Homem da Meia-Noite fará homenagem aos povos originários no Carnaval de Olinda
RECIFE, PE (FOLHAPRESS) - O calunga mais famoso do Carnaval de Olinda vai homenagear os povos originários no desfile de 2024. Os três metros e meio do Homem da Meia-Noite vão reverenciar os indígenas em um cortejo que promete resgatar tradições dos antigos carnavais, com o tema "Terra Indígena".
O desfile do Homem da Meia-Noite acontece nas ruas do largo do Bonsucesso, um dos epicentros do carnaval de Olinda. As ruas ficam lotadas horas antes da saída do boneco gigante da sua sede, uma casa em frente à histórica Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos.
Quando o relógio se aproxima da meia-noite, a ansiedade aumenta, e exatamente na virada do sábado para o domingo de Carnaval (do dia 10 para o dia 11 de fevereiro neste ano) a euforia toma conta das milhares de pessoas com o início do cortejo, sob fogos de artifício.
Além dos indígenas, serão homenageados o cantor Marron Brasileiro, que fará a contagem regressiva para o desfile neste ano, e o Caboclinho 7 Flechas. O Caboclinho, que desde 1971 representa as tradições indígenas na folia, vai se apresentar na praça do Rosário, em frente à sede do Clube de Alegoria e Crítica Homem da Meia-Noite, antes do desfile.
Novamente a roupa da alegoria do Homem da Meia-Noite é cercada de mistério. O traje contempla sempre as cores tradicionais do calunga, verde e branco, mas com detalhes novos a cada Carnaval.
"A tradição precisa caminhar junto com a modernidade, que precisa existir, e as mudanças são naturais. Mantemos o fraque com gravata borboleta, o dente de ouro, a cartola e a saída à meia-noite", afirma o presidente do clube, Luiz Adolpho.
O calunga mais famoso do Carnaval de Pernambuco é Patrimônio Vivo do estado desde 2006.
O Homem da Meia-Noite foi criado em 1932 e no início tinha apenas estandarte. Depois, desfilou com boneco gigante até 1949, e por causa de problemas financeiros não houve cortejo de 1950 a 1953. O retorno aconteceu em 1954, com apoio da Prefeitura de Olinda, e novas interrupções só aconteceram depois em razão da pandemia de Covid-19, em 2021 e 2022.
Neste ano, a responsável pela confecção do traje é a estilista Dayana Molina, que mora em São Paulo, mas tem família com origem em Pernambuco. A avó materna de Dayana faz parte da comunidade indígena Fulni-ô, que habita o município de Águas Belas, no sertão pernambucano, a 273 km do Recife. Este é o primeiro trabalho da estilista para um bloco do estado.
"Isso tem uma simbologia muito grande para mim, como mulher indígena. Onde existe povo originário existe mais vida e cultura. No Nordeste, há muitos povos originários que resistiram ao processo colonial. E fazer essa homenagem, para mim, é um processo de resistência, é reafirmar que o Carnaval pernambucano é lírico, poético e civilizado", afirma Dayana, que também trabalha com ativismo ambiental.
A estilista antecipa que a roupa do Homem da Meia-Noite não vai lembrar diretamente características dos indígenas. "Acredito que precisamos quebrar estereótipos do que é olhar para uma roupa e ver povos originários ali. A expressão vai muito no viés de referência cultural."
Uma semana antes do desfile, o boneco do Homem da Meia-Noite, ainda sem as novidades de 2024, foi até Pesqueira, no agreste pernambucano, a 215 km do Recife, para receber a roupa nova.
O traje foi entregue pelo povo Xukuru, um dos homenageados deste Carnaval. A entrega aconteceu na aldeia Pedra D'água, dentro da terra indígena, com a presença e a participação de grupos culturais da região. Ao todo, 10 mil pessoas do povo Xukuru habitam um conjunto de montanhas de Pesqueira conhecido como Serra do Ororubá.
O cortejo do Homem da Meia-Noite mobiliza cerca de 500 pessoas, entre seguranças, carregadores, passistas, integrantes de orquestras, cantores e membros do clube. Durante o desfile, cinco pessoas carregam alternadamente o boneco gigante de 49,5 kg e 3,5 metros de altura. Todos os condutores passam por exames médicos de forma antecipada, segundo os organizadores.
O planejamento do bloco começa em meados do ano anterior. "Já estamos com os temas de 2025 e 2026 prontos", afirma Adolpho.
Para ajudar na arrecadação, a organização do Homem da Meia-Noite lançou uma camisa oficial para o Carnaval 2024. Criada pelo artista plástico Antônio Mendes, leva os traços do artista com cores e elementos que remetem ao tema "Terra Indígena" e é vendida por R$ 50 na sede do clube e no Shopping Patteo, em Olinda.