5.244 ogivas dos EUA (entre ativas, estocadas e aposentadas) sejam do tipo tático, 100 delas em bases de seis aliados de Washington na aliança militar Otan na Europa.

A Rússia, diz a entidade, tem um arsenal tático de 2.000 bombas perto de suas fronteiras europeias. Herança da Guerra Fria, Moscou tem à disposição ao todo 5.889 armas atômicas. No começo do ano, Putin deixou o último tratado de controle das ogivas estratégicas, o Novo Start, mas prometeu manter os limites nominais atuais, em torno de 1.550 unidades prontas para uso imediato.

Sacando a retórica atômica para tentar dissuadir o Ocidente de apoiar a Ucrânia na guerra que iniciou no ano passado, o russo também fez com que o Parlamento do país derrubasse o banimento total de novos testes nucleares --os EUA nunca ratificaram o tratado sobre o tema.

Por fim, é recorrente a especulação de que o Kremlin poderia usar uma arma tática em caso de derrota iminente na Ucrânia. Neste ano, Putin posicionou ogivas do tipo na vizinha Belarus.

A B61-7 citada tem uma potência regulável estimada por analistas de 10 a 340 quilotons, algo como um pouco menos do que a bomba de Hiroshima a 23 delas. Já a B61-12 foi desenhada para ter de meros 0,3 quilotons (50 vezes menos do que a primeira arma usada em guerra) a 50 quilotons (algo mais que três Hiroshimas).

A menor potência, de forma contraintuitiva, tornou a B61-12 uma arma perigosa politicamente por estar em linha com a Revisão da Postura Nuclear de 2018 dos EUA, que enfatizou o emprego de bombas menores e foi lida como uma admissão tácita de seu uso em guerra.

Quando os EUA armaram submarinos de ataque com uma versão de baixa potência da W76, em 2020, a Rússia reagiu afirmando que consideraria qualquer lançamento de míssil dessas embarcações americanas um ataque nuclear em potencial --o que, pela doutrina do país, significa uma retaliação maciça.

Com efeito, especula-se que a nova bomba poderá enfim aposentar a B83, arma de gravidade de grande potência (80 Hiroshimas), considerada uma relíquia da Guerra Fria por só poder sem empregada por bombardeiros --enquanto armas táticas também são carregadas por caças como o moderno F-35 ou o antigo Panavia Tornado.

O foco da nova bomba são as estruturas reforçadas. Putin, por exemplo, inaugurou seu novo centro de comando nuclear subterrâneo em Moscou em 2018, ano em que apresentou novas armas. Análise de imagens de satélite mostra que a China está coalhando regiões do país com silos reforçados para mísseis.

Não só potências nucleares, como a menor e agressiva Coreia do Norte, estão na mira. O Irã, que está a um passo, tecnicamente, de poder construir sua bomba, tem diversos centros de desenvolvimento militares sob a terra.

Mas são os chineses e seus aliados russos os principais destinatários das ações americanas. Na semana passada, o Congresso dos EUA divulgou relatório estimando em 500 as bombas de Pequim, a terceira maior potência do planeta. A FAS fala em 320. O Pentágono, por sua vez, crê que no ritmo atual os chineses terão uma força nuclear equivalente à de Moscou e Washington em 2035.

Isso preocupa especialistas insuspeitos de serem simpatizantes de Putin ou Xi Jinping. Escrevendo no Boletim dos Cientistas Atômicos, publicação americana que é referência no tema, Andrew Facini (Conselho de Riscos Estratégicos, EUA) afirmou que os EUA arriscam com o que chamou de "obsessão com a capacidade chinesa".

"Buscando aumento de capacidade sozinhos, os EUA podem acabar no lado errado do paradoxo da estabilidade-instabilidade, arriscando escalada para uma guerra nuclear, intencional ou não", disse. Para ele, o caminho é a redução de tensões, e não a criação de uma frota de submarinos de propulsão nuclear para a Austrália, como previsto no acordo militar tripartite Aukus com o Reino Unido e a nação da Oceania.

Nesta segunda (30), o ministro da Defesa russo, Serguei Choigu, afirmou em um fórum militar na China que o Aukus e a aliança Quad (EUA, Japão, Índia e Austrália) buscam espalhar guerras pela Ásia-Pacífico, assim como as movimentações contra a Coreia do Norte. "Tendo provocado uma crise aguda na Europa, o Ocidente está buscando espalhar conflito potencial na região", afirmou, recorrendo à narrativa russa de que a Guerra da Ucrânia foi defensiva.