Lewandowski anula contrato de cessão de Fernando de Noronha a Pernambuco
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Um acordo firmado entre a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o governo de Pernambuco para a gestão compartilhada do arquipélago de Fernando de Noronha aguarda validação do STF (Supremo Tribunal Federal) e, enquanto isso não ocorre, precisa passar por alguns procedimentos prévio.
O primeiro desses procedimentos é uma decisão do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso no STF, assinada nesta terça-feira (14). Ele declarou a invalidade de um contrato assinado em 2002 no qual a União cedia o uso de Noronha a Pernambuco sob condições especiais.
No ano passado, o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pediu ao Supremo que declarasse que Noronha é de domínio federal com base nesse contrato, o que levou ao conflito judicial com Pernambuco.
Ao invalidar o contrato, Lewandowski justificou que o documento foi assinado apenas entre integrantes do Executivo e que seria necessária autorização legislativa para que ele fosse firmado.
"O contrato sob exame traduziu, a rigor, usurpação da competência legislativa, já que os supracitados dispositivos constitucionais estabelecem ao Poder Legislativo a prerrogativa de dispor sobre os bens pertencentes ao domínio público", disse o ministro em sua decisão.
Lewandowski manteve, porém, os atos administrativos que foram tomados durante a vigência do contrato, "em homenagem ao princípio da boa-fé e da segurança jurídica, sem prejuízo da possibilidade de revisão desses mesmos atos, por mérito administrativo, pelo Poder Público competente".
O caso ainda será julgado pelos demais ministros por meio do plenário virtual, quando a decisão passará por referendo dos outros dez integrantes da corte.
Por meio de nota, Lewandowski disse que "essa decisão é necessária para a análise e eventual homologação do acordo firmado entre a União e o estado de Pernambuco" e que segue analisando os termos. Não há data prevista para a validação do acordo.
O acordo de gestão compartilhada foi anunciado pela AGU (Advocacia-Geral da União) no último sábado (11) e prevê que as partes não poderão ampliar o perímetro urbano existente. Elas devem, ainda, evitar construções irregulares e regularizar ou demolir aquelas já erguidas sem cumprimento de normas ambientais específicas do arquipélago.
"Até que seja elaborado um novo estudo de capacidade, com indicadores de sustentabilidade da ilha, o número de turistas não poderá ultrapassar 11 mil ao mês e 132 mil ao ano", disse o governo, em nota.
Um comitê com gestores do governo federal e de Pernambuco será criado para acompanhar o cumprimento das obrigações de ambas as partes.
Segundo o governo, uma vez homologado, "o acordo vigerá por prazo indeterminado, só podendo ser substituído por novo ajuste entre as partes, igualmente submetido à apreciação prévia do STF".
Com o acordo, o governo federal aceita desistir do debate sobre a titularidade do arquipélago -em uma mudança de posição, considerando a medida do governo Bolsonaro.
GESTÃO BOLSONARO QUERIA 'POLO TURÍSTICO'
Em 2020, Bolsonaro afirmou em live nas redes sociais que o arquipélago parecia ser uma "ilha dos amigos". "Vamos tentar, se for possível, federalizar Fernando de Noronha, acabar com essas questões de que não pode parar navio lá. Fazer realmente um polo turístico", disse o então presidente. O governo Bolsonaro ainda afrouxou regras ambientais para a região.
O antigo governo argumentava ao STF que o local é de domínio da União porque Pernambuco havia descumprido o contrato de cessão de uso de Noronha em condições especiais.
À época, o governo federal afirmou ao Supremo que o estado fez concessões indevidas de edificações na faixa de praia, aumentou de forma irregular a rede hoteleira e deu permissões de uso sem autorização da SPU (Secretaria de Patrimônio da União).
Disse, ainda, que havia conflitos de competência entre o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e a Agência Estadual de Meio Ambiente de Pernambuco, e que o estado não cumpria pagamentos mensais à União.
"O estado de Pernambuco em nenhum momento notificou a SPU/ME acerca das ocupações irregulares vastamente comprovadas pelos órgãos de controle, bem como ressaltou que 'não se tem informação de medidas adotadas para readequação das irregularidades existentes à época do contrato ou impedimento de novas'", afirmava o pedido.
Em resposta ao pedido da gestão Bolsonaro, o governo pernambucano disse à época, em nota, que "Fernando de Noronha sempre fez parte de Pernambuco".
"Por sua localização estratégica foi considerada território federal em 1942 e utilizada como base militar na época da Segunda Guerra Mundial. Com a Constituição de 1988, voltou a compor o patrimônio do estado de Pernambuco. É um orgulho do povo pernambucano e vai continuar sendo", dizia o comunicado.