Brasil precisa de lei para regulamentar câmeras da PM, diz coronel que idealizou modelo de SP

Por RANIER BRAGON

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Ex-responsável pelo programa de câmeras corporais nas fardas da Polícia Militar de São Paulo, o coronel da reserva Robson Cabanas Duque defende que o Congresso Nacional aprove uma lei deixando claros os parâmetros de uso do equipamento pelas polícias do país.

Cabanas gerenciou o projeto Olho Vivo até 2022, o que coincidiu com período em que as estatísticas mostraram uma redução na letalidade policial e na morte de PMs no estado.

Atualmente o programa paulista está sob questionamento no governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) ?na campanha ele chegou a dizer que extinguiria a ação, mas depois recuou. Ele não respondeu à pergunta da Folha sobre qual é a sua atual posição sobre o tema.

O governo Lula (PT) estuda implantar a medida na esfera federal, além de induzir a adoção por estados.

"A minha avaliação é que o Brasil precisa ter uma política clara sobre o emprego de câmeras corporais com financiamento para as forças que desejam implantar, mas não só isso", afirmou à Folha Cabanas, que hoje vive na Espanha.

Ele afirma que essa política deve auxiliar tecnicamente a implantação do modelo e fornecer know-how, com material didático e protocolos mínimos de emprego operacionais do equipamento, com a finalidade de ser um guia.

"Entendo ser importante colocar o tema no Congresso Nacional para edição de lei estabelecendo parâmetros legais sobre como empregar o equipamento e como custodiar e compartilhar as imagens advindas do sistema. Temos que ter uma lei e uma regulamentação que estejam alinhados aos direitos constitucionais da privacidade, intimidade, honra entre outros, mas também aos códigos processuais, à LGPD e à Lei de Acesso a Informação."

Cabanas e o Instituto Sou da Paz elaboraram uma nota técnica que visa defender o modelo e orientar governo e estados sobre as formas mas adequadas de implantação.

O uso de câmaras nos uniformes contribui para a redução de mortes e maior profissionalização das polícias, mas precisa ser aplicado com planejamento detalhado e convencimento da tropa, defende nota.

Cabanas reconhece que a vontade do mundo político é fundamental, um facilitador importante, mas que para PMs de estados maiores isso não é indispensável.

"A iniciativa pode partir internamente como uma solução técnica, diminuindo o impacto que o apoio político poderia ter. Este foi o caso de São Paulo. Uma ideia que surgiu dentro da instituição nos idos de 2014 e que passou por várias gestões de governo do estado até ser implantada em 2020, seguindo sua programação até os dias de hoje."

O coronel da reserva diz ainda que a principal dificuldade em sua experiência em São Paulo foi a de que a PM à época queria um sistema de gravação de turno completo, o que ainda não estava desenvolvido, mas que várias empresas se apresentaram na licitação com essa tecnologia.

"Isto permitiu à PM de São Paulo ser pioneira na gravação de turno completo que, aliados a outros fatores, ajudaram sensivelmente nos significativos resultados encontrados como redução de policiais mortos em serviço e redução de mortes em confronto com a polícia."

Cabanas também cita a revisão de vídeos aleatórios feita por sargentos e tenentes, o que segundo ele só é feito pela polícia metropolitana de Londres e pela PM de São Paulo --o governo do estado não respondeu, porém, se a prática tem sido mantida na administração de Tarcísio de Freitas.

"O balanço do programa é extremamente exitoso. Isso se deve à Polícia Militar de São Paulo, que se modernizou, preparou seu efetivo profissionalmente, forneceu meios para que os profissionais pudessem trabalhar seguros e assim reforçar o compliance, ao mesmo tempo que ofertaram mais proteção ao policial e mais transparência à sociedade", disse Cabanas.

O coronel acrescenta que as câmeras não são a "bala de prata" da segurança pública, mas "um instrumento muito importante no desenvolvimento das forças de segurança do país".

Questionado se vê ameaça de retrocesso em São Paulo, ele afirmou que geralmente a discussão fica centrada na questão de redução de letalidade e desconfiança nas ações dos policiais e que, em muitos casos, há uma discussão rasa na sociedade.

"Na verdade, quando as autoridades tomam contato com a profundidade de reflexos positivos que a tecnologia traz, há uma percepção de que é uma política pública de sucesso. A partir daí as ideias são de como se pode melhorar ainda mais o sistema integrando outras funcionalidades com aplicação de algorítimos para reconhecimento facial, integração com comunicação de voz, com drones etc."