Ministros de Bolsonaro viajam e adotam agenda discreta na reta final do governo
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) chega à reta final em um clima de abandono que não se restringe ao isolamento do próprio chefe do Executivo de suas atividades.
As agendas da Esplanada dos Ministérios mostram titulares de férias ou afastados, sem compromissos oficiais ou aproveitando os dias derradeiros de mandato para as últimas viagens internacionais.
Após a derrota no segundo turno das eleições, Bolsonaro adotou uma postura mais reclusa, com poucas idas ao Palácio do Planalto e declarações públicas. O silêncio foi quebrado na sexta-feira (9), com uma fala dúbia em Brasília em que ele atiçou apoiadores às vésperas da diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Desde o segundo turno, o atual mandatário passou a despachar e receber alguns ministros no Palácio da Alvorada. A maioria de suas poucas aparições públicas foi em solenidades militares, incluindo um evento da Marinha no Rio neste sábado (10), no qual manteve silêncio. Ele também foi a um jantar de seu partido, o PL.
Na mesma linha, a maior parte dos ministros que compõem o seu governo tiveram agendas esvaziadas ou se afastaram temporariamente do trabalho.
Estiveram de férias ou gozaram momentos de afastamento desde o segundo turno os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), Marcelo Sampaio (Infraestrutura), Daniel Ferreira (Desenvolvimento Regional), Victor Godoy (Educação) e Ronaldo Vieira Bento (Cidadania).
Os três últimos assumiram os cargos há pouco mais de seis meses, em substituição aos titulares que deixaram ministérios para disputarem as eleições de outubro deste ano.
A assessoria de Daniel Ferreira informou que ele estava de férias entre os dias 1º e 19 de novembro. Os demais não explicaram os motivos do afastamento até a publicação desta reportagem.
O ministro da Cidadania, Ronaldo Vieira Bento, por sua vez, praticamente encerrou a sua gestão ao se afastar das atividades na quinta-feira (8), sendo substituído pelo chefe da assessoria especial de Assuntos Estratégicos da pasta, Mauro Barreto Borges.
O titular teria retorno previsto para o dia 30 deste mês, uma sexta-feira, mas Bolsonaro autorizou novo período de descanso para o ministro entre 30 de dezembro e 28 de janeiro.
A ausência do ministro em dezembro vai acontecer justamente no momento em que o gabinete de transição questiona o atual governo, em particular a pasta da Cidadania, por suposto abuso de poder econômico ao incluir indevidamente, às vésperas de eleição, beneficiários no programa Auxílio Brasil.
A equipe de Lula promete acionar Bolsonaro em diversas instâncias e órgãos de fiscalização, como Ministério Público, Tribunal de Contas da União e CGU (Controladoria-Geral da União).
Bento não será o único com férias autorizadas por Bolsonaro para o período após a posse de Lula. O titular da Educação, Victor Godoy, também deveria ficar fora de suas atividades entre os dias 1º e 6 de janeiro, segundo ato publicado no Diário Oficial da União.
Marcelo Sampaio, da Infraestrutura, estará de férias de 29 de dezembro a 27 de janeiro. O chanceler Carlos França também terá férias entre os dias 31 de dezembro e 29 de janeiro.
Outros titulares da Esplanada dos Ministérios tiveram poucos compromissos oficiais nas últimas semanas ou não divulgaram o conteúdo de suas agendas oficiais. Substituta de Damares Alves no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, Cristiane Britto teve apenas seis dias de trabalho com compromissos oficiais desde o segundo turno das eleições, em 30 de outubro.
Próximo a Bolsonaro, o ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), general Augusto Heleno, também teve raros dias com compromissos oficiais desde que o atual mandatário foi derrotado nas eleições, mantendo apenas duas reuniões e participando de três eventos.
Heleno, no entanto, diz que o novo sistema de divulgação de agendas do governo federal não mostra toda a sua atuação nesse período, embora reconheça que não houve "agendas e eventos externos passíveis de publicação".
"Desde a data mencionada, foi implantado, sob coordenação da CGU, o Sistema e-Agendas. Essa nova ferramenta tem como prioridade de publicação audiências e eventos voltados para o público externo. Assim sendo, por exemplo, despachos internos, reuniões de trabalho e outras atividades específicas do GSI foram suprimidas da agenda de servidores, cumprindo orientação recebida. Por fim, não houve agendas e eventos externos passíveis de publicação", informou o GSI em nota.
O novo sistema, implementado pela CGU, não impede publicações de reuniões internas de trabalho, como mostra a agenda de outros colegas de Esplanada. A agenda de Heleno omite ainda cerimônias militares públicas de que participou ao lado de Bolsonaro no último mês.
Esses eventos aparecem na de Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria-Geral. O ministro, contudo, tampouco teve compromissos --ou deu publicidade a eles. Foram 22 dias úteis sem agenda.
Outros ministros seguem divulgando as reuniões de trabalho com integrantes de suas respectivas equipes.
Na contramão de alguns de seus colegas, o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovações, Paulo Cesar Alvim, manteve compromissos em sua agenda oficial em todos os dias úteis, desde o fim de outubro. Foram reuniões com a equipe de seu ministério e entidades não governamentais, palestras, inaugurações de laboratórios e viagens para locais como Salvador, Ijuí (RS) e Boa Vista.
Paulo Guedes, da Economia, é outro titular da Esplanada que manteve uma agenda cheia.
Os últimos meses também foram marcados por uma série de viagens de ministros ao exterior.
O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, por exemplo, foi para o Egito participar da COP27 (Cúpula do Clima das Nações Unidas) e aproveitou a ida ao país da África para visitar pontos turísticos. Ele foi até um espaço de prática de mergulho para ver corais da costa do mar Vermelho.
O chefe da pasta da Infraestrutura, por sua vez, fez uma viagem à Espanha para visitar portos daquele país.
Já Godoy tinha uma viagem institucional marcada para Paris, mas desistiu devido à polêmica dos cortes orçamentários no MEC (Ministério da Educação).