Tarcísio, quando ministro da Infraestrutura, rejeitou pedido de parceria de SP para duplicar Rio-Santos

Por RENATO MACHADO

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), optou por não participar dos planos e pedidos de parceria de seus antecessores para duplicar o trecho paulista da rodovia Rio-Santos quando comandava o Ministério da Infraestrutura do governo Jair Bolsonaro (PL).

As obras de duplicação da via vão beneficiar o trecho fluminense, entre o Rio e Angra dos Reis, com apenas uma "adequação de capacidade" até Ubatuba, no litoral norte de São Paulo.

Em sua gestão na Infraestrutura (de janeiro de 2019 a março de 2022), em assuntos relacionados ao litoral paulista, Tarcísio também foi alvo de críticas por travar os planos do Governo de São Paulo para construir uma ponte ligando Santos ao Guarujá.

Por outro lado, o então ministro apresentou como grandes feitos para a região as concessões de terminais do Porto de Santos e de um trecho menor da própria Rio-Santos, ofertado junto com a via Dutra.

O governador afirmou à Folha de S.Paulo que não atuou no trecho paulista da Rio-Santos por problema de jurisdição, porque essa parte está sob responsabilidade do estado. Acrescentou que em "momento algum" deu a entender ao governo Doria que incluiria essa parte, argumentando que os estudos para a concessão das vias já vinham desde 2017, antes mesmo do início das gestões do tucano e de Bolsonaro.

A Rio-Santos foi duramente afetada pelas fortes chuvas do último fim de semana, que provocaram destruição em cidades do litoral paulista e deixaram pelo menos 48 mortos.

Tarcísio afirmou na segunda (20) que pode não ter sobrado rodovia em alguns trechos da Rio-Santos por causa do temporal.

Os pontos mais atingidos da rodovia ficam no trecho sob responsabilidade do governo estadual. A concessionária CCR Rio-SP, responsável por administrar o trecho federal, mais ao norte, do Rio até Ubatuba, chegou a interromper a circulação do tráfego por questão de segurança, mas depois liberou.

A duplicação de todo o trecho paulista da Rio-Santos começou a ser tratada nos primeiros dias dos governos Doria, em São Paulo, e Jair Bolsonaro, a nível federal.

O então governador e sua equipe se reuniram com o próprio Tarcísio e técnicos do Ministério da Infraestrutura, quando acordaram que fariam estudos para a duplicação da via.

O objetivo era que a concessão do trecho paulista fosse atrelada ao leilão da Dutra. No entanto, o governo federal se desvinculou dos planos paulistas e excluiu do processo o trecho estadual, que representa a maior parte da Rio-Santos em São Paulo.

A Rio-Santos foi efetivamente concedida à iniciativa privada juntamente com a via Dutra em um leilão realizado em outubro de 2021, considerado o maior da história do setor.

O contrato de concessão prevê o investimento de cerca de R$ 15 bilhões nas duas rodovias. Em relação à Rio-Santos, ficará sob responsabilidade da concessionária o trecho entre o Rio de Janeiro e a cidade de Ubatuba (SP). Há a previsão da duplicação da via apenas no trecho fluminense, entre a capital do estado e Angra dos Reis. O trecho até Ubatuba não será duplicado

Os planos foram explicados pelo então ministro em audiência na Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados, um mês antes do leilão.

O deputado General Peternelli (União Brasil-SP) questionou o ministro sobre a ausência de duplicação do trecho paulista estadual. Tarcísio então respondeu que a eventual federalização dessa parte ficaria para ser analisada "com calma mais para a frente".

Hoje, Tarcísio criticou a tentativa de culpá-lo pela não duplicação do trecho paulista da Rio-Santos, sob o argumento de que nunca teve jurisdição sobre essa parte quando era ministro. "Quando a gente fez o projeto, a gente previu a duplicação integral da Rio-Santos até Ubatuba. Nesse momento, a gente nunca discutiu ir além de Ubatuba por uma questão de jurisdição. Quando você planeja uma concessão federal, você está pensando em rodovias federais, salvo melhor juízo, alguns arranjos que podem ser feitos."

Tarcísio disse que em momento algum se chegou a discutir com a gestão paulista a federalização desse trecho, para que fosse possível incluí-lo na concessão para a iniciativa privada. Ele afirmou que centenas de pedidos de federalização surgiram de vários estados, mas que não aceitou nenhum, por causa do cenário de restrição orçamentária.

O atual governador acrescentou que conversou e pediu ajuda ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para buscar soluções para o trecho paulista da Rio-Santos, mas que não pediu e nunca vai pedir a sua federalização.

Sobre o encontro entre sua equipe do Ministério da Infraestrutura e a do então governador Doria, Tarcísio afirmou que ouviu pedidos para incluir a Rio-Santos em eventual prorrogação da concessão da Dutra, mas que já havia estudos do Banco Mundial, de 2017, prevendo um modelo específico.

"Modelamos em conjunto o trecho federal. Mas não nos comprometemos em momento algum com federalização [do trecho estadual da Rio-Santos] [...] Em momento algum, demos a entender que isso iria acontecer, até porque, como mencionado, o estudo já vinha sendo conduzido há dois anos, desde 2017", afirmou o governo estadual, desta vez em nota.

Sobre o trecho até Ubatuba, Tarcísio disse que durante a audiência pública foi pedido para que não fosse duplicado, porque seu tráfego era inferior ao de Angra dos Reis e o investimento mais alto poderia encarecer demais o pedágio. Por isso optou-se por outras soluções, como a implementações de terceiras faixas de rolagem.

Segundo ele, a obra de duplicação não conseguiria conter os deslizamentos de terra no litoral norte de São Paulo. "O que está acontecendo na Rio-Santos agora não tem nada a ver com falta de manutenção. O que a gente está vendo aqui é um pavimento que estava em boas condições, que estava bem mantido. Agora você tem a maior chuva da história, numa região extremamente montanhosa. Os morros simplesmente derreteram."

Um integrante da gestão de Rodrigo Garcia (PSDB), que também tentou negociar com o governo federal, questionou o argumento de que a duplicação da Rio-Santos não foi incluída na concessão da Dutra por ser de jurisdição estadual. Segundo ele, toda a rodovia sempre foi federal, mas havia um convênio para que o Departamento de Estradas e Rodagem, estadual, realizasse a manutenção.

O Governo de São Paulo apenas solicitou a transferência da jurisdição do trecho para o estado após a decisão de não incluí-lo no leilão de concessão.

A questão do privilégio da duplicação do trecho fluminense da Rio-Santos foi objeto de questionamentos por parte de prefeitos da região do Vale do Paraíba e do litoral norte e serviu de munição para adversários durante a campanha pelo governo de São Paulo, no ano passado. O então governador Rodrigo Garcia (PSDB) explorou essa questão, assim como a não construção de uma ligação entre Santos e Guarujá

A construção de um túnel estava prevista no plano de concessão do Porto de Santos à iniciativa privada, que era uma das principais vitrines de Tarcísio à frente do Ministério da Infraestrutura. A obra tem custo estimado de R$ 2,5 bilhões. A gestão Garcia, por sua vez, defendia a construção de uma ponte e acusava na época o então ministro de barrar os planos.

A privatização do porto, por sua vez, acabou paralisada com a troca de governos, uma vez que a equipe de Lula é contrária à proposta defendida por Tarcísio desde a época de ministro.

Enquanto ministro, Tarcísio concluiu algumas obras na rodovia Rio-Santos e trecho urbano da via, para tentar melhorar as condições de fluxo de veículos e segurança. O governo federal inaugurou no ano passado um trecho de cerca de oito quilômetros de perímetro urbano da rodovia, no sentido Rio de Janeiro, que passou por obras de restauração de pavimento e manutenção, ao custo de R$ 10 milhões.

No fim de 2021, o então ministro também foi ao litoral paulista, em Santos, para inaugurar três obras ligadas às atividades e região do Porto de Santos, ao custo de R$ 600 milhões.