Com mais poderes, agentes de trânsito agora podem usar bafômetro para fiscalizar motoristas

Por FÁBIO PESCARINI

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma recente mudança na legislação aumentou o poder das prefeituras para fiscalizar infrações de trânsito. Desde junho, órgãos municipais estão autorizados, por exemplo, a usar bafômetro para conferir se um motorista bebeu antes de dirigir ?e a multá-lo, se não passar no teste. Até então, a Lei Seca era de responsabilidade apenas dos Detrans (Departamento de Trânsito) ou da polícia, inclusive rodoviária.

Os agentes de trânsito agora também podem fiscalizar, autuar e até guinchar veículos com película irregular nos vidros, rebaixados, com pneu liso, em mau estado de conservação e com lâmpadas queimadas, entre outras atribuições que não estavam na alçada municipal.

Motociclistas que trafegam com escapamentos barulhentos e motoristas que erguem o som a volumes altos também devem ficar atentos à aplicação de multa pelos agentes de trânsito.

CNH (Carteira Nacional de Habilitação) vencida, falta de lentes corretoras obrigatórias e licenciamento do veículo vencido são outros casos incluídos na lista de novas competência dos órgãos municipais de trânsito.

A mudança aparece no art. 24 da lei 14.599, promulgada em 19 de junho de 2023.

"O município é o mais próximo do cidadão, responsável pelo fluxo de veículos", afirma o advogado Ademir Rafael dos Santos, presidente da Comissão de Trânsito da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil) em São Paulo, sobre a atualização da legislação.

Segundo o novo texto, "compete concorrentemente aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas e penalidades previstas no CTB [Código de Trânsito Brasileiro]".

Até então, havia uma distribuição de competências. As dos municípios eram basicamente relacionadas a circulação, parada, estacionamento, peso, dimensão e lotação.

Aos órgãos estaduais e rodoviários cabia a fiscalização de veículos e condutores, explica o representante da OAB, que tem feito palestras e ministrado cursos sobre a mudança.

"Com a nova lei, os municípios podem autuar praticamente todas as infrações que anteriormente eram estaduais", diz o advogado.

De acordo com o Ministério dos Transportes, continuam fora da esfera municipal as infrações que são de competência privativa dos estados e que envolvem o registro do veículo.

"Em termos estruturais, a lei mudou muito", afirma o presidente do Detran paulista, Eduardo Aggio de Sá.

O que diz a lei 14.599, de 19 de junho de 2023

- Fica a cargo de órgãos e entidades executivos de trânsito dos municípios a execução da fiscalização de trânsito em vias terrestres, edificações de uso público e edificações privadas de uso coletivo; a autuação e aplicação das penalidades de advertência por escrito e multa e as medidas administrativas pelas infrações previstas pelo CTB (Código de Trânsito Brasileiro), excetuadas aquelas de competência privativa de órgãos ou entidades executivos de trânsito dos estados e do Distrito Federal; notificação de infratores e arrecadação das multas aplicadas

OPERAÇÕES DA LEI SECA

O advogado Ademir Rafael dos Santos lembra que as operações da Lei Seca, que no perímetro urbano eram só realizadas pela Polícia Militar, agora podem ser feitas pelos agentes de trânsito das cidades, que também podem autuar quem se recusa a fazer o teste do bafômetro.

Municípios procurados pela reportagem afirmaram que estão estudando a nova legislação ou preparam seus agentes para a mudança.

Nos bastidores, as cidades avaliam formas de garantir a segurança de seus agentes nas abordagens a motoristas ?no caso das operações do Detran paulista, por exemplo, elas são realizadas pelo Policiamento Militar de Trânsito.

"Acredito que, por questão de segurança, em alguns casos será preciso pedir apoio da Guarda Municipal ou da própria PM", afirma o presidente da Comissão de Trânsito da OAB-SP.

A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) de São Paulo diz que o processo de planejamento está em discussão, mas que, na prática, as atualizações da lei já eram adotadas graças a um convênio com a Polícia Militar.

Afirma, ainda, que no momento não há previsão de alterações nas ações realizadas por seus agentes ou para a compra de novos equipamentos decorrentes da nova legislação. A reportagem, porém, apurou que recentemente a CET fez uma consulta sobre disponibilidade de etilômetros e de atuação conjunta com o Detran.

Sem confirmar a consulta, a companhia afirma "que está em permanente diálogo com os entes de trânsito do governo estadual para dar prosseguimento ao planejamento e à evolução das políticas públicas destinadas à segurança viária".

No Rio de Janeiro, a prefeitura diz em nota que ainda não há uma definição sobre a fiscalização de alcoolemia.

Em Guarulhos, na região metropolitana de São Paulo, agentes de trânsito estão recebendo treinamento para adaptação à nova lei.

"Em um segundo momento, serão traçadas diretrizes, que já se encontram em desenvolvimento, para implementação de novos procedimentos operacionais", afirma a administração, que está em tratativas para aquisição de etilômetros.

Na cidade, a Guarda Municipal faz fiscalização de trânsito e poderá realizar ações em conjunto com os agentes da STMU (Secretaria de Transportes e Mobilidade Urbana). "Mas ocorrerão operações independentes de cada órgão", diz outro trecho da nota.

Com a ampliação do número de infrações que podem ser fiscalizadas, há a possibilidade de as receitas dos municípios crescerem ?a lei estabelece que os órgãos autuadores podem arrecadar com as multas que aplicarem.

Em São Paulo, a Secretaria Municipal da Fazenda afirma que no ano passado foram arrecadados R$ 2,10 bilhões com multas de trânsito.

O número é 175% maior que o de 2021, quando cerca de R$ 766 milhões entraram nos cofres públicos da prefeitura com autuações a motoristas e motociclistas ?a arrecadação foi beneficiada pela cobrança de infrações que ficaram represadas durante a pandemia de Covid-19 e se acumularam.

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ALGUMAS MULTAS QUE AGORA PODEM SER APLICADAS PELO MUNICÍPIO

Conduzir veículo com:

- Lacre, inscrição do chassi, selo, placa ou qualquer outro elemento de identificação do veículo violado ou falsificado

- Passageiros em compartimento de carga, salvo por motivo de força maior e com permissão

- Dispositivo antirradar

- Sem qualquer uma das placas de identificação ou que estejam ilegíveis

- Que não esteja licenciado

- Cor ou característica alterada

- Sem ter sido submetido à inspeção de segurança veicular, quando obrigatória

- Equipamento obrigatório ineficiente ou inoperante, ou sem ele

- Equipamento obrigatório em desacordo com o estabelecido pelo Contran

- Descarga (escapamento) livre

- Silenciador de motor defeituoso, deficiente ou inoperante

- Equipamento ou acessório proibido

- Iluminação alterada

- Adesivo no para-brisa

- Películas irregulares nos vidros

- Em mau estado de conservação

- Pneus lisos

Também pode multar:

- Quem é flagrado pelo bafômetro com quantidade de álcool de 0,05 mg/l até 0,33 mg/l (miligrama por litro de ar alveolar)

- Quem usa alarme indevidamente ou que produz som ou ruído que perturbe o ambiente

- Quem usa som com volume alto ou frequências não autorizadas

- Quem está com a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) vencida

- Quem não licenciou o veículo

- Quem é flagrado sem lentes corretivas e é obrigado a usá-las

Fonte: CTB (Código de Trânsito Brasileiro)