ONU pede para Egito parar com assédio e intimidação na COP27

Por PHILLIPPE WATANABE

SHARM EL-SHEIKH, EGITO (FOLHAPRESS) - A ONU (Organização das Nações Unidas) afirmou nesta sexta-feira (18) ter recebido múltiplas denúncias e evidências de que pessoas têm sido monitoradas e até interrogadas por funcionários do governo egípcio durante a COP27, conferência sobre mudanças climáticas que ocorre na cidade de Sharm el-Sheikh há duas semanas.

"O Egito precisa parar com todos os atos de assédio e intimidação", escreveram especialistas em direitos humanos da ONU.

Pela admissão no comunicado, o receio de que a COP27 pudesse ser cercada de monitoramento governamental egípcio e de uma participação não segura da sociedade civil demonstra ter se concretizado.

Nas últimas semanas, o jornal Folha de S.Paulo presenciou episódios de vigilância de ativistas por seguranças da COP27. Em um caso, um funcionário egípcio presente na área cercada onde ocorre a conferência registrava com um celular uma manifestação (que havia sido previamente autorizada).

No mesmo momento, um observador de direitos humanos da ONU o questionou sobre a motivação daqueles registros, mas não houve resposta -o segurança apenas saiu andando.

A reportagem recebeu relatos e provas de membros da sociedade civil sendo observados. A reportagem também presenciou um parlamentar egípcio interrompendo uma entrevista coletiva da ativista Sanaa Seif, irmã do preso político Alaa Abd el-Fattah, que estava, naquele momento, em greve de fome, sem ingerir nem mesmo água.

"Nós estamos profundamente preocupados pelos atos reportados de assédio e intimidação por funcionários egípcios, infringindo os direitos de egípcios e não egípcios na COP27, incluindo os seus direitos à liberdade de se reunir livremente, de expressão e de participação ativa", diz ainda a declaração da ONU.

Também é citado um caso de um defensor de direitos humanos que teve a entrada no país, para a participação na COP27, impedida.

Segundo a ONU, grupos da sociedade civil afirmaram preocupação com a necessidade de se autocensurarem para conseguirem garantir a sua própria segurança. Também há relatos de pessoas sendo intrusivamente questionadas no aeroporto.

Há ainda, registram os observadores da ONU no documento, preocupação com possíveis represálias, após o fim da conferência, contra defensores de direitos humanos que participaram da COP27. O Egito tem hoje, de acordo com estimativas feitas por entidades, cerca de 60 mil presos políticos.

A ONU afirma que os seus especialistas estão em diálogo com o governo egípcio e com o secretariado da UNFCCC, divisão da ONU sobre mudanças climáticas, responsável pela conferência.

O governo egípcio tem leis que, pelas restrições impostas, praticamente eliminam a possibilidade de manifestações e protestos públicos. Esse foi um dos pontos a causar preocupação nos meses que antecediam a COP27, considerando o papel vocal e presente da sociedade civil nas conferências.

Por causa das leis egípcias -e do local onde a COP27 ocorreu, em uma cidade turística cheia de resorts de luxo-, as manifestações da sociedade civil foram consideravelmente menores do que as vistas em conferências anteriores.

Elas, de forma geral, também ficaram limitadas ao interior do espaço onde ocorre a COP. Qualquer manifestação dentro desse espaço precisava seguir uma série de regras, como horários determinados e não mencionar nomes de países, pessoas ou empresas.

O atual governo egípcio de Abdel Fattah al-Sisi entrou no poder após um golpe de Estado. Em 2012, a eleição presidencial elegeu o islamita Mohamed Mursi, que seria deposto um ano depois, por um golpe liderado por Sisi, que venceu a eleição seguinte, em 2014, com 97% dos votos, de acordo com o governo.

Em 2018, Sisi voltou a vencer a eleição, após seus principais rivais desistirem -houve candidatos presos e pressionados. Na época da eleição, a agência de notícias Reuters chegou a entrevistar eleitores que afirmavam ter recebido pagamento como incentivo para votar.

Em 2019, um referendo levou a mudanças constitucionais pelas quais Sisi pode se reeleger e permanecer no poder até 2030.

No Egito, entidades apontam o controle estatal sobre a imprensa e o fechamento de veículos e sites.