Candidato pela Câmara a órgão do Ministério Público doou R$ 1 milhão a políticos

Por JOSÉ MARQUES

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Cotado para integrar o órgão que fiscaliza o Ministério Público na vaga destinada à Câmara dos Deputados, o advogado baiano Edvaldo Nilo de Almeida gastou mais de R$ 1 milhão do próprio bolso em doações para candidatos ao Legislativo em 2022.

Além disso, seu sócio Alexandre Vicente de Almeida também doou quase R$ 800 mil a campanhas de parlamentares no mesmo ano.

São os líderes da Câmara que indicam os candidatos a essa vaga no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) ao presidente Arthur Lira (PP-AL). Depois, os deputados elegem um dos concorrentes por meio de voto secreto.

A votação para o CNMP deve acontecer em conjunto com a do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), em agosto. A candidatura ao órgão de Justiça, porém, já está definida: será a chefe de gabinete do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli, Daiane Nogueira de Lira.

Atualmente, o representante da Câmara no CNMP é o advogado Otávio Rodrigues, que tenta se viabilizar ao STJ (Superior Tribunal de Justiça).

O CNMP cuida da fiscalização administrativa, financeira e disciplinar do Ministério Público e de seus integrantes. O conselho tem inclusive o poder de aplicar a pena de demissão de procuradores.

Não é a primeira vez que Edvaldo Nilo, vindo de uma família de políticos, doa para candidatos em eleições, mas em 2022 ele multiplicou os desembolsos em relação aos anos anteriores.

Foram R$ 1.049.000 distribuídos a 19 candidatos de legendas como PT, PL, Republicanos, União Brasil, MDB, PSD, PSB e PSDB. Nas eleições de 2020, ele doou apenas R$ 50 mil a um candidato, e na de 2018, R$ 150 mil a três.

A multiplicação nos valores destinados a campanhas aconteceu após Nilo ter concorrido à vaga do CNMP relativa ao Senado, e ter sido derrotado.

Em 2020, ele foi indicado ao cargo pelo senador Ciro Nogueira (PP-PI) e outros 13 líderes à época. Acabou perdendo para Engels Augusto Muniz, ex-chefe de gabinete da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República de 2016 a 2018, na gestão Michel Temer (MDB).

Do total de mais de R$ 1 milhão que tirou do bolso, quem mais recebeu foi seu tio, o deputado federal Marcelo Nilo (Republicanos-BA), com R$ 200 mil.

Outro deputado baiano e um dos parlamentares mais influentes da Câmara, Elmar Nascimento (União Brasil-BA), ficou com R$ 150 mil. A petista Ana Paula Lima (SC) recebeu R$ 123 mil e o bolsonarista Hélio Lopes (PL-RJ), R$ 63 mil.

Abaixo desses quatro deputados, todos eleitos, estão o candidato derrotado a senador Antonio Carlos Valadares Filho (PSB-SE), e outros seis candidatos a deputado federal e oito a estadual ?uma parte não se elegeu.

Seu sócio, Alexandre Almeida, doou mais R$ 520 mil a Marcelo Nilo e mais R$ 260 mil a dois candidatos a deputado, na Bahia e no Piauí.

Em 2020, Edvaldo Nilo gastou apenas R$ 50 mil com um candidato a vereador.

Já em 2018 foram R$ 150 mil divididos entre o então candidato a presidente pelo Novo, João Amoêdo, o candidato a senador pelo MDB de São Paulo Marcelo Barbieri e a então candidata a deputada federal pelo PTB paulista Marlene Machado. Todos saíram derrotados.

Além de ser advogado privado, Edvaldo Nilo é concursado como procurador do Distrito Federal ?ou seja, faz a representação jurídica do governo.

A candidatura dele foi alvo de outros questionamentos nos últimos meses, como foi publicado no site Metrópoles. Foram abertas investigações sobre ele em 2017 após denúncias feitas à ouvidoria do Ministério Público da Bahia sobre suposta atuação irregular na representação jurídica de municípios.

Nilo diz que as investigações se tratam de fatos que aconteceram há oito anos, que ele nunca foi intimado a esclarecer qualquer coisa e que são apenas acusações vazias de que ele não teria notória especialização para atuar nos municípios.

"Mas o autor da denúncia é um concorrente que se declara o único detentor da notória especialização", diz ele.

Além disso, um dos associados do escritório de Nilo é o advogado e ex-juiz do TRE-BA (Tribunal Regional Eleitoral da Bahia) Rui Barata. Eles atuaram juntos em processos.

Barata é filho de uma desembargadora presa na Faroeste, maior operação sobre vendas de decisões judiciais do país, e foi denunciado em 2021 pelo Ministério Público Federal sob acusação de integrar organização criminosa.

Ele é citado como um operador do esquema tanto na delação do advogado Júlio Cavalcanti como no da desembargadora Sandra Inês Rusciolelli.

Nilo afirma que não atuou com Rui Barata em processos na Justiça estadual da Bahia, onde ocorreram as suspeitas de irregularidades relacionadas à Faroeste.

Procurado, Rui Barata afirma que atuou "em conjunto em alguns processos na Justiça de Brasília, de forma ética, moral e justa".

"Ademais, reafirmo que não respondo a ação de qualquer operação e desconheço que o professor Edvaldo Nilo responda. Para mim, trata-se de um profissional com currículo exemplar e notória especialização nas áreas que atuamos."

Questionado pela reportagem, Nilo afirmou ainda que, em relação às doações, sempre foi um ativista político. "Entendo que a política na democracia é que pode mudar a sociedade. Sempre fui filiado a partido e quase cheguei a ser candidato a cargo parlamentar 20 anos atrás, mas acabei sendo aprovado em todos os concursos públicos que fiz e fui para outro caminho."

Disse também que admira muito os parlamentares e acredita "nas pessoas". "Em todas as eleições em que me foi possível fazer contribuições, o fiz dentro dos limites legais", diz, acrescentando que é a sétima eleição seguida que contribui com candidatos.

Além de Nilo, concorrem ao CNMP a ex-integrante do CNJ Maria Tereza Uille Gomes e a advogada Ana Luisa Marcondes.