Brasil tem 203 milhões de habitantes, 4,7 milhões a menos do que o previsto, mostra Censo
RIO DE JANEIRO, RJ, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Brasil tem 203,1 milhões de habitantes, apontam os primeiros dados do Censo Demográfico 2022, divulgados nesta quarta-feira (28) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O resultado representa 4,7 milhões de pessoas a menos do que a prévia da pesquisa.
Em dezembro do ano passado, o próprio instituto calculou a população em 207,8 milhões. Essa prévia foi composta por dados iniciais do Censo, além de projeções.
A diferença é ainda maior na comparação com um dado anterior, divulgado em 2021, quando o IBGE estimava o número de habitantes em 213,3 milhões. Essa previsão levava em conta dados do Censo anterior, de 2010.
O resultado definitivo de 2022 mostra que a população brasileira cresceu desde 2010. O ritmo, porém, é cada vez menor.
O número de moradores representa uma alta de 6,5% (12,3 milhões a mais) em relação ao Censo anterior, quando o país tinha 190,8 milhões de habitantes. Isso significa que a taxa de crescimento foi de 0,52% ao ano.
Trata-se do menor nível já registrado em um recenseamento no Brasil. O primeiro ocorreu 150 anos antes, em 1872. De lá para cá, o país soma 13 operações censitárias.
A série histórica divulgada pelo IBGE mostra que a taxa de crescimento anual já chegou a 2,99% na passagem de 1950 para 1960.
O percentual encolheu de forma consecutiva nas décadas seguintes, até atingir 1,17% em 2010 e 0,52% em 2022. É a primeira vez que o avanço fica abaixo de 1% em um Censo.
Esse movimento ilustra o que especialistas chamam de transição demográfica, que traz reflexos tanto em questões comportamentais quanto na área econômica.
"A queda da fecundidade começou no final da década de 1960. Começou com uma queda pequena, mas a partir da década de 1970 se espalhou pelo Brasil todo", diz o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, pesquisador aposentado do IBGE.
"De lá para cá, a fecundidade só cai. Ao mesmo tempo, temos um aumento da expectativa de vida e uma redução das taxas de mortalidade."
Com menos filhos, as famílias tendem a investir mais na formação de uma mesma criança, e as mulheres podem encontrar menos dificuldades para a entrada no mercado de trabalho, afirma Alves.
O crescimento menor da população, por outro lado, encaminha o país para o fim do chamado bônus demográfico, segundo o especialista.
Isso traz desafios para a economia, já que a parcela da população em idade de trabalhar tende a diminuir, enquanto a de aposentados, aumenta. O segredo para superar o quadro, diz Alves, é elevar a produtividade ?capacidade de produzir mais com menos.
"A transição demográfica é o maior fenômeno de mudança de comportamento em massa da humanidade. Está mexendo com a vida das pessoas, com a morte delas", afirma.
Higor Gonçalves, 37, trabalha como relações públicas e é filho único. Sua mãe vinha de uma casa cheia: tinha dez irmãos.
"Minha mãe tinha pavor de família gigantesca e isso impactou na decisão de ter só um filho", diz ele, que não planeja ser pai.
"Não queria colocar um filho no mundo para ser criado por babá. Queria dar atenção e cuidar. Mas, no mundo de hoje, está muito complicado pela rotina e pelo trabalho. Sou muito absorvido pelo trabalho e é algo que me satisfaz", afirma.
"Tínhamos mais tempo antes, trabalhávamos no horário comercial, hoje não. Com WhatsApp, isso fica impossível."
Com o casamento se aproximando, a assessora de eventos Jéssica Souza, 28, acredita que a pressão por ter filho deve aumentar. Porém, nem ela e nem o noivo desejam uma criança.
"Tenho outras prioridades, outros objetivos, e ter um filho precisa de condições, casa, orçamento. Gosto da minha liberdade, chegar na hora que quiser", diz.
O presidente interino do IBGE, Cimar Azeredo, disse que o instituto ainda trabalha para entender o que está por trás do crescimento menor da população.
Segundo ele, também é necessária uma análise mais detalhada a respeito de eventuais impactos da mortalidade provocada pela pandemia de Covid-19.
A divulgação do Censo 2022 será feita em etapas. A primeira, ocorrida nesta quarta, não trouxe dados sobre as características etárias e de gênero dos brasileiros. Ficou centrada na evolução do número de habitantes e de domicílios.
"A gente precisa esperar o trabalho que os demógrafos do IBGE estão fazendo para que a gente possa entender melhor o quanto o Brasil pós-pandemia está sendo influenciado por fecundidade, mortalidade, migração internacional, uma série de fatores que podem contribuir de forma expressiva para a queda da taxa de crescimento anual", afirmou Azeredo.
A coleta das informações do Censo começou no dia 1º de agosto do ano passado, e o IBGE planejava encerrar as entrevistas em três meses, até outubro. O instituto, contudo, encontrou uma série de dificuldades para avançar nos trabalhos. Por isso, foram feitas coletas de dados residuais até o final de maio deste ano. Ou seja, a operação levou quase dez meses.
Restrições orçamentárias, atrasos em pagamentos para recenseadores e o clima de tensão em meio à corrida eleitoral estão entre os motivos apontados para a demora.
A taxa de não resposta ao Censo foi de 4,23% no Brasil. É o percentual de domicílios onde o IBGE constatou que havia moradores, mas não conseguiu fazer as entrevistas.
Já a taxa de recusa alcançou 1,38%. Trata-se do percentual de domicílios onde as pessoas não quiseram prestar as informações.
Essas porcentagens foram maiores no estado de São Paulo, o mais populoso do país. A taxa de não resposta local alcançou 8,11%, e a de recusa, 2,34%.
Questionado se os percentuais de São Paulo impactaram o resultado geral da população brasileira, Azeredo disse que a cobertura está "muito consistente" e que o IBGE está "bastante contente" com os resultados.
O presidente interino lembrou que, em pesquisas como o Censo, e não só no Brasil, é usada a técnica de imputação em domicílios ocupados cujos moradores não participam das entrevistas. Trata-se de uma estimativa.
Segundo Azeredo, a imputação não prejudicou o resultado geral. "Hoje, a gente tem total certeza de que a população é essa que está colocada, os 203 milhões", disse.
Em 2022, a população imputada no Brasil foi de quase 8 milhões, o equivalente a 3,92% do total. A contada alcançou 195,1 milhões.
No Censo de 2010, a parcela resultante do processo de imputação havia sido de 2,8 milhões, segundo o IBGE. Foi menos de 2% do total à época.
POPULAÇÃO RECENSEADA É MENOR DO QUE ESTIMATIVA
A nova edição do Censo tem o dia 31 de julho de 2022 como data de referência. Assim, as pessoas nascidas após essa data não foram incluídas na contagem.
Durante a operação censitária, especialistas alertaram que a coleta prolongada traria riscos de imprecisão para os dados, mas o IBGE argumentou que o uso de novas tecnologias minimizaria as ameaças.
Os dados da contagem da população, contudo, mostram diferenças em relação às estimativas populacionais do instituto.
Em 2021, o órgão havia projetado a população brasileira em 213,3 milhões de habitantes, ou seja, em torno de 10 milhões a mais do que a contagem do ano passado.
As estimativas populacionais são feitas a partir da edição mais recente do Censo. Um dos procedimentos recomendados por especialistas para calibrá-las é a realização de uma nova contagem, mais enxuta do que o Censo, no meio de cada década. Porém, em 2015, essa contagem foi cancelada por falta de verba.
Azeredo afirmou que os demógrafos do IBGE estão "debruçados" sobre os dados para entender as diferenças entre as estimativas e o Censo. Ele, contudo, chamou atenção para a falta da contagem no meio da década passada.
"Essa diferença, ela tem uma associação, nós não tivemos a contagem de população no meio da década. É fundamental que, em 2025, a gente faça a contagem da população", disse.
"Temos que fazer uma contagem para que a gente não se depare com diferenças grandes. Acho que a pandemia teria sido muito mais branda se nós tivéssemos tido uma contagem de população no meio da década. A pandemia pegou o Brasil num apagão de dados", acrescentou.