Monsenhor Hernani de Oliveira completa 65 anos de sacerdócio
Repórter
Deixar a casa para viver uma vida consagrada ainda na adolescência pode representar um desafio muito grande para um vocacionado. Mas a experiência pode se tornar rica, por meio de muito trabalho e empenho na construção de um propósito: levar o Evangelho aos homens. Ao comemorar os seus 90 anos de idade e 65 de vida sacerdotal, é dessa forma que o Monsenhor Hernani de Oliveira celebra "as graças" pelos anos de dedicação à Igreja Católica.
Monsenhor Hernani vive hoje em um apartamento na avenida Rio Branco, no bairro Alto dos Passos, em Juiz de Fora. Levanta cedo todos os dias e toma um banho frio, independente do tempo. "Nunca facilitei e sempre tive cuidado com minha saúde. Gosto de levantar cedo e dormir normalmente cedo. A não ser quando tem um programa de TV ou futebol que eu quero assistir. Levanto cedo, tomo banho frio em qualquer tempo e só gosto de coisas naturais. Eu não conheço o sabor desses condimentos. Nunca tomei um Sonrisal", conta.
Torcedor do Botafogo, o padre se chateia ao analisar da queda do desempenho do time em 2013. "Eu acho que os jogadores estão boicotando o Seedorf, porque ele é o que ganha mais. O Botafogo está jogando sem entusiasmo nenhum. Meu Deus! Outro dia eles foram vaiados, vamos ver se agora vão reagir", espera.
Mas a insatisfação com o time não é razão para tristeza. Em boas gargalhadas, o monsenhor lembra muitos episódios de sua vida consagrada, principalmente das partes mais duras de sua vida. Ordenado presbítero em 1948, ele conta como foi o desafio de junto aos colegas recém ordenados pedir ao bispo a reabertura do Seminário Santo Antônio, que à época estava fechado para reformas. "Em 1947, o reitor era o padre Correa. O Dom Justino [José de Santana], que era o bispo à época, queria fazer uma reforma no prédio e pediu ao reitor que antecipasse as férias dos seminaristas. Quem quisesse continuar no próximo ano, iria para Mariana. Nós não queríamos deixar o seminário fechado e propusemos reabri-lo. Éramos quatro padres muito novos e não podíamos deixar de ajudar", lembra.
No seminário, onde atuou por 30 anos como professor e também diretor espiritual, ele conviveu com padres já falecidos e que fizeram história em Juiz de Fora, como o capelão e radialista Wilson Valle da Costa, o bispo Dom Altivo Pacheco Ribeiro e Martinho Reis Gaio.
Exerceu também a função de vigário geral da Arquidiocese de Juiz de Fora, do final década de 60 até os anos finais da gestão do bispo Dom Geraldo Morais Penido (1918-2002). Neste período, completou seus 25 anos de sacerdote e foi agraciado com o título de monsenhor, solicitado ao Vaticano pelo chefe da arquidiocese. "Dom Geraldo pediu o título para mim em 1973, depois que fui vigário geral. É um título honorífico, geralmente o bispo pede para manifestar o agradecimento pelo trabalho que o padre fez e está fazendo na diocese. Como fui vigário geral, é natural que o vigário seja monsenhor", explica.
Vida paroquial
Depois de deixar o posto de vigário da arquidiocese, assumida por Dom Juvenal Roriz em 1978, Monsenhor Hernani foi convocado a assumir a sua primeira paróquia, de São José, no Botanágua. "Não foi muito fácil, porque eu trabalhei 30 anos no seminário, no magistério. Saia para ajudar em datas especiais, mas quando eu fui para a paróquia, tive um problema um tanto difícil no começo, porque não tinha experiência como pároco. Ela estava completamente abandonada", conta.
O padre anterior, segundo o monsenhor, deixou a paróquia em uma situação que complicava o uso do patrimônio pela igreja para fins pastorais e que atendessem a comunidade. "Ele permitiu que o quintal da paróquia se transformasse numa favela. Quando eu fui pra lá, eram 12 ou 13 barracos no quintal da paróquia. Eu vi que não podia ser assim e conversei com os moradores. Só um casal criou caso comigo e eu tive que ir à Justiça. Tinha uma família que morava debaixo de uma escada. Lá não tinha um salão paroquial bom. Foi assim que começamos a mudar algumas coisas e acabei ficando lá por 35 anos."
A igreja nos tempos da transformação
É sobre o viés das transformações que o monsenhor destaca as mudanças que a Igreja Católica viveu em seus anos de sacerdócio. "A partir do Vaticano II, houve muita abertura. Antes, a disciplina da igreja era bastante severa. Por exemplo, o padre só podia celebrar uma vez por semana e duas no fim de semana. Devia-se fazer jejum absoluto, da meia-noite até a hora da missa. Nem água podíamos tomar. Em termos sociais, depois do Concílio foi a maior participação dos leigos. Antes o padre fazia tudo. Hoje temos os leigos, as pastorais, que auxiliam na condução, na administração da paróquia", observa.
Quando questionado se acredita que a igreja possa passar por novas transformações a partir das posturas assumidas pelo Papa Francisco, o monsenhor acredita que algumas já são visíveis. "Embora aqui no Brasil ainda não tenha causado muito impacto, na Europa está sendo uma revolução. Há uma volta grande fiéis que haviam deixado a igreja, graças ao estilo do papa. O estilo conservador está sendo deixado de lado. O papa na igreja hoje está no meio do povo. É o que ele está fazendo. Os italianos querem um papa fechado e ele está no meio do povo".
Mas sobre os dogmas que a igreja conserva ao longo dos seus dois milênios, o monsenhor duvida que haja mudanças drásticas. "Não acredito que vá mudar tanto. O celibato, por exemplo, é definitivo. Não muda. O casamento de pessoas divorciadas também não deve ser aprovado. O que a igreja aceita em relação ao casamento é a questão da validade. Porque há muitos casamentos que realmente só aconteceram na cerimônia, mais nada. Uma das exigências para a validade do casamento é que não haja erro de pessoa. Se for comprovado que a pessoa se enganou, ele perde a validade", explica.
Vocação
Nascido em Bias Fortes em 18 de junho de 1923, à época um distrito de Barbacena, Monsenhor Hernane é filho de um comerciante. Até os 15 anos, antes de entrar no seminário em Juiz de Fora, ajudava o pai no comércio. Sua mãe teve seis filhos, dois falecidos na infância. Os pais nutriam o desejo de estudar o menino, mas ele se recusou a entrar no colégio. "Eu tinha medo de ser maltratado e quis ir para o seminário. Eu tinha um primo que estava terminando o seminário. Aquilo me estimulou um pouco, mas infelizmente exemplos de padres da minha paróquia não tinha. Inclusive o padre que conheci na minha infância, abandonou o sacerdócio. Foi muita oração da minha mãe para fortalecer a minha vontade."
Sobre os seus 65 anos de dedicação à vida consagrada, o monsenhor destaca que o apoio dos leigos é necessário para a vida vocacional. "Deixo uma mensagem que está na intenção do apostolado da oração este mês. Os padres que tem problemas e dificuldades, que sejam apoiados pelos fiéis leigos para continuar a sua vocação", finaliza.
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