Quatro edifícios antigos de SP podem sair do abandono após avanço em desapropriações
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Movimentos de sem-teto e grupos mobilizados para reverter a degradação imobiliária do centro de São Paulo tiveram quatro conquistas pontuais neste mês de setembro, em meio a um cenário desolador.
Após pressão pública e enquanto cresce o número de prédios vazios na cidade, a prefeitura publicou decreto que inicia processo de desapropriação do Palácio dos Correios e do Palacete do Carmo, o que abre caminho para que futuramente os imóveis voltem a ter uso público. Ato semelhante já havia recaído sobre o edifício Prestes Maia, que agora teve as obras de reforma autorizadas.
A quarta medida veio via Tribunal de Justiça de São Paulo, que determinou que a administração municipal inclua no programa Pode Entrar, de habitação social, uma comunidade residente em um antigo hotel da avenida São João, construído no início do século passado. Depois de 12 anos naquele endereço, já com a desapropriação encaminhada, as 80 famílias que ali vivem poderão se cadastrar para fazer a compra das unidades que compõem o conjunto. Antes da ocupação, o prédio estava abandonado.
Essas quatro ações fazem contraponto a um cenário de ruínas. Há ao menos 1.983 edifícios sem uso ou subutilizados na cidade de São Paulo, dado correspondente aos endereços que pagam alíquotas progressivas do IPTU, taxa que recai sobre casos de ociosidade. Há seis meses, esse número era de 1.743.
A gestão Ricardo Nunes (MDB) promoveu no último dia 15, na Associação Comercial, um ato de incentivo ao investimento imobiliário na região central. Incentivos fiscais, como o desconto no IPTU, foram apresentados como novidades, embora sejam práticas de gestões anteriores, agora reforçadas.
O Plano Diretor já previa, por exemplo, a construção de seis vezes o tamanho do terreno em localidades específicas da República e da Sé. "De maneira geral, na cidade, o limite máximo é de quatro vezes", diz nota da SP Urbanismo sobre a Área de Intervenção Urbana decretada sobre bairros da região central.
Os imóveis vazios são uma contradição em relação ao tamanho da população de desabrigados ou que vivem em condições precárias. Hoje, segundo dados do PMH (Plano Municipal de Habitação), o déficit na capital paulista é de 369 mil domicílios. Cerca de 32 mil pessoas vivem em situação de rua.
No caso da comunidade que obteve o direito de residir na São João, o apoio veio da Defensoria Pública e da Escola da Cidade, onde voluntariamente nasceu o primeiro estudo de viabilidade de conversão do edifício em residencial.
No texto de sua decisão de setembro, a juíza Larissa Kruger Vatzco, da 12ª vara da Fazenda Pública, lembra ainda de um instrumento que poderia ter sido usado pelas 80 famílias ali residentes, o usucapião.
Por nota, a Cohab, companhia metropolitana de habitação que gerencia o programa Pode Entrar, disse que "até o momento não foi notificada oficialmente sobre a decisão e aguardará as tramitações legais para se posicionar sobre o assunto". Ainda cabe recurso.
A copeira Lucimeire Pereira dos Santos, 50 anos, diz que, quando chegou àquele edifício, o estado de abandono era completo. O prédio não tinha redes de luz, água e esgoto, sistemas que foram construídos pelos novos moradores. Estava, também, tomado por entulhos e lixo, conta.
"Tinha muito rato e barata, achávamos que não iríamos dar conta", diz. Hoje, o prédio tem bibliotecas, áreas para confraternização dos moradores e até espaço para exposições.
O edifício Prestes Maia, localizado na avenida de mesmo nome ao lado da estação da Luz, foi desapropriado em 2016, "após as famílias se retirarem voluntariamente para possibilitar a contratação das obras", diz a prefeitura. A reforma será financiada com recursos provenientes do Fundo Municipal de Habitação, e serão investidos cerca de R$ 76,2 milhões.
A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social fez cadastro das famílias que residiam no local, ainda segundo a gestão municipal. "O Prestes Maia é uma ocupação que foi objeto de chamamento público em 2015, no qual a entidade responsável solicitou a reforma do edifício com recursos do Poder Público e seu projeto foi selecionado", diz a nota.
Projetado pelo engenheiro-arquiteto Alexandre Albuquerque na década de 1920, o Palacete do Carmo chegou a ser ocupado por movimentos sociais num passado mas distante, e essa ainda é uma possibilidade que ronda também seu vizinho, o Palácio dos Correios, cuja construção se iniciou em 1919 e a inauguração ocorreu três anos depois, no Anhangabaú. O edifício é cartão-postal da cidade, foi projetado por Ramos de Azevedo, o mesmo que desenhou o Theatro Municipal.
"Foram publicados dois Decretos de utilidade pública, que iniciaram processo de desapropriação do prédio dos Correios e Palacete do Carmo", diz nota da prefeitura.
Agora, os processos seguem para avaliação dos imóveis e a desapropriação só se consolida ao final, com o pagamento das indenizações. "Os imóveis irão abrigar equipamentos públicos", finaliza.