Nos trilhos da disc?rdia
Transtornos, retirada da linha f?rrea e trem de passageiros causam uma discuss?o com ares de intermin?vel em Juiz de Fora

Ricardo Corr?a
Rep?rter
23/02/2006

Veja o que diz o coordenador da OSCIP Amigos do Trem, Paulo Henrique Nascimento, sobre o projeto do trem de passageiros

Veja!


Basta baixar a cancela no movimentado cruzamento da Benjamin Constant com Francisco Bernardino para algu?m lamentar: "n?o ? poss?vel que em uma cidade do tamanho de Juiz de Fora o tr?nsito fique parado por causa do trem". E basta que se proponha a retirada da linha f?rrea do local para que uma grande discuss?o seja iniciada. Uns alegam que os custos s?o muito altos, outros que seria uma solu??o definitiva.

O certo ? que os anos passam, novas cancelas abaixam, milhares de vag?es passam e uma solu??o n?o sai do territ?rio das id?ias. E os trilhos da falta de consenso s? trazem preju?zos ? popula??o, que tamb?m se divide quanto ao que fazer, mas ? un?nime em afirmar que, do jeito que est?, e com o aumento da circula??o de trens a cada dia, a situa??o s? tende a piorar.

No meio dessa discuss?o toda, que envolve Governo Federal, Prefeitura, C?mara Municipal e MRS Log?stica, est? tamb?m a sociedade civil organizada. A OSCIP Amigos do Trem, que defende o retorno do trem de passageiros, ? uma das maiores defensoras da perman?ncia da linha. A MRS diz que n?o ? contra a retirada, a Prefeitura tamb?m tem interesse, mas de onde sairia o dinheiro ? que ? a grande quest?o. S? a transposi??o custaria R$ 300 milh?es e ainda poderia criar outras demandas, como a reocupa??o do antigo local que, para muitos, seria transformado em favelas e ?reas de invas?o.

A linha f?rrea, cuja constru??o do primeiro trecho remonta o fim da d?cada de 1850, s? chegou em Juiz de Fora em 1875. De fator de desenvolvimento e orgulho das cidades pelas quais passava, tornou-se hoje um dos grandes problemas urbanos, cujas discuss?es prometem render, e j? foram levadas at? ao presidente Lula, quando este recebeu a visita do prefeito Alberto Bejani, ainda em janeiro de 2005. E a discuss?o promete continuar.

Com a palavra a Prefeitura
No meio de todas as discuss?es, a Prefeitura de Juiz de Fora (PJF) garante que o projeto de transposi??o da linha est? sendo tocado. O Minist?rio dos Transportes do Governo Federal financiou os estudos, no valor de R$ 800 mil. Para a constru??o, no entanto, a verba ? infinitamente maior: R$ 300 milh?es.

A PJF est? pleiteando o recurso junto ao Minist?rio e, h? cerca de dez dias, foi encaminhado um of?cio ao ministro para refor?ar o pedido. O novo percurso come?a na margem do Rio Paraibuna, logo abaixo de Matias Barbosa, seguindo o vale do Rio do Peixe, at? chegar na regi?o de Humait?, s? retornando a Juiz de Fora na altura da Mercedes-Benz. No total, s?o 50 quil?metros de ferrovia, e segundo a assessoria da Secretaria de Planejamento e Gest?o Estrat?gia da PJF, respons?vel por administrar o projeto, j? existem tr?s empresas vencedoras de licita??o para realizar as obras.

A Prefeitura alega que a transposi??o da linha vai resolver o problema de interrup??o do tr?fego na cidade que, atualmente, ficaria paralisado por cerca de 4 horas por dia, em fun??o da passagem dos trens. Isso, ainda sem contar com o aumento da circula??o das locomotivas, que a MRS vem prometendo para os pr?ximos anos.

A id?ia da empresa ? dobrar o n?mero de vag?es at? 2008, o que, segundo a PJF, comprometeria de vez a fluidez do tr?nsito em vias de grande movimenta??o.


No projeto da Prefeitura, os trilhos atuais n?o seriam retirados. Apenas as cargas operadas pela MRS passariam para o novo trajeto. Na linha atual, a Prefeitura ressalta uma poss?vel utiliza??o em outras atividades, como a implanta??o do chamado "Ve?culo Leve Sobre Trilhos", atrav?s de um plano funcional rodo-ferrovi?rio. A PJF fala tamb?m da utiliza??o da linha para "o transporte de massas", ou seja, a circula??o de passageiros, principalmente os que moram na zona norte da cidade.

Com a palavra: os Amigos do Trem
O coordenador do grupo Amigos do Trem, Paulo Henrique Nascimento, n?o quer nem pensar em uma transfer?ncia da linha f?rrea para outro lugar. Ele acredita que ? poss?vel montar o projeto do transporte de passageiros sem precisar retirar os trens de carga que atualmente est?o em circula??o na cidade.

A OSCIP Amigos do Trem ? respons?vel pelo projeto do trem de passageiros, que faz parte do programa de Revitaliza??o das Ferrovias do Departamento de Rela?es Institucionais do Minist?rio dos Transportes.

A id?ia do grupo Amigos do Trem, que est? sediado na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), ? desenvolver um sistema de transporte com fins tur?sticos. A linha, que aproveitaria os antigos vag?es e locomotivas utilizadas no velho Xangai, iria ligar, inicalmente, as localidades de Matias Barbosa, Juiz de Fora, Ewbank da C?mara e Santos Dumont. Mas Paulo Henrique j? est? em contato com prefeituras de outras cidades, como Barbacena, que j? demonstrou todo o interesse em receber o trem.

O projeto de revitaliza??o das ferrovias ? de 2003, mas os "Amigos do Trem" j? atua h? sete anos. No momento, a ONG trabalha com um estudo de viabilidade t?cnica e financeira do trem de passageiros. Para isso, o Governo Federal liberou uma verba de R$ 54 mil. O projeto custaria R$ 72 mil, mas os outros R$ 18 mil ser?o dados como contrapartida pela UFJF. S?o cem pessoas trabalhando no projeto, que entrou em nova fase no ?ltimo dia 16 de fevereiro.

"A id?ia que temos ? de que no dia 6 de maio teremos um resultado conclusivo para saber se ? vi?vel t?cnica e financeiramente ou n?o. Estamos fazendo este estudo de viabilidade, para ver se existe demanda, mas eu acredito que sim", explica Paulo Henrique, que ressalta uma s?rie de vantagens com a ado??o do projeto.

"? muito importante que a cidade tenha alternativas de sistema de transporte e ? importante a quest?o tur?stica e de gera??o de emprego e renda. Fator de desenvolvimento mesmo", diz Nascimento, lembrando que a id?ia ? montar at? uma programa??o cultural dentro dos vag?es, com m?sica e outras atividades.

O antigo Xangai foi extinto porque, segundo a Rede Ferrovi?ria, na ?poca, dava preju?zo. Mas Paulo Henrique diz que as coisas mudaram muito e que o conceito ? outro.

Primeiro porque a principal finalidade agora ? tur?stica, com uma circula??o pequena. Segundo porque, para ele, a ONG tem condi?es de fazer parcerias que a rede n?o podia na ?poca.


Provavelmente, o trem de passageiros iria ter pelo menos dois hor?rios de ida e dois de volta. Pelo menos ? o que diz a legisla??o, segundo Paulo Henrique. Ele explica que essas quatro passagens a MRS Log?stica, que opera a linha, tem obriga??o de liberar. Mas isso significaria uma readequa??o de hor?rios. Outra quest?o importante ? que a MRS poderia at? vir a ser parceira, mas n?o poderia operar o trem de passageiros, sendo este outro impedimento da legisla??o.

Com rela??o a uma poss?vel retirada da linha, ou at? mesmo a constru??o de uma nova, no chamado "Contorno Ferrovi?rio", mantendo a atual para o transporte de passageiros, Paulo Henrique Nascimento acredita que ? perda de dinheiro.

"Seriam gastos mais de R$ 1 bilh?o. Porque n?o ? s? tirar a linha, tem todo um projeto de revitaliza??o que precisaria ser feito, de reocupa??o, ent?o acreditamos que ? melhor que se construam viadutos e passarelas. At? porque, a cidade cresce e em 10 anos voltar?amos a ter o mesmo problema no novo local", avalia Paulo Henrique que sonha com o trem de passageiros nos trilhos ainda este ano.

"A estrutura j? existe toda. Claro que precisam de reformas, mas os vag?es, a locomotiva, a linha, as esta?es, tudo j? existe", lembra.

Com a palavra: a MRS Log?stica
A MRS Log?stica deixa claro que n?o ? dona da linha f?rrea e muito menos toma as decis?es sobre onde ela deve passar. De acordo com a assessoria da empresa, o projeto de transposi??o da linha f?rrea n?o encontraria resist?ncias por parte da companhia.

Isso porque o que a MRS quer ? manter seu direito de trafegar os trens de carga, explorando o contrato que lhe d? direito a continuar com o servi?o at? o ano de 2026.

Uma poss?vel transposi??o, segundo a MRS, traria benef?cios para a empresa, pois os trens poderiam trafegar mais r?pido, sem a redu??o de velocidade comum quando os vag?es passam no per?metro urbano. A empresa alega que quer crescer, mas com responsabilidade e seguran?a, mas que quem decide sobre onde a linha deve passar ? a Prefeitura de Juiz de Fora.

"A ?nica que n?o pode opinar sobre isso ? a MRS. A empresa n?o ? dona de nada e a Rede (Ferrovi?ria Federal) e o Minist?rio dos Transportes ? que t?m que dar uma solu??o. Verba n?o tem condi??o, mas n?o estamos nos opondo, de maneira nenhuma", diz a assessoria da empresa em Juiz de Fora.

Dessa forma, a MRS deixa claro que n?o teria motivos nem recursos para arcar com os custos de uma transposi??o em Juiz de Fora. Em uma situa??o parecida, em S?o Paulo, a MRS entrou em um projeto de parceria p?blico-privada, para a constru??o do rodoanel. A MRS ressalta que faz parcerias com alguns munic?pios por onde passa a ferrovia, mas que s?o muitos, 109, e que todos devem ser considerados.

Com a palavra: a vereadora
Na exata contram?o do que diz a MRS, a vereadora Rose Fran?a (PTB) solicitou uma audi?ncia p?blica para discutir o assunto na C?mara Municipal.

Para ela, a MRS tem responsabilidade sim nesta decis?o, e na obten??o de formas que fa?am com que os preju?zos da passagem do trem por Juiz de Fora sejam minimizados.

"As empresas, de um modo geral, t?m que se adequar ? nossa cidade, ? nossa realidade. E a? eu coloco uma s?rie de quest?es: a MRS est? se adequando ? nossa cidade? Uma empresa que p?ra o nosso tr?nsito de 15 em 15 minutos, est? se adequando? Quais os benef?cios para a nossa cidade? Quais os investimentos sociais que ela faz? Ser? que ela n?o pode construir os viadutos, sendo que ela ? o fato gerador do tumulto?", indaga a vereadora, que complementa.

"Eles t?m muito mais lucro do que todos os habitantes de juiz de Fora juntos. Ent?o eu quero que a MRS d? uma solu??o para esses problemas. ? uma quest?o de l?gica. ? como um mais um s?o dois. Se voc? causa os transtornos a algu?m, voc? tem que solucion?-los. N?o estou dizendo que tem que transferir para outra cidade outro lugar. Sei que ? muita despesa e tamb?m n?o queremos tumultuar a vida deles. Quero s? que eles se adaptem ? nossa realidade", diz a vereadora.

Rose Fran?a diz que solicitou ? empresa a informa??o sobre o volume e o tempo gasto para a passagem dos trens, mas que n?o recebeu a resposta.

"N?o fui informada, mas o que a gente ouve falar ? que vai come?ar a passar trem de 15 em 15 minutos. Imagine isso. Fora que essas linhas f?rreas provocam acidentes porque s?o mal sinalizadas. Cortaram cancelas. Hoje poucos pontos t?m cancela. Poucos t?m pessoas para tomar conta. Na economia deles, as pessoas est?o tendo preju?zos, e at? perdendo a vida", explica Rose Fran?a.

Para tentar fazer com que a MRS seja obrigada a se responsabilizar pelos transtornos causados pela linha, Rose Fran?a estuda a possibilidade de fazer uma emenda ? Lei de Uso do Solo, que tr?mita na C?mara ? espera de ser votada ainda este ano.

Uma outra possibilidade seria estudar se, juridicamente, existe alguma possibilidade de incluir uma emenda no C?digo de Posturas do Munic?pio, explica a vereadora que, no entanto, elogia o projeto da volta do trem de passageiros, proposto pelo colega de partido, Francisco Canalli.

"A? sim, eu sou favor?vel. Utilizar o potencial tur?stico. Acho que todos os vereadores entendem que deve haver alguma mudan?a. Que do jeito que est? n?o pode ficar".


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