Com poder de compra cada vez menor e empregos cada vez menos est?veis, profissionais recorrem ao famoso "bico"
Fernanda Leonel
Rep?rter
19/04/06
As pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat?stica (IBGE) e de outros
?rg?os respos?veis por trabalhos de mapeamento e estat?stica confirma o que muitos
juizforanos conhecem bem: a instabilidade profissional, os baixos sal?rios e a dificuldade de se conseguir empregos faz com que cada vez mais pessoas procurem alternativas de renda e trabalhos informais. Nomes
diferentes para o que o
brasileiro adora chamar de bico. Os dados do IBGE mostram que esse movimento em busca de uma fonte de renda
que acrescente valores no or?amento familiar j? ultrapassa a marca de 1 milh?o e meio de pessoas em todo o pa?s. N?meros que tendem a crescer, j? que o poder de compra do brasileiro tamb?m tem ca?do.
Foi pensando na queda do poder de compra que o digitador William da Rocha
(foto) resolveu se aventurar em uma ?rea completamente diferente da sua. Agora, no per?odo da
noite, ele ? assistente de uma carrinho de cachorro-quente que funciona nas ruas do centro de Juiz
de Fora. William conta que ? solteiro, e que n?o ajuda nas despesas de casa, mas afirma que
dinheiro nunca ? demais. "A gente sempre tem gastos, n?? E o dinheiro do m?s acaba
r?pido. Se eu quiser juntar um extra, tem que ser fazendo bico", completa.
Cansativo. ? o segundo nome do bico para o digitador que
trabalha na ?rea de inform?tica h? aproximadamente dez anos. Mas mesmo ficando pouco tempo em casa com a
fam?lia e trabalhando por quase todo o dia, ele afirma que o esfor?o vale a pena.
E ainda levanta um outro lado para o fato de estar trabalhando em outro ramo
que n?o seja o seu emprego fixo:
"tamb?m vou aprendendo outras coisas, adquirindo mais conhecimentos. A
qualquer momento se me mandarem embora da firma, ou minha profiss?o
acabar, eu j? vou saber me virar com o que aprendi no bico". Ele conta que a id?ia de
vender brincos e bijouterias era para, no princ?pio, servir como fonte de renda para a mulher.
Mas que o hor?rio e a firmeza que se tem que ter com os milhares de passantes di?rios do local,
acabaram levando o compromisso a ele.
Marcos n?o dorme mais que quatro horas por noite para conseguir cumprir as
duas tarefas. Pega no trabalho de 6h ?s 16h, passa em casa para pegar as bijouterias e vai para o cal?ad?o. De
l?, ele s? sai ?s 22h ou 23h, para tentar ver as crian?as antes de dormir.
Os dois filhos, ali?s, s?o a principal justificativa de Marcos para a vida corrida.
Ele conta que as crian?as ainda s?o
pequenas e precisam de muita assist?ncia. Al?m do mais, sem idade
suficiente para ficarem em casa sozinhas, precisam que a m?e n?o trabalhe. "Menino pequeno ?
sin?nimo de despesa,
se n?o fosse o que ganho aqui eu n?o sei o que seria l? em casa n?o",
afirma.
Para Marcos, o dinheiro picado que entra com o bico ? o que ajuda nas
pequenas depesas
que, inevitavelmente, uma casa de fam?lia tem: passagem de ?nibus, p?o, leite.
Gastos que numericamente s?o pequenos, mas que acabam sendo di?rios.
"Pelo menos no meu ramo de emprego, a metalurgia, quase metade das pessoas
que eu conhe?o faz algum tipo de bico para ganhar um dinheirinho extra. As
oportunidades de emprego s?o sempre em empresas grandes, onde a negocia??o de
sal?rio ? complicada. Al?m do sal?rio ser baixo mesmo. O jeito ? apelar para o extra", resume o metal?rgico artes?o.
Se a grande maioria das pessoas aproveita o hor?rio p?s sol para buscar uma
alternativa de renda que complemente o emprego di?rio, Jonathan
Fernandes (foto) fez o caminho inverso. Ele trabalha como seguran?a
durante as madrugadas em um shopping da cidade, h? quase 10 anos, e de um ano pra c?, resolveu tamb?m arrumar um bico durante o dia.
Agora, ao sair do shopping ?s 6h, ele sabe que vai poder dormir pouco, j?
que ?s 10h pega no servi?o improvisado. O seguran?a resolveu distribuir g?s pelo seu
bairro, atrav?s de uma esp?cie de consigna??o que fez com a distribuidora
da irm?. Ele recolhe os pedidos, busca na irm?, carrega e troca para a
pessoa. Em troca disso ganha uma comiss?o.
A id?ia surgiu depois, que, segundo ele, as contas come?aram a apertar. "O
dinheiro mudou. Desde que comecei a trabalhar at? agora, parece que recebo
cada dia menos", comenta. De posse dessa informa??o e agora casado, ele teve
que apelar para o servi?o diurno tamb?m.
Ele diz que a esposa entende e que at? ap?ia, porque sabe que o dinheiro do
bico muitas vezes tem sido at? maior do que o do sal?rio fixo. Ele acha que o
fato de n?o se saber quanto se vai ganhar no fim do m?s com o bico ?
at? instigante, j? que, a quantidade de trabalho nesse caso ? proporcional ao
dinheiro ganhado depois.