Juliano Nery Juliano Nery 18/2/2011

Alimentos com personalidade

Foto de pão com linguiça e batata fritaE o preço da carne está pela hora da morte! — Só de pensar no valor pago no caixa do açougue ou do supermercado, minhas mãos já começam a transpirar. Pelo visto, terei que engrossar o filé com as batatas ou com a mandioca, alimentos com menos personalidade e que equilibram o prato. Terei que contar os carboidratos, é verdade. Não se pode dar bobeira com esse tipo de alimento, saboroso quando frito e traiçoeiro com a balança. Senão, não adianta dar milhares de saltos como canguru e nem fazer outro catatau de flexões. Os alimentos têm personalidade e cobram a conta. Seja no bolso, na barriga ou na saúde do brasileiro.

Comer fora anda bem mais caro também. Os índices informados nesta semana pela Associação das Empresas de Refeição e Alimentação Convênio para o Trabalhador referente a 2010, não me deixam mentir. E isso afeta diretamente a minha parte mais sensível do corpo, o bolso. Sabe como é, moro sozinho e cozinho de forma sofrível. Quem sabe agora, com os alimentos bem expostos em seus pontos de venda, ficando cada vez mais longe do meu poder aquisitivo, eu consiga manter dietas mais criteriosas nos self services da vida. Foi comendo na rua que aprendi a montar pratos incoerentes, como lasanha com feijoada e sushi. Os alimentos e sua capacidade de sedução... Basta olhar as bandejas, basta sentir o cheiro de nhoque à bolonhesa no ar... E que os nutricionistas de plantão não meu ouçam!

Não é todo mundo que pode alegar hipotireoidismo ou chorar de barriga cheia, como fez o Ronaldo, o último dos melhores no futebol que o mundo pode ver em ação, durante sua despedida, nesta semana. O metabolismo pode não ser mais aquele, nesses últimos quatro anos. Mas, que ele deve ter deitado e rolado em pizzas, churrascos e cervejas, é bastante provável. E quando se come demais dá aquela preguiça na hora de correr...

Pior do que ficar acima do peso e de fora da fase de grupos da Libertadores, é ver tantos alimentos apreendidos por falta de condições de higiene e temperatura adequadas, como aconteceu em Juiz de Fora nesta semana. Tanta gente passando por necessidade, "um pecado", como diria os mais antigos. Uma enorme quantidade de comida que poderia ser útil para tanta gente está fora de circulação em definitivo, por pura falta de cuidado com as normas de vigilância sanitária. E o pior é que este é um capítulo repetido de uma história contada por diversas vezes em nossos noticiários. Pelo visto, longe de estar próximo da solução. Tudo tem prazo de validade, tudo tem uma melhor forma de ser consumido, sob pena de se tornar inutilizável. Até os alimentos.

E de tanto falar em comida, fiquei com uma fome danada agora. Queria comer um bom bife, mas me lembrei que o preço e a maré estão mais para um belo ovo frito de gema mole. Afinal de contas, não é todo mundo que tem a conta recheada de dinheiro, como um jogador de futebol recém-aposentado. E como diria aquela velha piada, comer fora, só mesmo se for lá no quintal de casa. Os alimentos são fortes e tem personalidade. Seja no preço, no sabor, na saúde ou no peso que fazem no estômago.

Juliano Nery não mistura queijo com goiabada porque acredita que a personalidade forte dos dois alimentos pode transformar sua boca numa arena de conflitos.


Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e Mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.


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