ONGs pedem investigação contra Putin e mais 9 por massacre em Mariupol
RIO DE JANEIRO, RJ, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O cerco imposto pela Rússia à cidade portuária de Mariupol, considerada estratégica no conflito na Ucrânia, deixou milhares de civis mortos e feridos e deve ser investigado como crime de guerra. A conclusão é das ONGs Human Rights Watch e Truth Hounds, que atuam com direitos humanos e divulgaram relatório nesta quinta-feira (8) apontando violações do direito internacional durante a ofensiva.
As organizações pedem investigação sobre "aparentes crimes de guerra" que podem ter sido cometidos pelo presidente russo, Vladimir Putin, pelo ministro da Defesa, Serguei Choigu, e por outras oito autoridades do país invasor. No documento, há a recomendação de que esses indivíduos, e potencialmente outros 17 comandantes de unidades militares, sejam processados por seus possíveis papéis em graves violações cometidas em Mariupol.
O relatório descreve a ofensiva russa contra a cidade portuária como uma "história de terror". O documento detalha 14 ataques que danificaram ou destruíram 18 edifícios, matando e ferindo civis. As ações atingiram dois hospitais, um armazém de alimentos, um local de distribuição de ajuda humanitária, um supermercado, além de edifícios residenciais e do teatro da cidade, usados como abrigo. Nesses episódios, as ONGs não encontraram evidências de presença militar ucraniana significativa perto das estruturas atingidas.
"A destruição de Mariupol se destaca como um dos piores capítulos da invasão russa em larga escala na Ucrânia", disse Ida Sawyer, diretora de crises e conflitos da Human Rights Watch. "Organismos internacionais e governos comprometidos com a justiça deveriam se concentrar em investigar as altas autoridades russas que parecem conectadas à supervisão de crimes de guerra nesta cidade."
A região de Mariupol é estratégica no plano do Kremlin que visa unir os territórios do Donbass, no leste ucraniano, à península da Crimeia, já anexada em 2014. Durante a ofensiva russa, autoridades locais denunciaram mortes de civis não só em bombardeios, mas também devido à falta de eletricidade, água e comida. Em abril de 2022, após dois meses de cerco, Putin anunciou que suas tropas haviam tomado o controle da cidade.
O documento divulgado pelas ONGs também diz que a Rússia obstruiu diversas tentativas de autoridades ucranianas e agências internacionais para entregar ajuda humanitária a Mariupol e organizar a retirada de civis.
Para elaborar o documento, as organizações fizeram 235 entrevistas com moradores deslocados de Mariupol. Também revisaram mais de 850 vídeos e fotos, além de dezenas de imagens de satélite.
A análise de fotos, vídeos e imagens de satélite dos principais cemitérios da cidade mostra que mais de 10 mil pessoas foram enterradas em Mariupol de março de 2022 a fevereiro de 2023. "Comparando o aumento de sepulturas com a taxa de mortalidade normal da cidade, os grupos estimam que pelo menos 8.000 pessoas morreram em decorrência do conflito ou por causas relacionadas à guerra, embora não haja informação de quantas dessas pessoas eram civis", diz o relatório.
Mas, de acordo com o texto, é possível que o número seja muito maior, já algumas sepulturas continham vários corpos, e restos de outras pessoas provavelmente foram enterrados sob os escombros. Além disso, algumas vítimas podem ter sido colocadas em sepulturas improvisadas e outras, morrido mais tarde por causas relacionadas à guerra.
"Apesar dos desafios em investigar crimes de guerra em áreas tornadas inacessíveis pela ocupação russa, nós e nossos parceiros passamos quase dois anos investigando a verdade sobre os horríveis crimes cometidos pelas forças russas em Mariupol", afirmou Roman Avramenko, diretor-executivo da Truth Hounds. "Esta investigação visa garantir que esses crimes nunca sejam esquecidos e que os perpetradores enfrentem a Justiça."
Segundo as ONGs, 93% dos 477 prédios na parte central de Mariupol foram danificados na guerra. Desde a ocupação da cidade, contudo, as autoridades russas estão construindo novos edifícios residenciais como parte de seu plano de reurbanizar Mariupol até 2035. Com isso, evidências de potenciais crimes podem estar sendo apagadas.
"As forças ocupantes também estão eliminando características da identidade ucraniana, incluindo a imposição de um currículo escolar russo e mudando o nome de ruas. Eles estão exigindo que os residentes obtenham passaportes russos para se candidatarem a certos empregos e benefícios", diz o documento.