Morre Juanita Castro, irmã de Fidel e Raúl que colaborou com a CIA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Juanita Castro, irmã mais nova dos ex-líderes cubanos Fidel e Raúl, aos quais se opôs por décadas, morreu nesta segunda-feira (4), aos 90 anos, em Miami, onde vivia desde a década de 1960. A informação é de uma jornalista próxima à família.
"Esta é uma notícia que nunca quis dar, mas que, como sua porta-voz nas últimas três décadas de sua vida, tenho de comunicar", escreveu a jornalista mexicana Maria Antonieta Collins, que ajudou a escrever as memórias da cubana. "Hoje nos deixou Juanita Castro, uma mulher excepcional, lutadora incansável pela causa de sua Cuba que tanto amava."
Juanita deixou a ilha caribenha em 1964, cinco anos depois do triunfo da Revolução Cubana, ao divergir dos rumos do levante e romper com seus irmãos, Fidel, que morreu em Havana em 2016, e Raúl, que deixou o comando do Partido Comunista de Cuba em 2021.
Após sair da ilha, ela se exilou em Miami, onde abriu uma farmácia. Juanita criticava publicamente a atuação de seus irmãos e colaborou até mesmo com a CIA (Central de Inteligência dos Estados Unidos) sob o pseudônimo "Donna", conforme ela mesma confessou em 2009 em suas memórias, intituladas "Fidel e Raúl, meus irmãos - A história secreta".
No livro, Juanita diz que, no início, apoiou a revolução, mas depois se desiludiu com as atitudes tomadas pelo irmão no poder. "Tive remorsos por trair Fidel ao aceitar reunir-me com o inimigo? Não, por uma simples razão: eu não o traí. Ele me traiu. Ele traiu os milhares que sofremos e lutamos pela revolução que nos oferecia, a que era generosa e justa e traria paz e democracia para Cuba e que, como ele prometeu, seria tão cubana quanto as palmeiras", escreveu ela.
Juanita foi apresentada a um agente da CIA em 1961, logo após a invasão da Baía dos Porcos --tentativa frustrada de invadir o sul de Cuba por forças de exilados cubanos com o apoio dos EUA. A ponte entre ela e o americano foi Virgínia Leitão da Cunha, mulher do embaixador do Brasil em Cuba na época, Vasco Leitão da Cunha.
À época, Juanita havia alugado uma casa na qual hospedava pessoas interessadas em sair do país, providenciava seus passaportes e evitava que os pertences dos viajantes fossem confiscados. As duas combinaram um encontro no México com um representante da CIA, que se apresentou como Enrique --seu nome verdadeiro era Tony Sforza. Sob o pseudônimo de Frank Stevens, ele já tinha vivido infiltrado em Cuba, onde se passava por um jogador de cassinos.
Ela relata que a única condição imposta para ajudar era não se envolver em atividades violentas contra seus irmãos ou funcionários do regime. Como resposta, ouviu que suas missões envolviam só proteger e mover os agentes em segurança. Na época, a CIA tinha planos de matar Fidel.
A partir do encontro, Juanita começou a enviar informações para a agência por meio de um rádio de ondas curtas. Com o codinome de Donna, levava mensagens, documentos e repassava informações. No livro, a cubana relata que, no meio de uma missão, seu carro quebrou na estrada e ela foi ajudada pelo próprio Fidel, que passava pelo caminho em uma comitiva.
Entre as informações que a irmã de Fidel disse ter passado aos EUA está a da instalação de mísseis soviéticos na ilha --em 1962, a crise dos mísseis em Cuba explodiu e virou um dos momentos de maior tensão da Guerra Fria.
Virgínia e Juanita haviam se conhecido em 1958, quando a cubana se refugiou por três meses na Embaixada do Brasil em Havana, durante o regime do ditador Fulgencio Batista (1933-1959). Na época, ela colaborava com o posteriormente vitorioso Movimento Revolucionário 26 de Julho.
Seu duplo papel de irmã dos líderes de Cuba e membro do exílio na Flórida foi algo difícil de lidar, como ela contou no livro.
"Sem dúvida, sofri mais do que o resto do exílio porque em nenhum lugar do estreito da Flórida me dão trégua, e poucos são os que compreendem o paradoxo da minha vida", escreveu. "Para os de Cuba, sou uma desertora porque saí e denunciei o regime estabelecido. Para muitos em Miami, sou uma pessoa 'non grata' por ser a irmã de Fidel e Raúl."
De acordo com a emissora americana Univisión, Juanita Castro morreu de causas naturais em um hospital de Miami. "Sua irmã, Enma, e sua família estendida pedem privacidade neste momento tão doloroso. Não haverá entrevistas e, de acordo com sua vontade, seu funeral será privado", escreveu Collins em sua publicação no Instagram.