Leis que tratam da meia-entrada divergem e prejudicam estudantes em Juiz de Fora
Leis que tratam da meia-entrada divergem e prejudicam estudantes em Juiz de Fora
Repórter
20/04/2015
Estudantes, idosos, pessoas com deficiência e jovens de até 29 anos comprovadamente carentes têm, garantido através da Lei Federal 12.933, de 26 de dezembro de 2013, direito a meia-entrada em eventos artístico-culturais e esportivos. Só que, junto à Lei Federal e ao Estatuto da Juventude (Lei 12.852/2013), cinco leis municipais tratam sobre o tema e podem estar gerando prejuízos diretos a quem teria, por lei, garantido o benefício.
De acordo com o diretor jurídico da Câmara Municipal de Juiz de Fora, Gustavo Henrique Vieira, a competência legislativa é concorrente. "Município, Estado e União podem dispor sobre o assunto. Quando se tem uma Lei Federal, seja ela anterior ou posterior a Lei Estadual ou municipal, que é o caso, ela vai disciplinar uma normativa que não pode ser contrariada por outra lei. No entanto, ela pode ser aumentada. A regulamentação disso pode se dar de outras formas. A Lei Federal fala que os jovens estudantes, de 15 a 29 anos, podem ter direito a meia-entrada, desde que sejam de baixa renda e cursem algum dos cursos estipulados pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Em Juiz de Fora, a lei também fala que essas mesmas pessoas têm direito a meia-entrada, mas amplia esse âmbito. Dá meia-entrada às promoções, diz que vai ser regulamentado e fiscalizado pelo Procon. Ela amplia e não colide com as leis recentes da união", explica.
A Lei Municipal à qual Vieira se refere é a 11.651/2008, proposta pelo ex-vereador José Sóter de Figueirôa Neto (PMDB). No Art. 4, o texto aponta que todo estabelecimento que for realizar qualquer evento, deverá protocolar ao Procon-JF o material de divulgação contendo as especificações, como preço, e vedando a venda em locais separados de ingressos de estudante e para o público em geral. Também neste texto, o parágrafo único do art. 7 compete a Secretária de Atividades Urbanas (SAU) da Prefeitura a concessão do alvará, desde que sejam cumpridos todos os itens da lei.
Lei não é cumprida
Segundo o superintendente do Procon, Nilson Ferreira Neto, especificamente a parte que trata da protocolação na agência não vem sendo cumprida. "Desde 2008, quando a Lei entrou em vigor, tivemos 60 eventos protocolados aqui. Destes, 90% foram feitos pelo Cine Theatro Central. Nós temos conhecimento de muitos outros eventos, provavelmente já tivemos mais de mil. Mas a lei que trata da competência do alvará está mal escrita e não cobra esse protocolo. Eu já falei para refazer essa lei, incluindo nela tudo que precisa para realizar um evento na cidade. O cara que é de fora chega aqui, pega uma Lei e sabe tudo que precisa saber. Isso pode ser feito por uma nova Lei, ou um decreto do prefeito", opina.
Limite à 40%
A confusão é tão grande que as próprias leis federais, ambas aprovadas em 2013, divergem sobre o tema. A Lei Federal de 12.933 assegura, no inciso 10 do art 1º, que a concessão ao benefício da meia-entrada será de, no mínimo, 40% do total de ingressos disponíveis para cada evento. Já o Estatuto da Juventude, no inciso 10 do art. 23, limita à concessão do benefício a 40% dos ingressos. "Se isso fosse cumprido, já resolveria boa parte do problema. Mas o que se vê são eventos onde a maioria dos ingressos são vendidos como meia-entrada e o beneficiário acaba pagando mais caro", diz Nilson.
O art. 2 da Lei Federal 12.933 trata, especificamente, da regulamentação do inciso 10. O texto afirma que o público deverá ter acesso ao número total de ingressos disponíveis, incluindo os de meia-entrada, de forma visível e clara em todos os pontos de venda, incluindo os que ainda estão disponíveis para meia-entrada.
Prejuízo?
Em Juiz de Fora, o art. 5 da Lei 11.651/2008, proposta por Figueirôa, permitia que, em casos de eventos que realizam vendas de ingressos promocionais, com doação a entidades beneficentes ou alimentos, o desconto concedido no valor inteira seria proporcional ao valor da meia-entrada, permitindo assim, que o estudante pagasse um preço ainda mais baixo pelo ingresso, caso também doasse. Esse artigo, no entanto, foi revogado através da Lei 12.013/2010, também de Figueirôa, que passou a assegurar o desconto de 30% para não beneficiários, nos mesmos casos, retirando o benefício somado aos estudantes.
Na prática, o que se vê na cidade são ingressos mais caros para quem tem o benefício. Em um evento no início de abril, os organizadores cobraram R$ 45 pela meia-entrada e R$ 55 + 1kg de alimento pela inteira.
Fiscalização é falha
Conforme o Secretário de Atividades Urbanas (SAU), Sérgio Rocha, a pedido do Ministério Público a secretaria fez novo decreto 12.244 que entrou em vigor neste ano e passa a exigir, além dos documentos já fixados na norma de 2007, a constituição de um seguro pelo evento para garantir o ressarcimento do cliente, caso aconteça o cancelamento da festa. Além dos requisitos do decreto, associando-se a Lei municipal, a SAU exige a cópia do protocolo que comprova o registro do evento no Procon-JF.
No entanto, ele reconhece que alguns alvarás estão sendo expedidos sem a comprovação do registro no órgão fiscalizador ou a solicitação não chega a tempo hábil de que o Procon-JF faça a fiscalização. "Na próxima quarta-feira vou propor o adendo no decreto deste artigo 4° da Lei 11.651, que exige o protocolo junto ao Procon-JF para expedição do alvará. Como a alteração do decreto estava focada em garantir ao consumidor este direito de ressarcimento, não nos atentamos à norma, mas de qualquer forma a Lei deve ser cumprida independente disso. Também, pelo decreto antigo ser anterior a Lei, o detalhe não estava inserido. Reconhecemos o erro e vamos corrigi-lo", afirma Rocha.
Conheça as Leis
A primeira lei que regulamentou a meia-entrada em Juiz de Fora e ainda está em vigor foi em 1993. Veja o texto.
Em 2002, o então vereador Lafayette Andrada obrigou que os ingressos de meia-entrada fossem vendidos nos mesmos postos de venda que os ingressos de valor inteira. Leia.
Em 2008, veio a primeira lei proposta por Figueirôa, que regulamentou e enfatizou o que já havia sido feito em 1993. Confira. Em 2010, a cassação do artigo que beneficiava os estudantes. Veja.
Por fim, em 2014, o então vereador Isauro Calais garantiu o benefício de meia-entrada em eventos culturais para doadores de medula óssea. Calais, no entanto, limitou que o benefício fosse limitado à apenas um ano. Veja.
*Colaboração