Justiça atende pedido e adia depoimento de bolsonarista que matou petista

Por HERCULANO BARRETO FILHO

SÃO PAULO, SP, E FOZ DO IGUAÇU, PR (UOL/FOLHAPRESS) - A Justiça do Paraná atendeu nesta quinta-feira (15), no segundo dia de audiência, um pedido da defesa do policial penal Jorge José da Rocha Guaranho, que agora só será ouvido no dia 28 deste mês, após a conclusão de um laudo pendente do caso.

Denunciado por homicídio qualificado pelo assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda, ele seria chamado para depor nesta quinta por videoconferência no segundo dia de audiência de julgamento e instrução do caso, que começou na tarde desta quarta-feira (14) na 3ª Vara Criminal de Foz do Iguaçu (PR). Guaranho acompanhou a audiência virtualmente e chorou durante o depoimento da esposa.

Apoiador do presidente Jair Bolsonaro (PL), policial penal abriu fogo após invadir a festa da vítima, que comemorava o seu aniversário de 50 anos com uma festa temática alusiva ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na noite de 9 de julho. Ele está preso preventivamente desde a madrugada de 13 de agosto no Complexo Médico Penal de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba.

Ele foi transferido para a unidade prisional após ter alta hospitalar. Ferido após ser atingido por seis tiros dados por Arruda, que revidou aos disparos dados pelo atirador, Guaranho levou mais de 20 chutes na cabeça em quase seis minutos de agressões após o tiroteio.

A defesa voltou a dizer que Guaranho não se recorda do episódio que resultou na morte de Arruda, e solicitou à Justiça que ele só fosse ouvido após a conclusão de um laudo pendente. O pedido foi aceito.

"Consta nos autos que ele perdeu a memória no dia dos fatos. Entendemos que ele não pode ser interrogado antes da conclusão [dos laudos pendentes] para que tenha uma ampla defesa", disse o advogado Cleverson Leandro Ortega.

Uma nova audiência foi marcada para 28 de setembro, quando Guaranho deve ser ouvido. Só então sairá a resposta se o caso terá ou não júri popular.

O laudo que ainda não está pronto é o mapeamento do local do assassinato, como explicou à reportagem o advogado de defesa, Ian Vargas. "Esse mapeamento mostra onde estavam as pessoas, qual era a distância. É como se fosse uma planta do local". Mas o advogado apontou que esse laudo, apesar de importante, "não mudará a decisão do juiz".

Mãe de Guaranho, Dalvalice Rocha esteve em frente ao Fórum nesta quarta, no primeiro dia de audiência, e sustentou a mesma tese de legítima defesa apresentada pelos representantes legais de seu filho.

Ela disse que o filho diz não se lembrar do episódio e ficou sabendo do caso ao ver as imagens do tiroteio, mostradas pelo irmão. "Ele falou: 'nunca na minha vida eu pensei em tirar a vida de alguém'. O meu filho nunca foi um assassino. Foi uma tragédia", disse.

Ela citou o começo do desentendimento, quando Guaranho invadiu a festa de Arruda com uma música no carro alusiva a Bolsonaro, dando início à confusão. Após uma discussão, Arruda chegou a atirar areia no veículo do policial penal, onde também estavam a sua esposa e a filha pequena do casal. Em seguida, voltou para atirar.

Ian Vargas, um dos advogados de Guaranho, explicou a importância do depoimento do réu. "Precisa desse interrogatório, porque ele tem a opção de confessar, ficar em silêncio ou contar uma outra versão".

Ao todo, 16 pessoas seriam ouvidas, mas três foram dispensadas. Dessas, cinco eram testemunhas em comum da defesa e da acusação, seis foram indicadas pelos advogados de Guaranho e ouvidas pela defesa, e cinco foram chamadas pelo MP-PR (Ministério Público do Paraná) e foram ouvidas pela acusação.

PEDIDO POR JUSTIÇA

Antes da audiência, familiares e amigos de Arruda fizeram uma concentração em frente ao Fórum, mas foram embora assim que o evento começou.

Parentes e amigos da vítima se reuniram em frente ao Fórum para protestar, erguendo cartaz com um desenho do rosto dele, onde se lia: "Marcelo Arruda presente". O consultor de vendas Leonardo Arruda, 27, filho mais velho da vítima, contestou a versão da defesa de Guaranho, que alega legítima defesa.

"Não entendo isso como legítima defesa. Estávamos nos divertindo, fazendo uma festa sem incomodar ninguém. Estávamos comemorando a vida do meu pai. Aí, uma pessoa desconhecida chegou lá com o intuito de provocar, com músicas do Bolsonaro. Só esperamos que a justiça seja feita. E que o assassino possa pagar pelo que fez perante a lei".

Esposa de Arruda, Pamela Silva também se posicionou. "O Marcelo estava comemorando o seu aniversário em um local privado e foi brutalmente assassinado. Ele não está hoje aqui para se defender. Mas os amigos e a família estão aqui para defendê-lo e pedir por Justiça".

"Eu tive a infelicidade de ver o meu melhor amigo ser assassinado na minha frente", disse André Roberto Aguiar, que relatou ter presenciado a tragédia em meio à festa de 50 anos de Arruda. "Isso ocorreu no início de um processo eleitoral. Só espero que isso não fique impune para impedir novos atos de violência".

Aguiar reforçou a tese sustentada pelo MP-PR de crime por motivação política. "Ele [Guaranho] foi numa festa onde ele não conhecia as pessoas, porque não gostava do candidato que o Marcelo apoiava. Ele atirou primeiro. Depois, entrou [no salão de festas] para executar o Marcelo. As imagens mostram isso".

Para o promotor Marcelo Mafra, o adiamento foi a "a decisão mais sensata". "Os testemunhos basicamente confirmaram o que já havia sido colhido na fase investigatória, pela polícia, e não tivemos nenhuma alteração significativa. É importante colhermos outras provas para enfim encerrar o interrogatório dele".