Justiça condena patrões a pagarem R$ 2 milhões à família do menino Miguel
RECIFE, PE (FOLHAPRESS) - Um juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região condenou os ex-patrões da mãe do menino Miguel, que morreu ao cair do nono andar de um prédio de luxo no Recife em 2020, a indenizar a família da vítima. A decisão foi proferida dia 6 de setembro.
Foram condenados o ex-prefeito de Tamandaré Sergio Hacker (PSB) e esposa dele, Sarí Corte Real. A indenização estabelecida é no valor de R$ 2 milhões. A defesa do casal disse que vai recorrer da decisão.
A Justiça estabeleceu que a cifra milionária deve ser repassada à mãe de Miguel, Mirtes Renata Santana, e a Marta Maria, avó do garoto, por danos morais. As duas trabalhavam no apartamento da família Corte Real, mas o salário era pago com dinheiro da prefeitura de Tamandaré, no litoral sul de Pernambuco.
O juiz do trabalho João Carlos de Andrade e Silva entendeu que "os empregadores, ao permitirem que os filhos de seus empregados se dirijam aos locais de trabalho, assumem os riscos de eventuais danos ocorridos a eles".
"Lugar de criança não é no ambiente de trabalho dos pais, devendo os empregadores, a todo custo, impedir tal prática", escreveu o juiz.
"Dos vídeos e fotos juntados, no entanto, verifica-se que Sari permitiu não só a presença de Miguel, mas que a sua mãe se afastasse dele, atraindo para si a responsabilidade pelos cuidados da criança. Desta forma, ao permitir que Miguel saísse de casa e utilizasse o elevador sem a sua presença, a Sra. Sari assumiu os riscos de eventuais fatos que viessem a acontecer com Miguel, já que estava sob sua proteção, e assim responsável pela morte da criança que veio a ocorrer", diz a sentença.
Para o juiz, ainda "é nítido que a morte de Miguel decorreu diretamente dos atos ilícitos dos réus de permitirem a presença da criança no ambiente de trabalho e de não agirem da forma esperada na sua proteção".
O juiz negou, em outro trecho, pedido da família de Miguel para indenização por terem sido enquadradas como funcionárias da Prefeitura de Tamandaré.
O Ministério Público argumentou que a mãe e a avó de Miguel eram "partes vulneráveis na relação empregado/empregador, pelo que não seria razoável exigir-se de uma pessoa humilde, que necessita do trabalho para sobreviver, recusar a oferta. Além de existir uma certa naturalização da prática".
Entretanto, o juiz discordou. "A fraude perpetrada por gestores na utilização de servidores públicos como empregados particulares não se limita ao gestor, mas também àquele que fornece os seus serviços, sendo partícipe na fraude, não podendo ser beneficiado pelos atos praticados, sob pena de desvirtuamento da ordem jurídica e grave afronta à coletividade".
O juiz ainda disse que "em nenhum momento as reclamantes foram enganadas, tanto é que afirmaram que o réu quando passou para prefeito disse que iriam as autoras receber pela prefeitura, e assinaram um contrato, ou seja, estavam cientes da fraude que estavam realizando e sequer (por mais de três
anos) fizeram qualquer denúncia ao Ministério Público".
Já a advogada Karla Cavalcanti, que defende a família de Miguel, vê a medida como socioeducativa. "Jamais [a condenação] servirá de compensação por toda a perda sofrida pelas autoras. Não se pode esquecer que nenhuma decisão ou valor monetário substituirá a vida que Miguel teria no aconchego de sua família", afirma.
No dia 28 de junho, o TST (Tribunal Superior do Trabalho) condenou o ex-prefeito de Tamandaré e Sarí Corte Real ao pagamento de R$ 386 mil de indenização por danos morais coletivos.
Na esfera criminal, a Justiça condenou Sarí a oito anos e seis meses de prisão por abandono de incapaz com resultado em morte. A ex-primeira-dama de Tamandaré estava responsável pelo menino quando ele caiu do prédio. Ela responde o processo em liberdade.