Pastor novato na política quer defender pauta conservadora

Por PAULA SOPRANA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Estreante na política, sem canal gospel no YouTube ou fama de digital influencer, o pastor Oséias de Madureira (PSD) foi o 29º deputado estadual mais votado dos 94 parlamentares que assumiram a Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) no dia 15.

O partido de Gilberto Kassab destinou R$ 500 mil para a campanha do pastor, cifra equiparável ou maior que a de algumas das campanhas mais bem votadas na direita, como de Tomé Abduch (Republicanos), Tenente Coimbra (PL) e Bruno Zambelli (PL) ?este desfrutou da popularidade do sobrenome, é irmão de Carla.

Mas os 137,2 mil votos em Oséias representam a força da mobilização evangélica, em especial do poderoso Ministério de Madureira, uma ramificação da Assembleia de Deus.

Oséias é obra política do bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus do Brás. Embora ele tenha investido simbólicos R$ 2.500 na campanha do pastor, é o principal responsável por essa candidatura e por todas as que vieram antes. Desde 2010, a Madureira emplaca um representante na Alesp.

Samuel Ferreira é influente na elite evangélica. Filho do ex-deputado federal Manoel Ferreira, que fundou a Convenção Nacional das Assembleias de Deus no Brasil, tem trânsito em Brasília e página de adoradores no Instagram. Estava presente no grupo que celebrou com Michelle Bolsonaro a aprovação da nomeação de André Mendonça ao STF (Supremo Tribunal Federal). "Glória a Deus", festejaram após a escolha do ministro indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Ferreira foi cabo eleitoral Bolsonaro em 2022, da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2014, aliado do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ) e, recentemente, apoiador da reeleição de Arthur Lira (PP-AL). Chegou a dizer que em suas igrejas só se falaria de Jesus e de Lira.

Oséias conta que foi determinação de Ferreira a escolha de seu nome para a Alesp. "Viram em mim o nome oportuno para a indicação como candidato estadual."

O pastor de 49 anos, natural de Mogi das Cruzes, é um homem discreto fora do púlpito. Afirma que nunca teve aspiração política, mas que entendeu um pouco da atividade ao se envolver nas campanhas da igreja, como a de Cezinha de Madureira (PSD-SP), reeleito deputado federal e ex-líder da bancada evangélica.

Oséias encara seu mandato como um instrumento de Deus dado a ele por quatro anos "para servir à igreja, mas também a São Paulo". Lembra que foi num domingo à tarde que recebeu um convite inesperado do bispo para comparecer à igreja. Dirigiu-se ao local com a mulher, a pastora Silvana Santos, pensando que poderia ser transferido para outra cidade. A família, formada pelo casal e dois filhos, aceitaria a ordem que fosse

"Naquele dia, após o culto, o bispo [Ferreira] falou: ?orei a Deus e seu nome tem ardido no meu coração, a convenção está apoiando o seu nome. Eu queria te convidar para ser o candidato oficial da igreja?", disse Oséias ao Fuxico Gospel, um site de cobertura evangélica.

Fora do altar ?onde prega com intensidade e eleva o tom de voz quando "sente a presença de Deus ?, fala pausado, sem exaltações. Diz que é o estilo sóbrio que deve levar à Assembleia. "Tenho sido cauteloso. Não vou com sede ao pote para não ser precipitado."

A maior parte de suas memórias está ligada à religião. Ele brinca que foi praticamente parido na igreja e que fingia batizar os irmãos. Vem de uma família crente, mas foi o primeiro a seguir a linha ministerial.

Oséias fez o curso de teologia na Escola das Assembleias de Deus e já pastoreou em seis igrejas nas zonas leste e norte de São Paulo. Presidiu a Assembleia de Deus Madureira no município de Sumaré e hoje é pastor na AD Brás São Bernardo do Campo.

Como deputado, pretende manter cultos aos domingos ou segundas à noite. Sua principal missão é defender os interesses da igreja e ser uma peça importante no xadrez da Alesp quando a discussão envolver a pauta de costumes. Diz que "cada ação terá uma reação" e que combaterá projetos que "ameacem os valores cristãos".

O pastor evita ao máximo criticar opositores, aliados, Tarcísio, Lula ou Bolsonaro. Também afirma que seu primeiro projeto de lei é segredo. Só demonstra muita convicção quando a pauta é "o princípio bíblico da família", basicamente o conceito de família tradicional

"Vou defender o princípio bíblico, que é extremamente contra, pelo que acreditamos, o casamento homossexual. Mas vou respeitar, sem agredir." Diz que não pretende apresentar projetos sobre o tema, a não ser que precise reagir a forças progressistas.

"Não sou contra homossexuais, mas contra a homossexualidade, entende?", tenta explicar. Acrescenta que jamais expulsaria gays da igreja, por exemplo, mas que não "compactua com ações homossexuais". Afirma, depois, que todos são bem-vindos na igreja.

Embora a visão cristã conflua com a de Bolsonaro, o pastor não pretende atacar minorias, como estrategicamente fazem parlamentares da extrema direita. "Acho que tem como você defender suas convicções sem ser deselegante ou agressivo."

Ele acha que o comportamento de Bolsonaro pode ter comprometido sua reeleição. "Talvez ele não tenha falado como deveria, isso gerou muito desconforto, mas eu defendo que foi um governo digno de ser aplaudido e respeitado. Votei e apoiei ele, como todo o segmento evangélico", diz.

"Sempre lembrando que eu respeito a esquerda. O Lula está aí no governo e precisa ser respeitado", completa.

Mesmo que evite expor o que pensa politicamente para não se comprometer, ele já deixou transparecer alguns julgamentos.

"É uma pergunta difícil de responder, mas como líder posso dizer que é preciso estar ao lado dos liderados na vitória ou na derrota", afirmou ao jornalista do Fuxico Gospel quando foi questionado sobre o que achava de Bolsonaro ir para os EUA após perder para Lula.

"A igreja ajudaria muito mais se fosse para o joelho pedir misericórdia do que para a frente de um quartel. Não me levem a mal", afirmou em outro momento, referindo-se aos pastores que influenciavam fiéis nos acampamentos bolsonaristas.

Em outra ocasião, também defendeu que o porte de armas deve ser muito restritivo.

A alguns dias da posse, Oséias estava mapeando outros deputados para fortalecer a bancada evangélica paulista.

"Não sou daqueles que vai bater na Igreja Universal. Acho que a gente pode convergir para uma visão de unidade e engrossar o caldo dessa frente", diz. No seu cálculo preliminar, são mais de 20 colegas.

Oséias não indica seu plano futuro na política, mas é cercado de líderes ambiciosos. Em uma live logo depois da eleição, o ex-deputado estadual e colega da Madureira Dilmo dos Santos dirigiu a palavra a Cezinha e Oséias: "Parabéns aos candidatos, que são somente escolhas momentâneas, já passei por isso", afirmou. Todos riram. "São mais quatro anos e daqui a pouco os projetos serão maiores."

O poderoso Samuel Ferreira, também presente, pediu a palavra. "Só vou dizer algo a vocês: meus sonhos não terminaram, são monstruosos. Perto do que estamos vivendo, dá até medo de falar", disse, sem mais detalhes.