Ministério da Saúde busca pastores para ampliar vacinação contra Covid

Por RAQUEL LOPES E MATEUS VARGAS

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O Ministério da Saúde tenta se aproximar de líderes religiosos para que eles divulguem entre os fiéis a importância da vacinação contra a Covid. A medida integra os esforços do governo para intensificar a cobertura no país, que desperta preocupações na cúpula da pasta.

A gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Saúde tem entre suas prioridades reverter anos de campanha antivacina do governo de Jair Bolsonaro (PL). A pasta também planeja intensificar os investimentos em comunicação e vem cobrando dos secretários de estados e municípios mais resultados na área.

A necessidade de envolver lideranças religiosas na campanha de imunização já foi abordada pelo próprio Lula ainda na transição. Ele se referiu ao assunto ao cobrar a responsabilização de quem propagou fake news sobre a vacinação.

"Pretendo procurar várias igrejas evangélicas e discutir com o chefe delas: 'Olha, qual é o comportamento de vocês nessa questão das vacinas?'", disse Lula em novembro durante videoconferência com gestores do SUS (Sistema Único de Saúde). "Ou vamos responsabilizar vocês pela morte das pessoas", afirmou o então presidente eleito.

De acordo com documentos obtidos pela Folha, o Ministério da Saúde tem expressado aos estados e municípios preocupação com a redução de pedidos de entrega de doses e com os estoques de vacinas.

Os dados mostram baixo percentual de crianças que receberam as duas doses de Covid-19. Em ofício de 19 de abril deste ano, o ministério comandado por Nísia Trindade ressaltou que nenhum estado apresentava mais de 30% do grupo de crianças com idades entre 6 meses e 4 anos vacinada com as duas rodadas.

O ministério ainda afirmou nos documentos que os estados passaram a pedir menos doses. "A queda nas solicitações, possivelmente decorrente da diminuição da procura pela população, aumenta o risco de vencimento dessas vacinas."

Como a Folha revelou, a pasta já perdeu 39 milhões de doses contra a Covid-19, compradas por cerca de R$ 2 bilhões, desde o começo da pandemia até março. Esse dado considera apenas o que estava estocado no ministério e nem sequer foi entregue aos estados.

A maior parte (cerca de 27 milhões) venceu em 2023, mas gestores do SUS atribuem a culpa por essas perdas à gestão Bolsonaro. Isso porque as doses foram herdadas com validade curta, e o ex-presidente desestimulava a vacinação, especialmente em crianças.

A gestão Lula, porém, dá como certo que uma parte dos imunizantes comprados neste ano também vai vencer. É normal que haja perdas em campanhas de imunização, mas o temor é de que o volume seja alto, caro e gere críticas ao governo petista.

Um dos ofícios afirma que os estados solicitaram 41,7 milhões de doses de imunizantes de janeiro até a metade de abril de 2023. O número é inferior ao solicitado em junho de 2022 (cerca de 45,5 milhões), segundo documento inserido no mesmo processo e enviado em 2022.

O Ministério da Saúde foi procurado, mas não se manifestou sobre a campanha de imunização.

Alexandre Naime, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista), avalia ser relevante se aproximar de líderes religiosos, assim como de professores e influenciadores.

"É muito importante porque está falando com um mensageiro muito próximo da comunidade e que tem força de opinião junto aos fiéis, por exemplo. A vacinação continua sendo importante porque o vírus continua em circulação e, inclusive, crianças ainda são internadas", destaca.

Membros da pasta têm pedido em declarações públicas que as pessoas se vacinem. Nísia disse que a Covid-19 não acabou após a OMS (Organização Mundial da Saúde) declarar que a doença não é mais uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional.

"Por isso, a vacinação segue como ação fundamental. Precisamos da mobilização de todos para ampliar a cobertura vacinal e combater a desinformação que questiona a segurança e a eficácia dos imunizantes", declarou a ministra.