Justiça de SP suspende julgamento sobre indulto de Bolsonaro a PMs do Carandiru
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Por 12 votos a 10, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu, na tarde desta quarta (12), suspender o julgamento sobre a constitucionalidade do indulto presidencial que concede perdão aos policiais militares condenados pelo massacre do Carandiru, ocorrido em 1992.
A suspensão foi proposta pelo desembargador José Jarbas de Aguiar Gomes. Para o magistrado, a melhor decisão do colegiado neste momento é esperar pelo julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal), já que a ministra Rosa Weber suspendeu em janeiro, em caráter provisório, esse indulto natalino.
O placar de votação pelo órgão especial estava em 2 a 1 para constitucionalidade do indulto e seria empatado por Gomes, conforme afirmou o magistrado na sustentação dele.
"A boa cautela recomendaria que se aguardasse o pronunciamento do STF a esse respeito. Naturalmente, a fim de que evitássemos decisões que, porventura, possam ser diferentes. Porque, uma vez que reconhecida a constitucionalidade aqui, e posteriormente, reconhecida a sua inconstitucionalidade pelo STF, me parece que haverá um problema maior a ser enfrentado. É uma questão apenas de cautela", disse.
O indulto natalino que beneficiou os 74 policiais militares condenados pela participação no episódio que deixou 111 vítimas em 1992 foi publicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no final do ano passado, um dos últimos atos do governo.
Embora não fosse nominal, o texto do artigo descreve circunstâncias particulares que se encaixam na situação os PMs envolvidos no caso.
"Será concedido indulto natalino também aos agentes públicos que [...], no exercício da sua função ou em decorrência dela, tenham sido condenados, ainda que provisoriamente, por fato praticado há mais de trinta anos, contados da data de publicação deste Decreto, e não considerado hediondo no momento de sua prática", diz o artigo 6º, inexistente nos indultos anteriores.
Como o processo contra os PMs transitou em julgado no passado, e não cabe mais discussão sobre o mérito do caso, a 4ª Câmara Criminal do TJ previa julgar no final de janeiro passado se a quantidade de pena aplicada estava adequada para cada réu, a chamada dosimetria. Havia a possibilidade de que fosse decretada a prisão dos condenados.
Com esse novo adiamento, segundo magistrados ouvidos pela reportagem, há o risco de as penas de parte dos réus começarem a prescrever ainda neste ano se o assunto não for colocado em pauta pelo STF rapidamente. A prescrição significa que o Estado não poderá aplicar as penas aos condenados em razão do longo tempo que demorou para decidir sobre o assunto.
Foi este o receio que levou o procurador Maurício Ribeiro Lopes, responsável pelo caso, a cobrar publicamente o TJ paulista para que o caso fosse colocado em pauta. Na nota, divulgada em fevereiro, Lopes afirmou que "o prazo prescricional para os condenados maiores de 70 anos aproxima-se velozmente" e o TJ precisava agir firmemente.
Procurado pela reportagem nesta quarta, o procurador disse que o Ministério Público requereu que o julgamento sobre a dosimetria fosse mantido para janeiro, mas 4ª Câmara que decidiu instaurar o "incidente de inconstitucionalidade do decreto de indulto".
"Agora, o órgão especial decidiu não decidir e aguardar a decisão definitiva do STF. A prescrição é iminente para vários réus. Deixarão entrar pela janela o que o Ministério Público tentou expulsar pela porta. Decepcionante ver que após mais de 30 anos o massacre ainda produz vítimas", afirmou à Folha de S.Paulo.
Os PMs foram condenados a penas que variam de 48 a 624 anos. As condenações se referem a 77 assassinatos com armas de fogo. A Promotoria excluiu 34 vítimas do total porque havia dúvida se elas foram alvo de PMs ou atacadas pelos próprios presos, como aquelas feridas por armas brancas.
De acordo com a defesa, dos 74 policiais condenados, cinco morreram durante o processo. Os 69 ainda vivos, ainda segundo o advogado, estão aposentados e com idade média superior aos 60 anos. "Boa parcela com doenças graves, típicas da idade", disse o advogado dos PMs, Eliezer Pereira Martins, em entrevista anterior.