Governo de Javier Milei quer coletar DNA de presos e deter líderes de protestos

Por JÚLIA BARBON

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - O governo de Javier Milei anunciou nesta quinta-feira (21) que pretende enviar ao Congresso um novo pacote de projetos de lei, desta vez contra o narcotráfico e a insegurança na Argentina. O anúncio ocorre em meio a uma crise de violência em Rosário, cidade do jogador Lionel Messi a cerca de 300 km de Buenos Aires.

As mudanças propostas, ainda em fase de rascunho, pretendem dar poder de polícia às Forças Armadas, permitir a coleta do DNA de presos e deter organizadores de manifestações que incentivem o bloqueio de ruas ou "forcem" alguém a protestar com ameaças ou pagamentos.

As medidas foram divulgadas pelos ministros Patricia Bullrich (Segurança) e Luis Petri (Defesa) em entrevista coletiva e acontecem após seguidas derrotas do presidente no Legislativo, onde ele ainda tenta negociar sua "lei ônibus" e seu megadecreto de desregulação da economia.

"A sociedade não tem plano B quando destroem sua propriedade e sua vida. Não pode haver um deputado ou senador que não entenda a realidade que estamos enfrentando; acreditamos que o Congresso vai nos apoiar", disse Bullrich, quando questionada sobre eventuais dificuldades no Parlamento.

As alterações seriam feitas por meio de cinco normas que incluem alteração do Código Penal ?quatro na área de Segurança e uma na Defesa. Esta última quer permitir que militares realizem operações de patrulhamento, apreensão em flagrante e controle de pessoas e veículos, o que hoje é feito pelas polícias.

Hoje, as Forças Armadas só podem realizar apoio logístico, como vêm fazendo em Rosário, onde uma onda de ataques a táxis, ônibus e delegacias deixou quatro mortos no início do mês e gerou pânico. A cidade vive há dez anos uma briga pelo tráfico de drogas, o que não é comum na Argentina, e ostenta uma taxa de 22 homicídios a cada 100 mil habitantes, contra 4,2 na média do país.

"[As Forças] não serão usadas para delitos comuns, mas em atos de terrorismo e com a anuência do governador em questão", disse Petri, que também prometeu "maiores recursos" para os "2.000 ou 3.000" militares que forem destinados ao combate direto contra o crime organizado no futuro.

Outra norma permitiria ampliar o registro de DNA de presos a autores de todos os delitos, e não apenas agressores sexuais, como é feito atualmente. Segundo a Casa Rosada, a mudança poderia ajudar a detectar criminosos que já tenham passado pelo sistema penitenciário antes e também evitar a prisão de inocentes.

Quanto ao protestos, a proposta é alterar um artigo do Código Penal que regula o impedimento à circulação. O governo quer aumentar as penas para organizadores que incitem bloqueios de ruas ou obriguem pessoas a participar, prometendo pagamento ou ameaçando com a retirada de benefícios sociais.

"Não vamos permitir que as pessoas sejam exploradas", defendeu a ministra, detalhando que as penas podem variar de quatro a seis anos de prisão. Ela também pretende criar um tipo penal para quem bloquear a entrada em comércios, indústrias e outros estabelecimentos, com agravantes se houver bloqueios em vários locais de forma coordenada.

ORGANIZAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS DENUNCIA ESTUPRO DE MILITANTE

Também nesta quinta, a organização de direitos humanos Hijos, formada principalmente por filhos e filhas de vítimas da ditadura militar argentina, publicou comunicado dizendo que uma das militantes do grupo foi agredida e estuprada por dois supostos apoiadores de Milei, que a esperavam dentro de casa armados.

O coletivo descreveu o episódio como crime político motivado pela sua militância em direitos humanos e feminismo e disse que os criminosos disseram "com clareza": "Não viemos te roubar, viemos te matar. Nos pagam para isso". O único item roubado, afirmam, foram pastas com informações da organização.

Os agressores, segundo o relato, pintaram na parede a sigla VLLC, uma referência à frase "viva la libertad carajo", frequentemente dita pelo presidente Javier Milei. "Esses fatos têm uma clara correlação com as ações e discursos de ódio que as mais altas autoridades do país expressam cotidianamente e incitam à violência contra aqueles que militam pelos direitos humanos", escreveram.

Mais tarde, o porta-voz da Casa Rosada, Manuel Adorni, afirmou: "Esperamos que a Justiça prossiga e que esclareça os fatos. Esperamos também que os responsáveis paguem por seus atos".