Ministra da Gestão defende bancas de heteroidentificação do CNU
A ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, defendeu nesta quarta-feira (5) o trabalho das bancas de heteroidentificação do Concurso Público Nacional Unificado (CNU), estabelecidas pela Fundação Cesgranrio, organizadora do certame. “O que a gente usou no CNU foi o que é mais avançado no tema.” A declaração foi dada após entrevista ao programa Bom Dia, Ministra, produzido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC).
É papel das bancas de heteroidentificação de concursos públicos verificar, presencialmente, as características fenotípicas de candidatos autodeclarados pretos e pardos (negros) que concorrem a vagas reservadas a cotas raciais previstas na Lei nº 12.990/2014.
A ministra frisou que as comissões de heteroidentificação são um avanço na política de cotas raciais no Brasil e que, antes da criação delas, havia muito questionamento a respeito de pessoas que se autodeclaravam negras e não se enquadravam como pretos ou pardos. “Houve um avanço ao criar as bancas de heteroidentificação.”
Na última semana, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao Ministério da Gestão e à Fundação Cesgranrio a suspensão da divulgação dos resultados finais do certame até “a resolução de irregularidades nas cotas raciais previstas em lei”, como classificou o MPF. A Defensoria Pública da União (DPU) também solicitou esclarecimentos ao MGI sobre possíveis irregularidades na etapa de heteroidentificação do concurso.
De acordo com a ministra, cerca de 46 mil pessoas autodeclaradas negras passaram pelas bancas de heteroidentificação distribuídas nas cidades participantes do certame e a maioria destes candidatos foi aprovada na banca. Entre os candidatos reprovados nas bancas e que entraram com recurso administrativos, 45% deles tiveram o pedido deferido. “Isso não é uma avaliação da pessoa. É, sim, uma tentativa de garantir que a política de cotas seja o mais correta possível.”
Explicações
A ministra confirmou que já respondeu ao Ministério Público Federal sobre a necessidade de manter a divulgação dos resultados e realizou várias reuniões com o MPF e a Defensoria Pública para esclarecer os procedimentos das bancas de heteroidentificação.
Sobre a recomendação de permitir o acesso dos candidatos aos pareceres e às decisões de indeferimento, Esther Dweck explicou que a banca não é um tribunal racial e não existe métrica para dizer se alguém é negro ou não apenas pelo cabelo e cor de pele. “A gente voltaria ao século XIX se tivesse esse laudo. A lógica sempre foi o olhar social do racismo que existe na sociedade brasileira”.
A ministra apontou que mais de 3 mil pessoas foram contratadas para formar as bancas do CNU, e que todas tiveram formação para isso. Os currículos foram publicados na internet, conforme previsto nos editais dos oito blocos temáticos no CNU. “A gente conversou com vários especialistas para montar essa lógica do certame”, disse Dweck.
A ministra voltou a declarar que o chamado Enem dos Concursos teve um dos maiores percentuais de pessoas negras aprovadas [24,5% do total], preenchendo todas as vagas destinadas às cotas do CNU.
Para ela, a política foi bem feita. “A gente mudou a forma de aplicação das cotas, que não são mais um teto. São um piso”. Ou seja, candidatos que concorrem por cotas e que alcançam nota para aprovação pela ampla concorrência mudam de sistema e abrem vaga para outros cotistas.
Aprimoramento
A historiadora Wania Sant’Anna, integrante da Coalizão Negra por Direitos e do conselho do Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (Cedra), comemora o aumento do percentual de candidatos negros aprovados no CNU, mas considera que é preciso aprimorar os processos de heteroidentificação. “Não é razoável que os candidatos autodeclarados pretos e pardos tenham dúvidas sobre os procedimentos adotados pelas bancas de heteroidentificação e seus resultados", ressalta Wania.
“Não vejo nenhum impedimento legal na formação, por exemplo, de uma comissão ad hoc [temporária] para conduzir esses casos e, desta forma, apresentar uma solução transparente e eficiente às reclamações apresentadas.”
Já para o professor universitário e membro do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade de Brasília (UnB), Nelson Inocêncio, os maiores problemas são a forma de constituição das bancas e o curso de formação dos integrantes das comissões, com questionamentos sobre sua carga horária e conteúdo.