Empresário de tecnologia, Feder aposta em digitalização acelerada em SP

Por ISABELA PALHARES

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Empresário do setor de tecnologia, Renato Feder determinou o uso de sete aplicativos nas escolas estaduais de São Paulo desde que assumiu o comando da Secretaria de Educação da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), há oito meses.

Nesse período, ele tem apostado na digitalização do ensino. O plano enfrenta desafios, porém, como a falta de equipamentos e internet em todas as unidades.

A secretaria diz que está em um "processo de implementação de um pacote de tecnologia para tornar a escola mais moderna e atrativa aos estudantes".

Feder anunciou que abriria mão de livros fornecidos pelo governo federal para usar apenas material didático digital feito por sua equipe. Depois de críticas e da abertura de um inquérito do Ministério Público, a gestão Tarcísio recuou parcialmente e anunciou que manterá o material impresso.

Formado em administração e CEO por 15 anos da Multilaser --empresa de equipamentos de tecnologia--, Feder defende que o trabalho dos professores nas escolas seja acompanhado por métricas. Por isso, aposta nas plataformas digitais para monitorar as atividades.

Segundo o Censo Escolar 2022, 96,9% das escolas estaduais paulistas têm internet, sendo que 81,5% delas oferecem conectividade para uso dos alunos.

Ainda que a cobertura seja alta, dados do Mapa da Conectividade na Educação mostram que só 4,4% das unidades de ensino estaduais de São Paulo dispõem de internet com velocidade considerada boa ou ótima. Em 66,2% a velocidade é ruim ou péssima. No restante, não houve monitoramento.

A secretaria admite ainda não ter computadores para todos os estudantes. Com mais de 3,5 milhões de alunos, a rede conta com 900 mil equipamentos (entre tablets, notebooks e desktops).

"Esse número garante uma média de quatro alunos por dispositivo e uma cobertura suficiente para um uso em revezamento dos equipamentos", afirma a pasta.

Um dos primeiros anúncios feitos pelo secretário foi o aplicativo Aluno Presente, em que os professores devem registrar as faltas dos estudantes. Em seguida, ele decidiu que as escolas deveriam aplicar simulados da Prova Paulista de forma online, também por aplicativo.

Uma semana após o lançamento, os aplicativos apresentaram problemas e muitas escolas tiveram que adiar os simulados. Os professores relatam que instabilidades no sistema são comuns e que eles acabam tendo que registrar a chamada de forma manual para depois lançar as informações na plataforma --o que duplica o tempo gasto.

Na volta do recesso escolar de julho, o secretário reforçou ainda mais a exigência de uso de tecnologias. A partir deste segundo semestre, as unidades devem incorporar nas aulas mais cinco plataformas de educação.

Os professores foram orientados a usar diariamente a plataforma Tarefa SP para encaminhar lição de casa. A orientação da secretaria é que os docentes deem um prazo de 48 horas para os alunos fazerem os exercícios.

Outra plataforma é o Leia SP, que tem como meta garantir que os alunos leiam um livro por bimestre. O acervo digital dá acesso a 90 títulos selecionados pela própria pasta. A lista inclui best-sellers, clássicos da literatura nacional e estrangeira e livros sobre empreendedorismo.

As escolas também precisam usar a plataforma Redação Paulista, com a meta de garantir que os alunos escrevam uma redação por mês. Também precisam usar a Khan Academy, com meta de acesso mínimo de 30 minutos por semana pelos estudantes. E a plataforma Me Salva! de preparação para o Enem para alunos do terceiro ano do ensino médio --a meta é que todos os estudantes façam ao menos 20 exercícios por semana.

Para professores da rede ouvidos pela reportagem, a implementação tem ocorrido sem considerar a realidade e as necessidades das unidades, o que tem gerado desgaste no ambiente escolar. Como não há estrutura adequada, eles dizem perder tempo de aula quando as plataformas apresentam problemas ou precisam recorrer à internet do próprio celular para acessá-las.

Eles também reclamam de menos autonomia para conduzir as aulas, já que todos os conteúdos e atividades devem seguir o que determinam as plataformas.

"Para cumprir todas essas metas, o professor não pode dar a aula dele. Ele só tem tempo para seguir as instruções das plataformas, vira só um executor de aplicativos. É um desrespeito com a formação, o conhecimento e a experiência dos docentes", afirma Fernando Cássio, pesquisador da Repu (Rede Escola Pública e Universidade).

Rose Neubauer, ex-secretária de Educação de São Paulo, diz que as ferramentas digitais podem ser um complemento benéfico para o ensino, mas que isso precisa ser apresentado aos professores. "É importante mostrar resultados e evidências dos benefícios, caso contrário se torna só uma obrigação ou um roteiro a ser seguido", diz.

Além disso, ela aponta que essas ferramentas precisam ser integradas aos recursos tradicionais, como livros e apostilas.

Questionada pela reportagem, a secretaria não informou os custos do uso dessas plataformas nem detalhou como foram escolhidas as empresas que estão oferecendo esses serviços às escolas.

"As plataformas são fornecidas de diferentes formas, seja por meio de convênios, parcerias ou desenvolvidas internamente pela equipe de tecnologia, após avaliação e criteriosa seleção pelas áreas técnicas da Seduc", disse em nota.

Sobre as metas exigidas para uso das plataformas, a secretaria disse que "professores e alunos possuem objetivos pedagógicos a serem alcançados, porém não serão punidos de forma alguma, caso esses não sejam atingidos".

A pasta não informou quais aplicativos são desenvolvidos pela equipe da própria secretaria. Ao menos duas dessas plataformas são desenvolvidas por empresas, a Khan Academy e Me Salva!. A reportagem tentou contato com os responsáveis por elas, mas não recebeu resposta. Já a Multilaser afirmou que o secretário se desligou da empresa em 2018.