Reforma ministerial deixa sequelas e desgasta Padilha na Esplanada e no centrão

Por CATIA SEABRA

BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O lema "União e Reconstrução" não é hoje o que melhor se aplica ao ambiente em que André Fufuca (PP-MA) e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE) chegam ao governo Lula (PT), respectivamente nos ministérios do Esporte e de Portos e Aeroportos, após uma exaustiva negociação.

A reforma ministerial abriu as portas do governo para o centrão, mas deixou sequelas na Esplanada.

Mesmo ministros preservados em seus cargos guardam queixas da exposição a que foram submetidos durante os mais de dois meses de negociação. Muitos viram seus nomes incluídos em diferentes redesenhos da Esplanada.

Em outra frente, integrantes dos partidos envolvidos nas tratativas também reclamam da demora para concretizar o acordo. A queixa é que o processo das várias idas e vindas de propostas de cargos foi desgastante.

As frustrações acabaram debitadas na conta do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), que atuou como principal emissário de Lula na articulação com o Congresso.

Embora tenha defendido a conclusão da minirreforma ainda em agosto, Padilha é cobrado pela indefinição do presidente e pelo vazamento dos diferentes cenários que estiveram sobre a mesa de negociação.

No Palácio do Planalto, por exemplo, integrantes do governo chegaram a comemorar a permanência do petista Wellington Dias (Desenvolvimento Social) como uma vitória do ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), sobre Padilha.

Com o cargo cobiçado pelo PP, Dias foi um dos que reclamaram da condução do processo, segundo relatos de petistas. Incomodado, o ministro chegou a descartar publicamente sua saída, enquanto o possível desmembramento de sua pasta ?que acabou não ocorrendo? era discutido no Planalto.

A substituição do ministro da Defesa, José Múcio, também foi apontada como alternativa para destravar a reforma, sob o argumento de que ele teria informado a Lula a intenção de deixar o governo no fim do ano. Mas Múcio negou a aliados que tenha definido a data da sua saída.

Por essa configuração estudada, e tampouco concretizada, Múcio cederia lugar para o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). A transferência do vice abriria espaço no Ministério do Desenvolvimento. Outra hipótese aventada era a de que Alckmin poderia assumir, na condição de vice, a execução do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) ?hoje a cargo da Casa Civil.

Uma das figuras emparedadas pela conturbada minirreforma foi justamente Alckmin, que encarou a insatisfação do PSB com o desgaste do ministro Márcio França (deslocado de Portos para Micro e Pequenas Empresas) e agora sofre pressões do seu próprio partido.

Parte da legenda cobra postura mais incisiva de Alckmin e menos subserviente ao PT, mas o vice-presidente é cauteloso nos movimentos por se manter fiel a Lula.

Auxiliares de Alckmin relataram, ao longo das semanas de indefinição sobre as trocas na Esplanada, que ele buscou conciliar os interesses do governo com os do partido, mas teve pouca ingerência nas discussões. O próprio Alckmin teve sua permanência à frente do Ministério do Desenvolvimento ameaçada pelos rumores.

Em meados de agosto, uma pessoa próxima a ele relatou, sob a condição de anonimato, nunca ter visto o vice tão desconfortável com uma situação no governo desde o início do mandato. Hoje o clima não é menos tenso.

Quadros do PSB estão irritados com a maneira como o partido foi tratado no processo e falam em desdém e menosprezo por parte do PT. A crise deve respingar na discussão de alianças para a eleição municipal de 2024.

Boa parte das críticas foi direcionada a Padilha. França não engoliu a perda do Ministério de Portos e Aeroportos para um membro do mesmo partido do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), rival político dele e do petismo em São Paulo.

A postura do ministro da articulação política desagradou a cúpula paulista do PSB. Em um grupo fechado de WhatsApp, foi observada especial contrariedade com a foto de Padilha sorridente ao lado de Fufuca e Silvio Costa Filho. Um dos integrantes comentou que a imagem "não será esquecida", após uma sequência de críticas às conversas truncadas que envolveram as pastas de Alckmin e França.

No Congresso, parlamentares do centrão relatam que a entrada de PP e Republicanos foi sacramentada no dia da votação do projeto que reestabeleceu o voto de desempate no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais Fonte) no início de julho.

A aprovação do projeto ocorreu após pedido de Lula ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e da sinalização do petista de que o centrão seria contemplado no primeiro escalão.

A reclamação dos congressistas é que Padilha e o líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), agiram de modo açodado ao tentar acelerar as negociações e colocaram cargos na mesa sem antes combinar com o presidente.

Integrantes da cúpula do Congresso relatam que partiu da dupla de articuladores políticos a sugestão de que eles pleiteassem os ministérios do Desenvolvimento Social e do Esporte, o que alimentou a expectativa de que o caso poderia ser resolvido em poucas semanas.

O problema, na avaliação dos parlamentares, é que Padilha deixou de combinar o desenho antes com Lula, o que gerou uma negociação arrastada. Um parlamentar do PP reclama de que, no fim, o governo entregou menos do que o partido queria.

Embora tenha resolvido a questão e garantido a entrada de Silvio Costa Filho e Fufuca no ministério, deputados dizem que a relação com Padilha acabou estremecida.

Aliados de Padilha atribuem os percalços aos recuos de Lula no curso das negociações. Eles citam como exemplo o fato de o presidente ter reavaliado a criação do Ministério das Micro e Pequenas Empresas, tendo decidido por confirmar a nova estrutura após idas e vindas.

O presidente também chegou a avisar a cúpula do PT a intenção de destituir um ministro petista, o que acabou não ocorrendo.

Sobre o descontentamento dos parlamentares do centrão, dizem que também eles impuseram obstáculos à costura.

Esses aliados de Padilha lembram também que o ministro não assumiu qualquer interlocução com Alckmin, o que caberia a Lula.