O processo educativo entre fronteiras: do "eu" ao "outro", e do "outro" ao "nós"

Por Jungley Torres

Coluna Jungley Torres

O processo educativo, em sua essência mais profunda, vai além da mera transmissão de conteúdo. Ele é, antes de tudo, um ato solidário, um encontro entre o “eu” e o “outro”, que, ao acontecer, transforma-se em “nós”. Nesse espaço de intersubjetividade, a educação demonstra sua potencialidade dialógica, possibilitando não apenas o aprendizado técnico e teórico, mas também a formação humana, ampliando-se para a transformação social.

Neste âmbito, podemos pensar na “educação como um ato solidário”, reconhecendo que o saber não se limita a um indivíduo isolado; ele é compartilhado, construído e reconstruído em um horizonte coletivo, em que cada sujeito é tanto aprendiz quanto mestre. Por isso, nesse movimento dialógico, o “eu” se estende ao “outro”, não como um gesto de imposição, mas como uma abertura genuína à escuta, à compreensão e ao respeito. Assim como o corpo humano precisa de oxigênio para viver, a educação precisa do diálogo para se desenvolver plenamente. Sem essa troca contínua e reflexiva, o processo educativo fica incompleto, incapaz de promover uma verdadeira formação e transformação nas relações entre educador e educando.

Podemos citar Paulo Freire, patrono da educação brasileira, em sua Pedagogia do Oprimido, ao nos lembrar de que a educação libertadora é aquela que se fundamenta na amorosidade e no reconhecimento do outro como sujeito de saberes. A prática educativa solidária, portanto, exige de nós uma disposição para enxergar no outro não um vazio a ser preenchido, mas um universo rico em experiências, histórias e potências. É nesse encontro que o processo de formação se transforma em um caminho mútuo. Nesse horizonte, o “nós” que emerge da educação solidária é também uma resposta aos desafios de uma sociedade marcada pela fragmentação e pelo individualismo. De modo a exemplificar, vivemos em tempos em que as relações humanas, muitas vezes, se tornam superficiais e centradas na competitividade, no consumo e na busca incessante pelo sucesso pessoal, em detrimento do coletivo. O avanço das tecnologias e a hiperconectividade, apesar de facilitarem a comunicação, também contribuem para o isolamento emocional e a falta de empatia, criando uma espécie de distanciamento entre os indivíduos. Em um tempo em que as fronteiras entre “eu” e “outro” se tornam difusas e em que o mundo parece cada vez mais polarizado, a “educação solidária” nos convida a construir pontes em vez de muros, a superar as divisões e a criar um “nós” que seja, de fato, inclusivo, ético e transformador.

Assim, a educação como ato solidário é uma prática cotidiana que exige coragem, empatia e compromisso. Ela nos desafia a olhar para além de nós mesmos, a construir pontes em vez de muros e a reconhecer no outro a possibilidade de nos tornarmos, juntos, melhores. Afinal, é na construção desse “nós” que o verdadeiro sentido da educação se desvela: não apenas a idealização de transformar o mundo, mas, antes, o processo de ser transformado pelo encontro entre o “eu” e o “outro”, que se torna, assim, um genuíno encontro entre “nós”.