O maior inimigo do homem
Fato real. Havia acabado de chegar à Universidade Federal de Juiz de Fora no último domingo, em uma agradável manhã de sol, para bater um futebol com o meu filho e, finalmente, testar o kit luva de goleiro e bola, que ele ganhou no dia das crianças. A ansiedade do menino já tomava conta da praça cívica, quando, subitamente, ao olhar a sola do tênis do pequeno infante estava enlameada por uma pasta consistente e mal cheirosa, um cocô de cachorro. Em princípio, fiquei irritado e até fiz desaforos com o Gabriel, por não prestar atenção por onde anda e ter que me fazer limpar o calçado. Depois, refleti um pouco mais e percebi que ele não tinha qualquer culpa. A culpa é do maior inimigo do homem, ou seja, o próprio homem.
Diz a máxima, que o cachorro é o melhor amigo do homem. E deve ser mesmo. Ajuda a superar a solidão, não pede amor em troca e abana o rabo, festivamente, quando encontra o seu dono. O ser humano gosta de ser dono, de como dizia a Marina Lima naquela canção, "ter alguém para chamar de seu". O cão consegue lidar bem com esse tipo de situação e é um animal bastante fiel. Uma pena é que muitos seres humanos, que deveriam partilhar uma relação responsável com o animal, preferem prejudicar a coletividade, com atitudes como a relatada no primeiro parágrafo e até coisas piores. Principalmente, nas áreas mais nobres da cidade...
Quem é que nunca se deparou e/ou pisou em um cocô de cachorro nas ruas do bairro São Mateus, Bom Pastor, Cascatinha, Granbery? Eu mesmo já fui vítima algumas vezes. Sem contar, o ocorrido na universidade, com o meu filho... Da mesma forma que aqueles lindos cachorros, com pelos bem tratados, olhos azuis, língua roxa e outra série de raridades fenotípicas, desfilam pela rua, a falta de senso ao dar destino aos dejetos por eles deixados durante o passeio é uma realidade quase sine qua non. Que me desculpem aqueles, como o meu amigo carioca, Guilherme Mocelin, que carrega seus sacos plásticos para recolher o cocozinho das cadelas Quica e Cuca, nos locais por onde deixam seus rastros. Mas, a maioria, não está nem aí e, na verdade, incentivam os cães a fazerem suas fezes na rua, para não ter sujeira dentro de casa. Parabéns, agora, a sociedade divide com os donos dos cachorros a responsabilidade pelos detritos...
E não é só isso. Existem aqueles que são ainda mais irresponsáveis e que carregam seus pitbulls, filas e pastores alemães sem o auxílio da focinheira. Esses são os irresponsáveis autoconfiantes, que acreditam que o animal é manso e/ou na força dos seus braços para segurarem o animal. Gato escaldado, desde que o cachorro Rabito mordeu minha perna no inverno de 1992, não confio nessas balelas e passo do outro lado da rua. Não sem revolta e, portanto, conclamo ao poder público, maior fiscalização sobre o assunto. Acredito que ter um animal é importante e representa uma atitude louvável. Principalmente, porque é uma grande responsabilidade, é quase como ter um filho.
E, por falar em filho, utilizo este texto para me desculpar com ele. A culpa não é dele, que estava se divertindo com a bola nova, com a luva de goleiro. A culpa é do inimigo da gente, que não se preocupa com seus animais e nem com as pessoas com quem convivem socialmente. A esses, eu torço que pisem nos cocôs que encontrarem pelo caminho. Quem sabem, assim, tomam jeito.
Juliano Nery irá levar o seu filho para jogar bola na universidade no fim de semana. Com ou sem cocô no chão.
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Juliano Nery é jornalista, professor universitário e escritor. Graduado em Comunicação Social e mestre na linha de pesquisa Sujeitos Sociais, é orgulhoso por ser pai do Gabriel e costuma colocar amor em tudo o que faz.
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