Chanceler de Portugal diz que ocorrência de xenofobia é ínfima

Além de "ínfimos", ele diz que são "estatisticamente insignificantes" se comparados às relações diárias que os residentes no país têm com os portugueses.

Por REGIANE SOARES

População brasileira em Portugal

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ministro de Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, disse na sexta (15) que os casos de xenofobia contra brasileiros no país europeu são "ínfimos" e "estatisticamente insignificantes" se comparados às relações diárias que os residentes no país têm com os portugueses. Cravinho disse repudiar a prática e reiterou que brasileiros são muito bem-vindos.

"Os casos [de xenofobia] podem ser traumáticos para os indivíduos em causas, mas são estatisticamente insignificantes", disse o chanceler à Folha, ao ressaltar que todos os dias há "milhões e milhões" de interações entre os brasileiros residentes e os portugueses.

Em 2022, os brasileiros representavam 30,7% dos imigrantes em Portugal, segundo dados divulgados em junho passado. A quantidade de brasileiros também cresceu pelo sétimo ano seguido, totalizando 239.744 residentes legais. Isso representa um crescimento de 17,1% em comparação a 2021.

Na avaliação de Cravinho, "com certeza" existirão casos de racismo e de xenofobia, pois Portugal é uma "sociedade complexa" com 10 milhões de habitantes. Porém, afirmou que existem leis no país contra a prática.

Um dos casos mais recentes de xenofobia no país foi contra a estudante carioca Grazielle Tavares, 49, agredida com socos por um colega na Universidade do Minho, em Braga, no norte de Portugal, em 28 de novembro. Outro ataque ocorreu no aeroporto do Porto, em 7 de novembro, quando uma portuguesa chamou uma brasileira de "porca".

"Os casos são absolutamente lamentáveis. Podem ser centenas, milhares, mas estatisticamente são uma minoria ínfima", argumenta Cravinho. "Sem menosprezar e sem minorar aquilo que é a realidade que pode ser sofrida por umas pessoas, devemos também olhar para o contexto. E o contexto é um no qual brasileiros são muito bem-vindos, dão uma grande contribuição para a sociedade portuguesa e nós gostamos muito de tê-los lá."

Cravinho esteve em Brasília e em São Paulo para participar da primeira reunião preparatória do G20, que em 2024 será presidido pelo Brasil. A 19ª Cúpula de chefes de Estado será realizada em novembro do ano que vem, no Rio de Janeiro.

Portugal é um dos oito países convidados pelo governo brasileiro para as discussões. Completam a lista Angola, Egito, Emirados Árabes Unidos, Nigéria, Noruega e Singapura, além da Espanha, que é convidada permanente.

A viagem do chanceler ao Brasil foi mantida apesar de o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, ter anunciado no dia 7 de novembro a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições legislativas antecipadas para 10 de março de 2024. O motivo foi a renúncia do primeiro-ministro, António Costa, devido a uma operação anticorrupção em que seu nome foi citado.

Questionado sobre a visita, Cravinho disse que o Brasil é uma parte importante da política externa portuguesa e que 2023 foi um ano "particularmente fértil" para as relações dos dois países. O presidente Lula esteve em Portugal em abril, quando foi assinada uma série de acordos. Na ocasião, a viagem foi considerada pelo Palácio do Planalto uma oportunidade de "relançar a relação bilateral", que esteve em baixa durante os anos do governo de Jair Bolsonaro.

Cravinho se mostrou otimista sobre a continuidade nas relações com o Brasil. Segundo ele, qualquer que seja o governo eleito em 10 de março, haverá continuidade nas negociações. Por isso, segundo ele, não faria sentido "abandonar uma iniciativa [a viagem] que estava prevista e que é algo que é perfeitamente consensual na política externa portuguesa".

Segundo ele, é notório que a relação entre os dois países melhorou com o governo Lula. A reunião de cúpula bilateral que era realizada anualmente, por exemplo, ficou sete anos sem acontecer. "Portanto, de algum modo, aquilo que tem sido dito um pouco por todo o mundo, que o Brasil regressou, é algo que nós em Portugal sentimos", afirmou.

Como parte da agenda no Brasil, Cravinho se reuniu na quinta (14) com o ministro Mauro Vieira (Relações Exteriores). Na pauta, estavam os acordos de cooperação bilaterais de comércio e de investimentos em energia renovável, o G20, os vistos da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e o acordo entre União Europeia e Mercosul.

O ministro disse que o convite para Portugal participar do G20 não foi apenas pela relação de amizade de Lula com Portugal, mas pela contribuição que o país pode dar às discussões, principalmente porque pode ser uma "ponte" entre a Europa, a América Latina e a África.

Segundo o chanceler, essa "ponte" pode ser fundamental para a formalização do acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que está em discussão há mais de 20 anos. "Nós acreditamos que existem todas as condições para assinarmos [o acordo] no primeiro trimestre de 2024. Claro que faltam limar algumas arestas técnicas, mas esse não é o problema", disse.

Cravinho ressaltou que ambos os blocos podem perder se o acordo não for firmado. "Se nós assinarmos, daqui a 10, 15, 20 anos, as nossas circunstâncias serão umas; se não assinarmos serão outras. Se assinarmos, teremos a capacidade de aproveitar sinergias entre a União Europeia e o Mercosul. Se não assinarmos, vamos estar na mão de terceiros."

Sobre a CPLP, o chanceler disse que a ideia é fazer da comunidade lusófona uma área de trânsito livre de cidadãos dos países que integram o grupo. Cravinho ressaltou que o visto vai continuar a ser emitido e beneficiar quem quiser ir para Portugal, apesar das críticas da União Europeia, que sustenta que o documento não dá direito à permanência em outros países do bloco.

"O que nós verificamos é que, aqueles que vêm para Portugal pelo acordo da CPLP, ficam em Portugal ou regressam aos seus países, mas não constituem qualquer tipo de problema para outros países. Não vão para a Alemanha, nem para a Hungria, nem para qualquer outro país. Não nos parece que haja qualquer tipo de problema", afirmou.