Bolsonaro sofre 1ª grande derrota na oposição ao medir forças com Lira e Tarcísio

Por RANIER BRAGON E MARIANNA HOLANDA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A acachapante aprovação da reforma tributária na Câmara na noite desta quinta-feira (6) representou a primeira grande derrota de Jair Bolsonaro (PL) como líder da oposição, em um cenário em que mediu forças contra dois principais aliados quando presidente: Arthur Lira (PP-AL) e Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O texto foi aprovado em dois turnos, sendo 382 votos a favor na primeira etapa de votação e 375 na segunda, incluindo 20 do próprio PL.

Desde que foi derrotado por Lula (PT) em outubro do ano passado, o ex-presidente passou por momentos de recolhimento e depressão durante a transição, partiu no final de dezembro para uma viagem aos EUA que durou 89 dias e, no último dia 30, acabou se tornando inelegível até 2030 por decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Em toda a sua carreira política, que se iniciou no final dos anos 80, como vereador no Rio de Janeiro, Bolsonaro sempre esteve alheio às grandes articulações partidárias, mesmo quando foi eleito presidente da República.

Sua vitória, em 2018, se deu pelo então nanico PSL, em um cenário de antipolítica e de direita que varreu os candidatos bancados pelos grandes partidos.

Bolsonaro logo rompeu com a sigla (hoje União Brasil, fruto da fusão com o DEM) e tentou montar sua própria, a Aliança pelo Brasil, mas o projeto acabou em fracasso.

Durante seu governo, o presidente também falhou na tentativa de montagem de uma base de apoio no Congresso formada pela articulação com as frentes parlamentares, não com os partidos.

Ele só conseguiu uma base de apoio sólida quando se aliou ao centrão de Lira, em 2020, e pavimentou o caminho que levaria o deputado à presidência da Câmara, em 2021.

Na discussão da atual reforma tributária, o ex-mandatário rechaçou inteiramente o texto e defendeu, ao menos, o adiamento para ampliar as discussões.

Mais ainda, Bolsonaro elegeu a pauta como prioritária no embate político com o governo Lula. Soltou duas notas públicas contra o texto, reuniu parlamentares e batalhou para que o partido se posicionasse contra o texto.

O primeiro comunicado chamava a proposta de "reforma do PT" e dizia que era um "verdadeiro soco no estômago dos mais pobres". No segundo, disse que Lula se reúne com o Foro de São Paulo e não pode apoiar o PT em nada.

"Nos roubar a liberdade e nos escravizar é sua meta. Do exposto, a todos aqueles que se elegeram com nossas bandeiras de 'Deus, Pátria, Família e Liberdade', peço que votem contra a PEC da Reforma Tributária", afirmou.

Na votação, os 20 deputados do PL que não seguiram a recomendação do ex-presidente vem, na maior parte, do Nordeste e integram o centrão, não o chamado "bolsonarismo raiz".

A pressão do ex-presidente, embora não tenha surtido o efeito de levar o PL em bloco contra a reforma, diminuiu o número que o próprio presidente do partido, Valdemar Costa Neto, avaliava que apoiaria a proposta: cerca de 30 parlamentares.

Apesar do resultado, aliados rechaçam a pecha de derrota: dizem que Bolsonaro se propôs a fazer oposição ao texto e se recolocar no cenário político, na semana seguinte à sua declaração de inelegibilidade, o que representaria um sinal de que ele não pretende abandonar a arena política.

Além disso, pontuam, a reforma foi encabeçada por Lira.

O presidente da Câmara chegou a dizer nesta quinta que mandou mensagem sobre o tema para Bolsonaro, mas disse não ter tido resposta até o final da tarde.

Fato é que a reforma tributária rachou a direita pela primeira vez desde que o ex-presidente deixou o Planalto, colocando, nesse caso, Bolsonaro e Tarcísio em campos opostos.

O governador de São Paulo tem sido frequentemente apontado como herdeiro do bolsonarismo, em decorrência da inelegibilidade do ex-presidente.

Tarcísio teve uma reunião com o ex-presidente na manhã de quinta para tentar convencê-lo a mudar de ideia e, segundo relatos, Bolsonaro ficou magoado com o aliado, embora tenha dito que entende o posicionamento do seu ex-ministro, por ser governador hoje.

O ponto alto da tensão ocorreu na reunião interna do partido, quando Tarcísio tentou "virar votos" e foi hostilizado, mal conseguindo falar no trecho gravado que acabou vindo a público.

Bolsonaro chegou a interromper o discurso de Tarcísio, quando seu ex-ministro defendia a participação da direita na reforma tributária, afirmando que "se o PL estiver unido, não aprova nada" ?nessa hora, ele recebeu aplausos de seus correligionários.

O ex-ministro e deputado federal Ricardo Salles (SP) chegou a dizer que Tarcísio não representaria a direita. Na mesma esteira, o governador acabou virando alvo da artilharia bolsonarista.

Apesar do estremecimento, Tarcísio e Bolsonaro chegaram a se falar de novo e a situação já estava mais tranquila, segundo disseram aliados na noite desta quinta.

Valdemar Costa Neto também procurou minimizar o atrito entre o governador e o ex-presidente. "O Bolsonaro gosta muito do Tarcísio, e o Tarcísio fez um favor para nós de ter ido para reunião que ele não tinha programado", disse à reportagem.