Filhos de Bolsonaro, Damares e aliados exaltam filme queridinho do QAnon

Por ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um comboio bolsonarista desembarcou no Cinemark Iguatemi, na noite de terça (19), para prestigiar a pré-estreia de "Som da Liberdade", a produção americana que virou coqueluche do QAnon, movimento de alto calibre conspiratório abraçado por parte da extrema direita mundo afora.

O lançamento, em Brasília, contou com os senadores Flávio Bolsonaro e Jorge Seif, do PL, e Damares Alves, do Republicanos. Engrossaram a comitiva política os deputados Eduardo Bolsonaro, Zé Trovão, Julia Zanatta, Carla Zambelli, Marco Feliciano, Mario Frias e Rodolfo Nogueira, todos do PL, mais Sargento Fahur (PSD) e Zucco (Republicanos).

"Fui impactada e desafiada a não desistir de minha luta contra o tráfico de crianças", escreveu Damares numa rede social após sair do cinema. Ela aproveitou o mesmo post para citar uma frase atribuída a Tim Ballard, personagem real que inspirou a ficção: "Os filhos de Deus não estão à venda".

De baixo orçamento e lucro milionário, o filme caiu nas graças do QAnon, que, entre outros delírios, crê numa rede de traficantes sexuais a serviço de uma elite global. Um de seus braços mais vigorosos seria, segundo a tese estapafúrdia, o Partido Democrata nos Estados Unidos, que sequestraria crianças e extrairia delas uma substância rejuvenescedora.

Jim Caviezel, que vive Ballard e também interpretou Jesus em "A Paixão de Cristo", de 2004, é um entusiasta dessas infundadas teorias da conspiração. Em "Som da Liberdade", ele interpreta um ex-agente do governo americano que luta contra um grupo de traficantes de crianças na Colômbia, em 2014.

O estúdio responsável pelo filme e o diretor, o mexicano Alejandro Monteverde, negam quaisquer conexões com o QAnon. "Nem em 1 milhão de anos imaginaria que [o título] seria tão politizado", disse Monteverde à revista Vanity Fair. "Vi uma reportagem [sobre tráfico infantil] na mídia conhecida e sempre achei que seria um filme que uniria todos nós." Ele começou a escrever o roteiro em 2015, quando o movimento ainda não existia.

Caviezel jogou gasolina nessa fogueira conspiratória ao promover o longa em eventos do QAnon. Em julho, Donald Trump, ex-presidente dos EUA e prócer da extrema direita global, sediou uma exibição do filme num clube de golfe seu em Nova Jersey. Caviezel foi, assim como Tim Ballard. O diretor, não.

A pré-estreia brasileira foi fartamente registrada por parlamentares bolsonaristas. Secretário de Cultura no governo Jair Bolsonaro, Mario Frias ajudou a organizar a sessão e ofereceu à plateia um discurso com notas de QAnon.

O ex-astro da novela da Globo "Malhação" disse que a obra em questão "vai denunciar algo que a grande mídia não quer falar a respeito". Ele reclama de problemas de divulgação e sugere um imaginário pacto midiático para acobertar causas "diretamente ligadas às pautas conservadoras", insinuando que a esquerda está se lixando para elas, e a imprensa faria vista grossa para isso.

Caso da sexualização de crianças, do tráfico de órgãos e da prostituição infantil, o deputado elenca.

Em vídeo compartilhado na internet, Eduardo Bolsonaro também investe numa polarização com rivais ideológicos. "Infelizmente, sim, o pessoal de esquerda tentou inicialmente boicotar o filme."