Dentista é indiciado após paciente perder parte do nariz em Goiânia

Por MAURÍCIO BUSINARI

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) - O dentista Igor Leonardo Soares Nascimento foi indiciado pela Polícia Civil por exercício ilegal da medicina e lesão corporal gravíssima após realizar um procedimento cirúrgico na face de uma esteticista em Aparecida de Goiânia, Região Metropolitana de Goiânia (GO), que resultou em perda parcial do nariz da paciente.

O procedimento é um recurso utilizado por cirurgiões plásticos para afinar o nariz, chamado alectomia. Ele não pode ser realizado por dentistas. A vítima precisou fazer diversas cirurgias para reconstrução após um processo de necrose e ficou com o nariz deformado e diversas cicatrizes.

O dentista diz que o problema não foi decorrente da cirurgia, e sim causado por uma síndrome desenvolvida após uso de medicamentos, o que causou a necrose. E afirma que tem dado todo o suporte à paciente após o ocorrido.

Elielma Carvalho Braga procurou os serviços do dentista em 2020, atraída por anúncios postados na Internet. Na manhã seguinte ao procedimento, a esteticista começou a sentir os efeitos negativos. Desde então, ela passou por diversas cirurgias de enxerto e tratamento no rosto de. Outros procedimentos foram necessários para que recuperasse a capacidade de respirar pelas narinas.

"Minha vida é da sala para cama, da cama para sala. Uso máscara e parei de trabalhar. Trabalhava com limpeza de pele e até parei. Não me sentia bem, me sentia nervosa. Tentava fazer limpeza simples em cliente, mas dava nervoso", afirmou à reportagem Elielma, dois anos após o incidente.

A esteticista entrou com um processo na Justiça por danos morais e estéticos contra Nascimento e prestou queixa contra ele junto ao 1° DP Aparecida de Goiânia. Na sexta-feira (20), o inquérito realizado pela Polícia Civil foi concluído e encaminhado ao Tribunal de Justiça de Goiás.

Em nota, o órgão informou que o inquérito contou com a oitiva de testemunhas, juntada de documentos dos Conselhos Regionais e Federais de Odontologia e Medicina, análise documental, análise do exame de corpo de delito da vítima e informações periciais fornecidos pela Polícia Técnico Científica,

"Concluiu-se que o investigado, mesmo não possuindo o conhecimento técnico necessário (curso de medicina com especialização em cirurgia plástica ou otorrinolaringologia) praticou, assumindo o risco, lesão corporal gravíssima em paciente durante a realização de procedimento cirúrgico incisivo, após interpretação extensiva de que poderia praticar tal procedimento, mesmo que sem qualquer respaldo legal ou teórico", disse a delegada Luíza Veneranda, responsável pelo inquérito.

"O investigado também incorreu na prática do crime de exercício ilegal da medicina, arte dentária ou farmacêutica, previsto no artigo 282 do Código Penal, visto que executou procedimento cirúrgico, incisivo e exclusivo de profissional médico, não apresentando qualificação técnica necessária", afirmou.

A delegada ressaltou ainda que o autor praticava os procedimentos de forma habitual, com a finalidade de lucro. Ela revelou também que já existia um termo circunstanciado de ocorrência lavrado, em seu desfavor, no ano de 2021, pelo mesmo crime.

AGUARDANDO CONCLUSÃO

Procurado, o Crogo (Conselho Regional de Odontologia de Goiás), por meio de sua Comissão de Ética, informou que somente pode fornecer informações de processo ético finalizado, com condenação ou pena tornados públicos.

"Segundo os artigos 1º e 57º do Código de Processo Ético (Resolução CFO 59/2004), o Processo Ético Odontológico, em todo o território nacional, deve tramitar em sigilo", informou o órgão, em nota.

"O CROGO reforça, porém, que conforme a Resolução do CFO (Conselho Federal de Medicina) 230/2020, fica vedado ao cirurgião-dentista a realização dos seguintes procedimentos cirúrgicos na face: Alectomia; blefaroplastia; cirurgia de castanhares ou lifting de sobrancelhas; otoplastia; rinoplastia; e ritidoplastia ou face lifting".

O QUE DIZ O DENTISTA

Nascimento, que continua trabalhando enquanto aguarda decisão da Justiça, afirmou em nota ser cirurgião-dentista há 19 anos, especialista em implantes dentários, ortodontia e ortopedia funcional dos maxilares, estética bucal, e harmonização facial avançada.

"O problema do caso da Elielma foi uma reação que aconteceu após o procedimento que se chama Síndrome de Nicolau, que é um raro agravamento de vasos sanguíneos após o uso de medicamentos injetáveis. Algo muito raro de acontecer e foi devido ao preenchimento realizado no nariz dela e não pela cirurgia como estão falando", declarou.

"O fato dela ter demorado muito a buscar minha ajuda após o procedimento agravou muito a situação. Quando ela voltou até mim, que foi 3 dias depois, já estava ruim a situação. E, infelizmente, fiquei de mãos atadas e por isso ela sofreu sequelas tão graves".

"A paciente teve meu total suporte e apoio nos tratamentos que realizou após este episódio. Me sensibilizei bastante com o problema dela. Custeei os medicamentos e tratamentos posteriores com outros colegas. Nunca a deixei desamparada em termos financeiros e acompanhei de perto seu tratamento posterior ao ocorrido", afirma o dentista.

"Infelizmente, nós, profissionais da área estamos sujeitos a intercorrências que não são da nossa vontade. Sigo à disposição dela sempre que for preciso. E qualquer que seja a decisão judicial, eu mesmo farei o possível para colaborar com ela", concluiu na nota.