Advogado diz que Cid não incriminou Bolsonaro, e ex-presidente compartilha fala

Por MARIANNA HOLANDA

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O advogado do tenente-coronel Mauro Cid, Cezar Bittencourt, disse que o ex-ajudante de ordens "assumiu tudo" e não incriminou Jair Bolsonaro (PL) à Polícia Federal no caso das joias.

Cid prestou depoimento de dez horas na quinta-feira (31) devido à investigação sobre os presentes recebidos de países árabes pelo ex-mandatário.

Além de Cid, o pai dele, General Lourena Cid, o assessor Osmar Crivelatti e o advogado Frederick Wassef também deram declarações à PF, diferentemente de Bolsonaro, Michelle e outros dois assessores, que foram intimados, mas decidiram silenciar.

"Estão colocando palavras que não tem no Cid. Acusações ao Bolsonaro que não existem. E mais, esse problema se falou das joias, da recompra das joias, o Cid assumiu tudo", disse Cezar Bittencourt, em áudio enviado à GloboNews e ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso.

"Não colocou Bolsonaro em nada. Não tem nenhuma acusação em corrupção, envolvimento, suspeita de Bolsonaro. A defesa não tá jogando Cid contra o Bolsonaro", completou o advogado.

A fala circulou entre aliados do ex-presidente, e foi compartilhada por ele para seus contatos no WhatsApp. Interlocutores do ex-chefe do Executivo dizem que, desde que Cid foi preso, em maio, os dois não se falam.

"O dinheiro que o Cid pegava para pagar as contas do presidente, então ex-presidente, era os R$ 50 mil que parece que era o que ele ganhava, e os R$ 20 mil da aposentadoria. Era esse dinheiro que ele recebia. Dinheiro que ele ia pagando, porque ele não gosta de cartão de crédito, não tem cartão de crédito. Mas não tem nada além disso", disse ainda o advogado.

Dados enviados pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) à CPI do 8 de janeiro, que investiga os ataques golpistas às sedes dos três Poderes, apontou "movimentações atípicas" e "incompatíveis", além de "indícios de lavagem de dinheiro", nas contas bancárias de Cid.

Então braço-direito de Bolsonaro, a atuação de Cid ia muito além de um ajudante de ordens. Além de participar e opinar em questões de governo, ele participava da vida pessoal do ex-presidente e, inclusive, fazia pagamentos de contas da família em dinheiro. Essas movimentações levantaram suspeita na PF.

A divulgação do áudio de Cid ocorre em meio a uma tensão entre aliados devido à discrepância entre sua colaboração ao falar com a polícia por horas e o silêncio do casal Bolsonaro.

Cid está preso desde 3 de maio no Batalhão do Exército de Brasília. Após mudar seu advogado de defesa, adotou postura de maior cooperação com autoridades policiais e tem tido longos depoimentos. Na segunda-feira (28), falou por 10 horas com investigadores sobre o caso do hacker Walter Delgatti Neto.

Além de Cid e do pai dele, também falaram Crivelatti, que era braço-direito do então ajudante de ordens, e Wasseff. A PF marcou todos os depoimentos para às 11h de quinta-feira, de forma simultânea, para evitar que os investigados pudessem, eventualmente, combinar versões.

Enquanto os militares falaram, Bolsonaro, Michelle, o advogado Fábio Wajngarten e o assessor Marcelo Câmara optaram pelo silêncio.

A justificativa é baseada em parecer da PGR (Procuradora-Geral da República), citando que o STF não poderia atuar na atual fase da investigação. Aliados do ex-presidente dizem que cabe à Justiça de São Paulo apurar o caso.

"Desta forma, considerando ser a PGR a destinatária final dos elementos de prova da fase inquisitorial para formação do juízo de convicção quanto a elementos suficientes ou não a lastrear eventual ação penal, os peticionários [Jair e Michelle], no pleno exercício de seus direitos e respeitando as garantias constitucionais que lhes são asseguradas, optam por adotar a prerrogativa do silêncio no tocante aos fatos ora apurados", disseram, em petição, os advogados Daniel Tesser e Paulo Bueno.

Já Wajngarten também alega ser advogado do ex-presidente nos autos, o que desobriga-o de depor como testemunha em processos que atua como defensor.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, a inclusão da investigação das joias no inquérito das milícias digitais no STF, sob relatoria do ministro Alexandre de Moraes, gera questionamentos sobre a competência da corte na apuração.

Especialistas em direito penal destacam que, devido ao sigilo, não há conhecimento sobre quais são os eventuais elementos de conexão entre as condutas dos alvos ou provas, o que justificaria a condução dessa apuração no STF.

O ex-presidente Bolsonaro não tem mais foro perante a corte, e o caso das joias era investigado desde março de forma sigilosa pelo Ministério Público Federal em Guarulhos, a pedido da Receita Federal, e pela Polícia Federal em São Paulo. Há duas semanas, a Vara Federal local enviou o caso ao STF.